Para economistas, independência do Banco Central para definir política monetária é importante para que a inflação seja controlada e fique dentro da meta estabelecida
A autonomia do Banco Central completa dois anos este mês – data em que o projeto de lei que conferiu maior protagonismo ao Bacen foi sancionado pelo governo Bolsonaro. A mudança de 2021 dá à instituição liberdade para definir a taxa básica de juros da economia, a Selic, de modo que a inflação seja controlada e fique dentro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Ou seja, nos momentos em que a inflação está elevada e distante da meta, como em abril do ano passado, quando chegou a 12,13%, o Bacen sobe a taxa de juros para tentar desestimular o crédito e a quantidade de dinheiro na economia, o que tende a diminuir os gastos das empresas e dos consumidores. Com isso, espera-se controlar a alta dos preços. O preço que se paga é uma atividade econômica menos aquecida.
Diante da necessidade de equilíbrio nas decisões, economistas disseram ao Brasil 61 que a autonomia do Banco Central deve ser preservada. Segundo o presidente do Instituto Mises Brasil, Helio Beltrão, as taxas de juros devem ser decididas de forma técnica e não política.
“Os governantes querem colocar as mãos na máquina de imprimir dinheiro e controlar o crédito do Banco Central, porque isso infla as receitas do governo e, se você diminuir as taxas de juros de forma artificial, isso, inicialmente, gera uma animação econômica, que não tem sustentação. Vai gerar inflação e recessão em seguida. Foi o que aconteceu entre 2010 e 2015, quando o Tombini [ex-presidente do Bacen] baixou a Selic, muito pressionado pela Dilma, de 14% para 7%, e causou aquela animação e depois a gente pagou a conta com a pior recessão da história do Brasil.”
Fernanda Mansano, professora de cenários econômicos do Ibmec, explica que ao passo em que o Banco Central tenta fazer a inflação convergir para a meta, o novo governo quer expandir os gastos, duas coisas que não combinam. “O Banco Central está sempre com o pé no freio, de certa forma, enquanto o governo tem o objetivo de estimular a economia através dos gastos públicos. Para aumentar os gastos públicos, ele precisa de juros menores.”
Autonomia
Segundo os especialistas, qualquer mudança em relação à autonomia do Banco Central seria um equívoco. Eles explicam que o fato de os diretores e o presidente da instituição poderem decidir a política monetária de forma independente, sem interferência do poder Executivo, é positivo.
Fernanda Mansano lembra que, em relação a economias mais avançadas, como Estados Unidos, União Europeia e Japão, a independência do Banco Central no Brasil é uma mudança recente e que deve ser preservada. “É importante que o Banco Central mantenha a autonomia para a gente não entrar no que a gente chama de dominância fiscal. O que é dominância fiscal? É o Banco Central não conseguir fazer sua política monetária, não conseguir chegar nos seus objetivos, que é o controle da inflação”.
Ela afirma que, sem autonomia, o Banco Central perderia a capacidade de, por meio de uma política monetária mais contracionista, isto é, com taxas de juros rigorosas, evitar efeitos negativos motivados pelos gastos elevados do governo ou outros fatores. “Então, a política fiscal, por exemplo, é sempre uma política de estímulo, mas se você tem os juros maiores, você acaba travando essa política fiscal”.
Na avaliação do professor de finanças e controle gerencial do Instituto de Pós-Graduação em Administração, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Rodrigo Leite, preservar a autonomia do Banco Central não significa “blindar a instituição de escolhas políticas”, porque quem escolhe o comandante da instituição continuará sendo o presidente da República.
“A autonomia é importante do ponto de vista de blindar [o Bacen] duma vigilância política, no sentido de que, ‘se você não fizer isso, eu vou te demitir’. Então, a autonomia é só uma forma de você dar um status ao Banco Central que outras agências dentro do próprio governo já tem, seja ela o Cade, uma agência reguladora. Precisa de autonomia para funcionar. Você não pode ter interferências políticas, porque isso acaba tirando a decisão técnica desses órgãos”.
O mandato de Roberto Campos Neto, atual presidente do BC, acaba no fim do ano que vem. Depois, o presidente Lula poderá indicar o substituto, que deverá ser aprovado pelo Senado. A não-coincidência do início do mandato presidencial com a escolha do presidente do Banco Central foi aprovada pelo Congresso Nacional. Dessa forma, quando um novo governo assume, ele tem que esperar dois anos para indicar um nome para chefiar o Bacen.
Helio Beltrão acredita que esse formato é positivo. “Quando o BC não tem autonomia e quem indica os diretores e o presidente é o próprio governante em exercício, você tende a ter uma manipulação dessas taxas de juros e da quantidade de crédito da economia e isso pode ser muito destrutivo.”