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Atividade Policial e Guarda Municipal: Entendendo os limites constituicionais

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Atualmente, a discussão em torno das funções e competências das Guardas Municipais no Brasil ganha destaque

Por Vitoria Rodrigues|VIGNA

Com a crescente preocupação com a segurança pública e a necessidade de reforçar a atuação das forças de segurança para o bem da sociedade, as Guardas Municipais tornaram-se atores fundamentais nesse cenário. No entanto, uma questão que permanece em aberto é até que ponto essas instituições podem exercer funções de polícia, especialmente quando se trata de atividades de polícia judiciária ou administrativa.

Para compreender o debate atual sobre o papel das Guardas Municipais, é importante destacar o seu propósito fundamental. O artigo 144 da Constituição Federal dispõe que a segurança pública é dever do Estado, além de um direito e responsabilidade de toda a sociedade, devendo ser exercida pelos órgãos policiais de segurança pública. Vale dizer, que a Guarda Municipal não faz parte do rol apresentado no citado dispositivo constitucional, motivo pelo qual, até então, não era considerado um órgão de segurança pública.

As Guardas Municipais foram estabelecidas com o objetivo principal de proteger o patrimônio público municipal, garantindo um ambiente seguro para a população. Sua atuação abrange a fiscalização de áreas públicas, o apoio a órgãos municipais, a prevenção de crimes e a promoção da ordem pública. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu uma decisão importante com relação às Guardas Municipais. Em 25 de agosto de 2023, o STF determinou que essas instituições são parte integrante dos órgãos de segurança pública.

O Ministro Alexandre de Moraes entendeu que “As guardas municipais têm entre suas atribuições primordiais o poder-dever de prevenir, inibir e coibir, pela presença e vigilância, infrações penais ou administrativas e atos infracionais que atentem contra os bens, serviços e instalações municipais. Trata-se de atividade típica de segurança pública exercida na tutela do patrimônio.”.

O último a votar foi o mais novo Ministro, Cristiano Zanin, o qual acompanhou o entendimento e Moraes para dar provimento à arguição de descumprimento de preceito fundamental. Dessa forma, por uma margem estreita de votos (6 a 5), o Supremo entende por incluir as Guardas Municipais ao rol de órgãos oficiais de segurança pública, apesar de não estarem mencionadas expressamente no art. 144 da Lei Maior.

Essa decisão reforça a importância das Guardas Municipais na manutenção da ordem e segurança em nível local, o que permite que os agentes possam realizar funções típicas da polícia, como abordagens, investigar locais em que há suspeita de desenvolvimento de tráfico de drogas, entre outras.

Contudo, a decisão do STF contraria que vinha decidindo o Superior Tribunal de Justiça, isto porque esta Corte entende que a atuação das Guardas Municipais deve, sempre, estar relacionada diretamente relacionada à finalidade da corporação, ou seja, a ação dos agentes deve ser pautada especialmente na defesa do patrimônio municipal.

Com este entendimento, o STJ recentemente concedeu ordem de habeas corpus para relaxamento de prisão preventiva de réu que foi preso portando drogas, tendo a revista pessoal sido realizada pela Guarda Municipal. Para o Ministro Joel Ilan Paciornik, os agentes estavam realizando função ostensiva e de investigação, as quais não fazem parte de suas atribuições constitucionalmente previstas, o que caracterizaria desvio de função. “[…] não ficou demonstrada relação clara, direta e imediata entre a abordagem dos guardas e a necessidade de proteger a integridade dos bens e instalações ou assegurar a adequada execução dos serviços municipais”, destaco Paciornik.

Noutra ocasião, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reiterou a mesma interpretação de que a guarda municipal não possui atribuições típicas das polícias civil e militar. Em mais um caso em que foram anuladas as provas derivadas de abordagem e busca pessoal, enfatizou-se que a guarda municipal só pode realizar tais procedimentos em situações extremamente excepcionais – que fujam do cotidiano da atividade –, ressaltado o fato de que tais ações devem estar diretamente relacionadas à sua finalidade institucional.

Tal tese foi estabelecida no julgamento de um recurso que obteve sucesso para revogar a prisão de um cidadão condenado por tráfico de drogas. A causa da absolvição foi a anulação de provas obtidas em um procedimento busca pessoal, o qual foi conduzido por agentes da Guarda Municipal.

Nesse diapasão, vemos que o STJ atuou como verdadeiro guardião da legalidade até que o STF pudesse definir o assunto, mas ainda há diversas nuances a serem estabelecidas para salvaguardar os direitos fundamentais da sociedade.

Isto porque embora o STF tenha reconhecido o papel das Guardas Municipais como órgãos de segurança pública, a questão de se essas instituições podem exercer funções de polícia judiciária ou militar permanece em aberto ante a ausência de legislação sobre o assunto. Sim, pois a Carta Magna estabelece claramente as competências das polícias judiciárias e militares, e não inclui as Guardas Municipais entre essas categorias.

É crucial definir limites claros para as atividades das Guardas Municipais para evitar possíveis conflitos e garantir a legalidade de suas ações. O que vemos atualmente é que tal corporação vem apresentando uma postura e atuação claramente militarizada, com treinamento tático dos agentes e, inclusive, criação de topas de operações especiais.

Embora essas instituições desempenhem um papel fundamental na segurança pública municipal, é importante reconhecer que a Constituição estabelece padrões específicos para as polícias judiciárias e militares com repercussão fundamental na persecução penal, especialmente no que tange às garantias fundamentais do averiguado e/ou réu do processo ou procedimento.

Dessa forma, restam obscuras diversas questões que precisam ser esclarecidas sobre a atuação das Guardas Municipais, principalmente no que diz respeito à possibilidade da corporação exercer o poder de polícia em situações que não envolvam bens públicos municipais ou, até mesmo, se essa atuação abrange a atuações preventivas ou repressivas.

O debate sobre as funções das Guardas Municipais no Brasil continua a evoluir, à medida que a sociedade busca soluções mais agressivas para questões de segurança pública. A decisão do STF de reconhecer essas instituições como parte dos órgãos de segurança pública é um marco importante, mas extremamente delicado, sendo essencial definir limites constitucionais claros para suas atividades. É imperativo encontrar um equilíbrio entre a necessidade de proteger o patrimônio público municipal e a observância rigorosa das disposições constitucionais relacionadas ao processo penal como um todo de forma a evitar arbitrariedades do aparelho estatal para com os cidadãos. Portanto, o desenvolvimento de regulamentações específicas e a definição de um rol de atribuições das competências das Guardas Municipais são passos cruciais nesse processo.

Foto de Capa: internet|Divulgação