Era profissional em dar cabeçada.
Isso mesmo: cabeçada, cabeça na parede.
Nada que fazia prosperava.
Ia de lá para cá, daqui para ali e tum, tum, tum.
Só cabeçando, esfolando por inteiro.
Em todas as áreas, em todos os tempos.
Mas também só fazia o que a pobre que se batia queria.
Ela sofria tanto sendo tacada na parede que não custava, de quando em vez, fazer um pouco suas vontades.
E, com esse pensamento, só as vontades dela fazia.
E lá ia Ele, fazendo o que Ela queria e se batendo.
Até que um dia…
Um dia encontrou Alguém.
Alguém disse a Ele que, se deixasse de fazer o que Ela mandava e seguisse suas ordens, tudo daria certo.
Ele pensou, pensou e achou a verdade: Ele fazia sempre o que Ela queria por suas vontades serem idênticas, iguaizinhas.
Então, seguindo a cabecinha que era jogada de parede em parede, Ele fazia suas próprias vontades.
Mas abandonar o que se quer é tão difícil, Ele pensou.
Fazer a vontade alheia é tão chato.
Pensou em não aceitar a proposta de Alguém. Foi quando sentiu uma pontada bem no lugar onde havia batido sua cabeça a última vez.
Aceitou.
Passou a seguir exatamente tudo o que Alguém mandava: hora de deitar, hora de levantar, o que comer, como se exercitar, como se comportar com as pessoas da família, do trabalho, da escola…
Seguindo exatamente tudo, tudo mesmo, o que Alguém o orientara a fazer.
Algumas vezes, tinha vontade de sair correndo, mandar Alguém ir catar coquinho, dar as mãos para sua cabecinha oca e seguir a vida.
Quando essa vontade surgia, lembrava-se de todas as paredes onde já havia cabeceado e grudava em Alguém.
O tempo foi passando e as coisas começaram a dar certo.
Aqui, ali, em toda parte.
Quando Ele se deu conta, tudo, tudo mesmo, estava fluindo lindamente.
Nem se lembrava mais das cabeçadas que dera, muito menos daquela coleção de frustrações.
Hábitos transformados, cabecinha modificada…
Alguém o pegou pela mão e disse:
“Vá em frente! Não se esqueça de nada do que você aprendeu até aqui, nada mesmo, continue obedecendo e seja feliz!”