A poesia está lá no canto da sala, na mesa do rádio de pilha, no fio que desce e desaparece num buraquinho da parede, ao rés do chão.
A poesia está lá no pequeno quintal. Numa parte, perto da calçada que leva até a porta da sala está a poesia. Coberto de plantas, o quintal se enfeita de dálias, rosas, hibiscos, margaridas, gérberas, verbenas e lírios. – lírios,
Lírios lindos!
Lá está a poesia. O viveiro cercado de flores guarda uma infinidade de trinados. São azulões, pássaros – pretos, curiós, sabiás, bem – te -vis, bicudos e muitos outros mais. Ainda que presa a poesia está lá e o céu azul floresce sobre a casa humilde, sobre o vilarejo.
Tempos mais ou menos felizes; mais ou menos tristes. É. Nem tudo é perfeito!
A poesia está lá, na porta meio torta, madeira carcomida por cupins; no banheiro estreito; no forno de barro ao lado da cozinha, num canto do quintal. Está lá, a poesia. Na panela de ferro, água fervente esperando o feijão. Na chuva que um dia veio trazendo pedras de gelo (ninguém até então ouvira falar em chuva de granizo!). No frio dolorido dos meses de inverno; naquele silêncio opressivo das noites e dos dias inventando medos, jogos, estórias e canções.
É. A poesia! Sempre esteve lá entre nossas pernas entrelaçadas, nossos olhares e nas poucas palavras que nos dissemos então. Sempre esteve em nós. Em nossa casa, em nosso olhar porque em nós nascem rios, brotam sementes, desabrocham flores, surgem auroras e pôr de sol; brilha o orvalho, ecoam canções de amor. Em nós o amor escorre fibra a fibra e se declara num gesto simples.
Lá, sempre esteve lá a poesia de nossas vidas, meu Pai.
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