Jogador de futebol
*05/12/1936†15/10/2023
Inocêncio Nascimento dos Santos veio no trem de passageiros de sua cidade natal, Conceição de Feira, para Brumado, em 28/10/1956, a convite de Expedito Guedes – Canetão. O apelido lhe fora colocado devido ao comprimento de suas pernas. Expedito, que também era conceiçoense e atuava em Brumado, como goleiro do Real Atlético Futebol – RAF –, fez o convite a Inocêncio, por ser excelente futebolista, com a finalidade de colocá-lo para jogar no seu time.
Foi apresentado por Expedito ao presidente do Real, Mário Trindade e a Érico Dias Lima, jogador e um dos dirigentes da equipe, a qual Inocêncio defendeu com amor e dedicação. Por ter pouca instrução, deram-lhe emprego de ajudante de pedreiro. Posteriormente, por diligência e necessidade, aprendeu e exerceu a profissão de pedreiro, trabalhando para diversas firmas e para particulares.
Defendeu a seleção de futebol de Brumado, considerada imbatível pelo seu plantel de jogadores experientes. Em razão do seu futebol atraente e por suas duras jogadas de zagueiro viril, Inocêncio foi convidado para jogar no Corinthians de Vitória da Conquista, onde morou por alguns anos. Por todas as agremiações que defendeu, foi campeão, segundo suas informações.
Seu futebol de grande craque o levou a morar em outras cidades, como Caculé, Montes Claros e Teófilo Ottoni, mas foi em Brumado que fixou residência, casou-se e teve dez filhos. Hoje, está aposentado por idade e, vive esquecido, tendo a fama de outrora como lembrança dos tempos áureos em que brilhou como futebolista.
Além de pedreiro, Inocêncio desempenhou outras funções: foi árbitro da Liga Brumadense de Futebol, guarda-noturno, vigilante da prefeitura no período de 1983 a 2002 e carcereiro na delegacia, por indicação do delegado Gilberto Brito, além de ter prestado serviços diversos a outras pessoas.
Em Conceição de Feira, Inocêncio vivia com a mãe Silvina Nascimento dos Santos, em companhia de mais três irmãos. Trabalhava num armazém de fumo, um produto da região, utilizado para fabricação de charutos, cigarrilhas etc., mas o que lhe agradava mesmo era uma “pelada”. Praticava o futebol por prazer. Era uma obstinação. Desde menino, mostrou-se interessado pelo futebol.
Jogou em vários times de futebol, inicialmente no Real Atlético de Futebol (RAF), tendo como presidente Mário Trindade e Érico Dias dirigente e jogador e Edmir Edvar Lobo. Depois, defendeu a Associação Atlética Portuguesa, que foi administrada pelos presidentes José Rizério de Carvalho (Juca), Oflávio Silveira Torres (Flavinho), técnico e diretor Neuton Carvalho Torres (Neutinho) e diretores Olavo da Silva Leite, Geonísio Viana (gráficos), Vicente (estatística IBGE) e outros.
Zé de Braga, apelido que lhe colocaram Gilson Brito, Ronaldo Carvalho e Ézio Azevedo, frequentadores e amantes do futebol de campo, porém não se sabe a origem dessa alcunha.
Conta-se que Inocêncio ou Zé de Braga, foi contratado como vigia noturno de uma determinada casa pertencente à pessoa de expressão política da cidade. O vizinho, ao tomar conhecimento desse serviço, solicitou a Inocêncio que também vigiasse a sua residência, mediante pagamento combinado.
O vigia levava um rádio para se distrair e escutar os programas da emissora rádio Globo, especialmente a irradiação de jogos e as resenhas esportivas, a sua verdadeira praia. Certa feita, estava sendo transmitido um jogo entre Flamengo e Vasco da Gama, times rivais do Rio de Janeiro. A agremiação do dito vizinho, fanático torcedor do Vasco , estava sendo derrotada. Irritado e contrariado, foi procurar Inocêncio para mudar de estação, pois estava aborrecido com o placar desfavorável do jogo.
Ao ouvir a transmissão do rádio e não encontrando o vigilante, desligou o aparelho e ficou esperando até que o vigia aparecesse. Ao chegar, o vigilante inventou uma desculpa que não convenceu o contratante. Este desfez o compromisso, alegando que não pagaria para ser enganado. Inocêncio, sabedor de que o vizinho estava furibundo com a derrota de seu clube, ainda tentou acalmá-lo, mas não teve êxito.
Como sempre fazia, ligava o rádio, colocava-o em um ponto estratégico (nessa época, não havia ladrões como hoje) e saía para um bate-papo descontraído no point da cidade. Só voltava bem mais tarde para o seu posto de vigia.
Nas décadas de 1950-1970, a cidade de Brumado vivia o auge de uma etapa gloriosa do futebol de campo. Jogadores de destaque de outras cidades, a exemplo de Inocêncio, Chunguinha, Nilo de Caculé, Idalino Ribeiro (Condeúba), Mário Codorna, Ensopado, Rosildo Schitini, Nardo, Pracinha, Teleco, Carlinhos, Babalaô, Bengala (Mineiro), beque famoso pela defesa que fazia nas bolas aéreas e, tantos outros que prestigiaram suas agremiações que foram recrutados em outras cidades para defenderem os times contratantes e se juntaram aos jogadores locais, como Gilberto Cardoso, Edmundo Pereira, Jaci, Milton chefe, Gessé, Quipa etc., formando um grupo de craques famosos pela habilidade futebolística.
