Santo Tomás de Aquino, à luz da Filosofia, estabelece uma distinção entre a verdade substancial e a verdade formal.
A verdade formal é aquela que decorre da aparência das coisas. A verdade substancial é aquela que expressa a natureza profunda do ser das coisas.
A partir da concepção de Santo Tomás de Aquino, desejo tecer considerações sobre uma prática policial que está se tornando comum. Alguns presos, antes mesmo de serem apresentados a um juiz, têm sua cabeça raspada.
A Polícia alega que essa providência tem objetivo higiênico pois os cabelos do preso podem gerar a proliferação de germes patogênicos dentro da prisão. Esta é a verdade formal. Fosse essa a razão da medida, o preso de cabeça raspada não seria exibido na televisão.
Se buscarmos a verdade substancial, na linha de Santo Tomás de Aquino, a atitude de raspar a cabeça do preso e exibir a cabeça raspada diante das câmeras, como verdadeiro troféu, tem a finalidade real de humilhar o preso.
Se o indivíduo julgado e condenado não pode ser humilhado, muito menos pode ser humilhado aquele que nem julgado foi.
A Constituição Federal garante ao cidadão preso o respeito a sua integridade física e moral. (Artigo quinto, inciso XLIX). Esse respeito à integridade física e moral tem, como fundamento, a dignidade da pessoa humana.
Não pense o cidadão comum que o assunto não lhe interessa porque não está preso. Se a opinião pública assiste, sem protestar, à afronta de um artigo constitucional, estará concedendo permissão para que outros artigos sejam violados.
Amanhã você, que é um homem de bem, terá sua casa invadida pelo credor, acompanhado de um policial, para que lhe seja subtraído um determinado aparelho doméstico. Você comprou a crédito esse aparelho e deixou de pagar uma prestação por estar às voltas com a saúde de um filho internado num hospital. O credor sente-se no direito de fazer justiça com as próprias mãos. Isto porque ele integra a parte sadia da sociedade (os homens que pagam as contas) e você é um transgressor (não honra os compromissos financeiros).
Se o lar de alguém é invadido, não importa quem seja esse alguém, estará sendo desrespeitado o artigo quinto, inciso onze, da Constituição Federal, que estipula seja a casa o asilo inviolável do indivíduo.
A Constituição não protege apenas a casa ou apartamento. Protege também o barraco de zinco, a habitação coberta por pedaços de papelão, a choupana humilde onde o ser humano se recolha para o repouso e a paz interior a que tem direito.