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Defensoria da Bahia institui política de equidade racial e combate ao racismo e apresenta em coletiva à imprensa

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Inédita no sistema de justiça baiano, a política de igualdade racial visa enfrentar o racismo em todas as suas dimensões e tornar o quadro funcional da Defensoria mais plural, com mais negros e indígenas

 

Por Lucas Fernandes/Assessoria de Comunicação – DPE/BA

 

Dizem que a verdadeira mudança começa de dentro para fora. Um ano e meio após criar o Grupo de Trabalho pela Igualdade Racial, agora a Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA institui, pela primeira vez na sua história, uma política que busca não só implementar uma cultura antirracista, mas também democratizar o quadro funcional da instituição para que mais pessoas negras e indígenas possam fazer parte dela. O documento foi divulgado em coletiva virtual à imprensa nesta quinta-feira, 13.

A Política de Promoção da Equidade Racial e Enfrentamento ao Racismo foi implementada neste 13 de maio – data histórica da assinatura da abolição da escravidão no Brasil e Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo – não para enaltecer a Lei Áurea, mas para mostrar que é preciso agir, ainda hoje, para abolir o preconceito racial do dia a dia. Com o propósito de viabilizar o acesso da população negra e indígena aos direitos sociais, políticos e econômicos, a iniciativa garante que a Defensoria adote medidas, programas e ações afirmativas para diminuir a desigualdade entre esses grupos historicamente excluídos na sociedade.

“Esse é um instrumento de orientação, fixação de balizas de atuação da Defensoria Pública e de princípios institucionais de luta contra os preconceitos. Serve como um guia que orienta para a forma de atendimento e de combate ao racismo dentro e fora da instituição”, destacou o defensor público geral da Bahia, Rafson Saraiva Ximenes.

Segundo ele, a nova política direciona o corpo funcional da instituição a fazer um trabalho mais completo não apenas na atuação diretamente voltada ao racismo, mas também em todas as outras áreas, “porque a discriminação de raça permeia todas as relações sociais”, explicou.

A própria Defensoria reconhece que os preconceitos moldam a composição das instituições públicas em geral. Na DPE/BA, há somente 25% de defensores públicos negros. Servidores, representam 50% e estagiários 54%. Ou seja, há uma grande diferença de acesso aos cargos e funções e o combate a essa realidade precisa ser estimulado para que o racismo diminua.

Uma Defensoria antirracista

A proposta política antirracista foi uma construção do Grupo de Trabalho (GT) pela Igualdade Racial, que buscou honrar trabalhos anteriores das lutas do povo negro no Brasil e integrá-los à atuação diária da Defensoria. Tem como base os estatutos federal e estadual da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa; a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial; a Convenção Interamericana contra o Racismo, entre outras.

Conforme a coordenadora do GT, defensora pública Vanessa Nunes, a expectativa com a política é fazer com que o debate de raça seja uma referência mais orgânica na instituição. “Esperamos que a dimensão da raça seja levada em conta em todas as áreas de atuação da Defensoria, que as normativas antirracistas sejam centrais no trabalho de cada defensor, independentemente da área em que ele atue, para que a gente não reproduza omissões e violências.

“Temos esperança num futuro em que haja felicidade e plenitude para as pessoas negras. Essa luta não começou hoje e nem vai terminar amanhã, mas nos sentimos satisfeitos por participar desse processo ativamente e lutar por autonomia”, afirmou Vanessa Nunes.

A política de equidade racial assegura que a gestão da Defensoria observe a necessidade de aplicar recursos financeiros para a promoção da equidade racial no momento da elaboração ou execução das propostas orçamentárias. E impede que esses recursos sejam cortados ou diminuídos. Garante, ainda, a criação de um núcleo específico, composto por defensores e defensoras públicas negras para atuar com a defesa desse público e dar mais efetividade à execução das medidas. Também reforça o enfrentamento às violações com a punição administrativa, cível ou penal de membros da instituição que praticarem atos de racismo, discriminação racial ou racismo religioso. E sugere a adoção de medidas judiciais e extrajudiciais para enfrentar as fraudes nas cotas.

Entre as novidades que implementa, está a realização de pesquisas estratégicas para o enfrentamento ao racismo. A Defensoria vai aprimorar a coleta de informações relacionadas à raça sobre seus membros e sobre as pessoas a quem ela assiste, no momento da triagem. Conforme o defensor geral da Bahia, isso facilita a análise dos indicadores e a tomada de decisões para combater a desigualdade racial, com base em critérios objetivos.

Para a coordenadora da Especializada de Proteção aos Direitos Humanos da DPE/BA, defensora pública Eva dos Santos Rodrigues, essa iniciativa é um grande estímulo para que os demais órgãos e instituições – do sistema de justiça ou não – repliquem essa ideia e tenham diretrizes antirracistas em toda a sua base de atuação.

A política antirracista também é fruto de um trabalho histórico da participação civil e da Ouvidoria Cidadã da Defensoria da Bahia, que atua com uma proposta democrático-participativa. Até o momento, em pouco mais de 10 anos de Ouvidoria, quatro mulheres negras assumiram o comando do órgão, Anhamona Brito, Tânia Palma, Vilma Reis e Sirlene Assis, que foram peças fundamentais, junto com os movimentos sociais, para a concretização da política institucional.

Educação é a saída

Todos sabemos que a carta coringa para resolver a questão do racismo, a longo prazo, é a educação. Por isso, a política prevê a criação de programas permanentes pela Escola Superior da Defensoria (Esdep) para educar e treinar os integrantes da instituição em cursos, seminários, eventos e palestras sobre relações raciais. Está garantida a inserção da inserção dessa temática, por exemplo, nos cursos de formação de defensores públicos.

A Esdep deve oferecer também oficinas sobre as possibilidades de atuação judicial e extrajudicial na defesa de direitos da população negra e indígena, envolvendo temas como: políticas públicas de saúde, educação, de acesso à terra, de liberdade religiosa e de enfrentamento da violência policial e o encarceramento em massa, entre outros.

Prevê também que a Esdep treine os atendentes que estão na linha de frente da Defensoria para realizar a abordagem aos assistidos e coletarem adequadamente os dados relativos à raça e gênero no momento da triagem.

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