O estado soma 286 novos processos entre janeiro e outubro de 2024; redução foi de quase 72% em relação ao mesmo período de 2023
Por Arthur Gandini Comunicação Jurídica
A Bahia contabilizou 286 novos processos relacionados à aplicação de medidas de proteção à criança e ao adolescente entre janeiro e outubro de 2024. É o que aponta levantamento inédito com base no BI (Business Intelligence) do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), por meio da consolidação dos dados e da verificação dos assuntos presentes nas tabelas de gestão processual do órgão. Esse número representa uma média de um processo ajuizado por dia no estado.
Apesar do volume expressivo, houve uma redução de 71,49% em 2023 o estado registrou 1.003 novos processos no mesmo período.
O Brasil registrou, ao todo, 63.443 novas ações judiciais sobre o tema entre janeiro e outubro deste ano. Estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais lideram o volume de casos. Em São Paulo, foram contabilizados 13.734 processos no período, com uma média de 45 novas ações por dia. Já no Rio Grande do Sul, foram 7.597 ações, uma média de 25 processos diários. Em terceiro lugar, Minas Gerais aparece em terceiro lugar, com 4.656 casos e uma média de 15 ações por dia.
As ações judiciais relacionadas à proteção de crianças e adolescentes têm como objetivo garantir seus direitos em situações de vulnerabilidade, como negligência, violência física ou psicológica e outras formas de violação. Com base no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), essas medidas buscam assegurar a proteção integral e incluem iniciativas previstas no artigo 101, como o encaminhamento para a família substituta ou acolhimento institucional, essenciais para promover a segurança e o bem-estar de crianças e adolescentes em situação de risco.
Luiz Vasconcelos Jr, especialista em Direito da Família do VLV Advogados, explica que “quando a gente fala em matéria de medidas de proteção para criança ou adolescente, analisando o artigo 101 do Estatuto da Criança ou Adolescente, a gente vai ter uma série de atitudes que podem ser tomadas pelo poder público para poder auxiliar uma criança ou adolescente que se encontre em situação de vulnerabilidade”.
Essas atitudes incluem desde o encaminhamento dos pais ou responsáveis, passando por orientações e apoio para a família, até programas de apoio e promoção da família, e até mesmo o acolhimento institucional ou a colocação em uma família substituta, quando necessário.
“Podemos citar também o encaminhamento do pai ou do responsável em uma legião de termos de responsabilidade, além de orientação e apoio para a família, matrícula e frequência em estabelecimento de ensino fundamental, envio para programas de apoio e promoção da família, requisição de tratamento médico ou psicológico, inclusão em programas sociais, ou até mesmo em um acolhimento institucional, um acolhimento familiar e, em medidas mais graves, até mesmo a colocação em família substituta”, ressalta o especialista.
Já de acordo com a Mayra Sampaio, advogada de família do Mayra Sampaio Advocacia e Consultoria Jurídica, as medidas são aplicáveis nos casos em que os direitos da criança ou adolescente forem ameaçados ou violados devido à ação ou omissão da sociedade, do Estado ou dos pais ou responsáveis. Ela explica que a escolha das medidas se baseia na necessidade pedagógica e deve ser sempre voltada para o melhor interesse da criança. “E a reintegração familiar, que por exemplo, só ocorre quando os familiares conseguem reverter as circunstâncias que levaram à aplicação das medidas de proteção”, acrescenta.
A advogada também destaca os desafios na implementação eficaz dessas medidas. “Há uma precariedade no investimento de políticas públicas para evitar que a criança ou o adolescente tenham sua dignidade, saúde e segurança atingidas. Não fosse só isso, até mesmo o judiciário falha na implementação dessas medidas. Muitas vezes, a criança não deve ficar com os pais, há todo um histórico de abuso, mas ainda assim, há muita resistência na destituição do poder familiar”, explica.
Caminho pela frente
Os especialistas apontam que o ECA traz garantias à criança e ao adolescente, mas ainda há o desafio de que elas realmente sejam efetivadas na maior parte dos casos. O principal desafio no Brasil é a falta de aparato estatal em meio à realidade das regiões mais periféricas e as dificuldades em alcançar as crianças que mais precisam. “Então, imagina que no Brasil já tem catalogado ali cerca de 100 mil crianças que vivem em situação de rua, que é uma situação de vulnerabilidade extrema”, aponta o advogado Luiz Vasconcelos Jr. “Só que além disso, a gente tem uma linha de pobreza muito grande. Então, em regiões mais periféricas, de grandes centros, ou mesmo em cidades pequenas, a gente vai ter muitas crianças que não vão ter acesso ao básico”, afirma.
Outro ponto ainda é que o Estado enfrenta desafios não só em termos de recursos, mas também em termos de visibilidade da situação de vulnerabilidade das crianças. “E muitas vezes o vizinho não denuncia, o tio não denuncia, as pessoas sabem da situação, mas preferem não se envolver. Em alguns casos, se tornam bastante graves. Mas a partir do momento que é cientificado, que se verifica a existência dessa situação, então a gente vai ter ali um conselho tutelar, por exemplo, que pode ser acionado”, finaliza.
Foto: TV Brasil