A reforma é grande, mas ainda existem diversos pontos que precisarão ser discutidos com a possibilidade de negociação entre empregadores e empregados |
A proposta de reforma trabalhista do governo está causando o maior alvoroço entre empresários e colaboradores – isso porque existem muitas ideias pouco discutidas com a “cabeça fria”. Muitas são as dúvidas se este cenário é algo positivo ou negativo e até onde pode influenciar no dia a dia do brasileiro e no mercado. Afinal, esta é ou não é uma medida? Conversamos com a advogada Dr.ª Beatriz Dainese, da Giugliani Advogados, para comentar sobre algumas das principais dúvidas e pontos da nova medida. Confira:
Férias três vezes ao ano
Esta alteração veio para viabilizar que funcionários e empregadores possam melhor negociar períodos de férias. Isso porque, muitas vezes, os funcionários preferiam “vender suas férias”, o que dificultava muito a negociação dos períodos com os empregadores. No mais, em muitos casos, afastar um funcionário por mais de cinco dias pode ser muito prejudicial para a atividade da empresa, dada a importância que alguns funcionários refletem para elas. Com essa possibilidade de dividir as férias em três períodos, ambos podem ser beneficiados, sem, contudo, tirar o principal objetivo das férias, que é permitir que o funcionário descanse para voltar a sua rotina normal de trabalho.
Negociações e acordos
A flexibilização das negociações entre funcionários e empregadores vem para adequar a necessidade de ambas as partes à atualidade que estamos vivendo. Muitas vezes, a inflexibilidade na negociação prejudica ambas as partes, mormente os funcionários. Com este aumento da possibilidade de negociação, ambas as partes poderão verificar o que melhor se adequa a cada categoria, sem restringir nenhum direito fundamental. A preocupação se dá com a previsão de que o “Acordo” se sobreporá à legislação. Infelizmente não é em todas as categorias profissionais que temos uma efetiva representação sindical e, desta forma, poderá haver grandes insurgências entre os acordos e a legislação vigente. Nas situações abaixo a negociação entre funcionário e empregador poderá prevalecer sobre a lei trabalhista, segundo a proposta do governo:
– Parcelamento das férias anuais em até 3 vezes.
– Cumprimento da jornada limitada a 220 horas mensais (44 semanais).
– Participação nos lucros e resultados da empresa.
– Horas no trajeto entre trabalho e moradia.
– Intervalo intrajornada respeitando o limite mínimo de 30 minutos.
– Ingresso no Programa do Seguro Emprego.
– Plano de cargos e salários.
– Banco de horas, garantida a hora adicional com acréscimo de no mínimo 50%.
– Trabalho remoto.
– Remuneração por produtividade.
-Registro da jornada de trabalho (ponto).
Terceirização
A terceirização ocorre quando uma empresa ou pessoa física contrata outra empresa para realizar determinados serviços. A principal mudança foi a possibilidade de contratar prestadores de serviços para a atividade fim das empresas. Isso significa, por exemplo, que em uma empresa de software que antes somente poderia terceirizar uma atividade meio, como a limpeza e a contabilidade, agora poderá terceirizar a própria produção do software. Não podemos perder de vista que a lei vem regularizar algumas relações já existentes, na qual o empreendedor assumia o risco. Agora com a possibilidade de contratar prestadores de serviço para atividades fim, as empresas terão regularidade nessa prática.
Antes de “terceirizar” toda a sua força de trabalho, é importante se atentar a algumas questões. Embora agora seja possível contratar prestadores para uma atividade fim, se houver subordinação, habitualidade e pessoalidade do trabalhador, o tipo de contrato ainda deverá ser o CLT. Este ponto não foi alterado e representa um grande risco de uma terceirização “desenfreada”.
O texto prevê a responsabilidade subsidiária da empresa contratante em relação às obrigações da prestadora de serviços. Assim, em um processo trabalhista, a empresa contratante poderá ser obrigada a indenizar o profissional em dinheiro ou penhorar bens somente se a prestadora dos serviços não tiver outros itens para o pagamento da condenação por conta de direitos não pagos.