O Bahia da Cavalhada, bairro brumadense, cujo técnico era Zitinho, conhecido como ‘Zitinho do Bahia’, quando disputava um jogo, quase todos moradores do bairro marcavam presença no estádio dos Prazeres. Era uma força futebolística respeitada que arrastava multidão de apaixonados pela agremiação.
Havia uma disputa renhida entre os clubes Real e Portuguesa. Confrontavam-se pela disputa da hegemonia futebolística. Outros clubes compunham o campeonato municipal: Magnesita, Talmag também da Magnesita, Vasco da Gama da Magnesita, Flamengo, Arsenal, Santa Cruz (time comandado por seu Albertino Marques Barrêto, ex-vereador e Espírita convicto) e o Fluminense do São Felix (são os times que me lembro).
A maior rivalidade da cidade era entre o Real e a Portuguesa. Muitos desses jogadores ádvenas foram trazidos e encaminhados para empregos por Oflávio Torres (Flavinho da Portuguesa), um apaixonado pelo futebol de campo e por Mário Trindade do Real, e outros componentes da diretoria das agremiações.
Inocêncio defendia as cores do time a que pertencia com a competência de um excelente jogador de defesa, usava o esporte-arte e vibrava com as vitórias. Irritava os adversários com gozações pertinentes. Emprestou o seu talento futebolístico visando um emprego que lhe desse segurança e sustento, pois o futebol no interior era amador. Não havia contratações e os pagamentos formais dos profissionais de hoje.
Depoimento de Napoleão Barbosa, amigo de Inocêncio e um grande esportista em Brumado, aficionado pelo futebol de campo e um dos presidentes da Liga Brumadense de Futebol: “A vida de Inocêncio é rica em coisas boas. São várias as facetas que pontilharam a sua existência. Tive a honra de conhecê-lo logo que cheguei aqui em Brumado, no ano de 1963, daí para cá, sempre nos demos muito bem. É portador de qualidades que só as têm as grandes figuras humanas. O que sempre pautou a vida de Inocêncio: a fidelidade e o respeito para com os seus amigos. Eu não tenho palavras para enumerar todas as façanhas de Inocêncio enquanto jogador de bola, contudo, vale dizer que, se fosse hoje, seria um dos maiores craques do futebol baiano”.
Pessoas da elite que atuaram no futebol de campo em Brumado: Délio Gondim Meira (advogado), Wilson Farani, goleiro, (contador), Érico Dias Lima (professor), Odetino Meira (funcionário público), Pedro Rodrigues (comerciante), Waldemar, Zuzu Ribeiro (dono de carpintaria), Juarez (comerciante) e Antônio Dualte, entre outros.
Foi de grande destaque, como incentivador participativo do futebol de campo, o senhor Wilson Gonçalves, contador da Magnesita S.A., entusiasta dessa modalidade de esporte. Ele, inclusive, trouxe alguns jogadores de Minas Gerais, para reforçarem os clubes da Magnesita, oferecendo-lhes emprego, para essa finalidade. Pelo seu envolvimento e participação no futebol brumadense, também merece ser homenageado.
Para a manutenção desses jogadores e outras despesas com o time, a Portuguesa criou o “Bolão da Portuguesa”, por meio do qual os assinantes prognosticavam o placar do clube de sua preferência, sendo esse clube local ou não, além de poder optar pelo empate. Da renda do bolão, era tirada uma porcentagem para o clube patrocinador do jogo. Não havendo acertador do escore, o montante ficava acumulado.
As concentrações da Portuguesa, eram feitas no Hotel São Jorge, de propriedade do senhor Pedro Reis, reconhecido torcedor da Portuguesa, e o Real no Hotel Dois Irmãos, de propriedade de Dona Aurinha, esposa do senhor João Gualberto de Souza, seu Diúta. O público vibrava, prestigiava e defendia as suas agremiações com fervor e entusiasmo. Comentavam os resultados dos jogos em vários lugares, e os fanáticos faziam resenhas pertinentes, com acusações variadas, principalmente contra o árbitro.
Os árbitros de futebol eram escolhidos entre os jogadores de destaque dos times, em comum acordo com os clubes, para apitarem os jogos do campeonato, desde que não envolvessem as suas agremiações em campo. Dentre esses jogadores, atuaram como Juiz de futebol Érico Dias Lima, Valdinho (goleiro do Magnesita) e, o próprio Inocêncio.
Atualmente, o futebol de campo em Brumado está esquecido, abandonado e desprestigiado. Não há incentivo nem apoio para essa modalidade de esporte.
Em homenagem merecida a Gilberto Cardoso, grande atleta do futebol local, falecido em 31/08/2010, brumadense que se destacou por seu talento futebolista, a Câmara de Vereadores de Brumado denominou, em 18/11/2010, o Estádio dos Prazeres, que passou a chamar-se Estádio de Futebol Gilberto Cardoso – “O GILBERTÃO”.