As regras anteriores, previstas pela Lei 6.019/74, previam a responsabilidade solidária; ou seja, a penhora de bens da empresa contratante e da prestadora de serviços poderia ser feita simultaneamente e as duas respondiam com seus bens para o pagamento da causa movida pelo funcionário.
Contribuição sindical
A sindicalização deve ser opcional. Prever esta condição de ser opcional é garantir o princípio constitucional da livre associação.
Multa
Esta previsão de multa vem de encontro a todos os preceitos previstos na Legislação Trabalhista, mormente os que determinam que os funcionários devem ser devidamente registrados em CTPS para iniciarem as atividades em uma nova fonte empregadora. Desta forma, todos os direitos trabalhistas são resguardados. A previsão das multas e sua majoração vêm para reafirmar e forçar as empresas a agirem nos exatos termos da Lei.
Banco de horas
Esta previsão veio para beneficiar a negociação da implementação do Banco de Horas para as empresas. Isso porque, atualmente, para instituir o Banco de Horas é necessário acordo coletivo ou previsão na Convenção Coletiva de Trabalho. Desta forma, por ser necessária a participação do sindicato, muitas vezes as negociações tornam-se infrutíferas. Podendo o acordo de compensação de horas ser firmado por acordo individual funcionário e empregador poderão verificar se é a melhor alternativa para cada caso e, desta forma, pactuarem.
Jornada de trabalho de 12×36 horas
Esta previsão veio beneficiar funcionários que precisam trabalhar nesta escala, pois incluiu o DSR (Descanso Semanal Remunerado) em feriados e também veio beneficiar as empresas ao prever, de forma expressa na legislação, a possibilidade de aplicar a jornada 12 x 36.
Trabalho remoto ou home office
Veio para formalizar uma situação que já vem existindo há anos nas empresas, por ser uma tendência mundial. O trabalho Home Office traz inúmeros benefícios para o funcionário e para a empresa empregadora, mormente em relação à contenção de gastos, mas até o momento não existia uma norma regulamentadora desta forma de trabalho. Com a previsão expressa e sua regulamentação, as condições de trabalho ficam mais claras entre as partes, afastando, da mesma forma, riscos para ambas.
Trabalho insalubre para mulheres gestantes
No tocante a este ponto, as opiniões se divergem. De um lado, há quem entenda que é uma forma de aumentar os acidentes de trabalho e a aquisição de doenças ocupacionais, haja vista expor uma gestante a trabalhos que pode não suportar dado ao estado gravídico. De outro lado, há quem entenda que esta previsão se coaduna com a realidade que cada gestante se encontra. As empresas devem ter a cautela de ter em mãos o atestado que permite que elas continuem trabalhando para que a saúde da mulher e do bebê sejam mantidas. Por tratar-se de uma situação nova, este ponto ainda deverá ser bastante discutido.
Dano extrapatrimonial
Esta previsão vem de encontro com o que vemos na prática perante o Poder Judiciário. Realmente evitará decisões judiciais em que às vezes o dano é concedido e às vezes o dano não é concedido, pois até o momento dependemos de uma análise apenas subjetiva por parte do juiz.
Trabalhador autônomo
Esta previsão veio para afastar o risco que as empresas sofrem ao contratarem autônomos e estes, posteriormente, ingressarem com processo trabalhista sob a alegação de configuração de vínculo empregatício. É muito comum termos inúmeros processos trabalhistas de autônomos que ingressam com pedido de reconhecimento de vínculo e, em muitos casos, os pedidos são julgados procedentes. Com esta previsão, ambas as partes terão expressa ciência que a contratação de autônomo não gera o vínculo empregatício.
Justiça do Trabalho
Esta previsão trata maior segurança jurídica para todos que ingressam no poder judiciário, pois evitara decisões dispares para causas idênticas.
Agir com má-fé
Esta previsão também beneficia todas as partes bem como o próprio poder judiciário. Inibirá que uma parte entre despropositadamente com um processo, sob pena de ser considerado litigante de má-fé.