Acordei hoje querendo me esconder, ficar quietinho, esperando o dia passar ou, quem sabe, dar um jeito que ele termine logo.
É meu aniversário.
Estou feliz, agradecido por tudo, afinal quem nasceu em 1976 e não está fazendo 40 anos em 2016 é por que está morto.
E eu, obviamente, estou feliz por estar vivo.
Mas, apesar de todos esses motivos, eu não gosto do dia do meu aniversário.
Não gosto nem de longe.
O povo fala que sou chato.
Posso até ser, na verdade, acho que sou mesmo, mas sendo ou não sendo, não gosto das pessoas me parabenizando, de ser o centro das atenções em um evento.
Já pensou?
Um monte de gente indo para um lugar só por que estou ficando velho?
Meus amigos saindo de suas rotinas, deixando o futebol, a sinuca, ou seja lá o que for, para me dar parabéns?
Não!
Não precisa disso, mesmo.
Aí agora, quando ainda nem saí da cama, fico aqui imaginando como posso fazer para passar o dia invisível.
Acho que não tem jeito, preciso cuidar da vida.
Com o passar das horas…
O dia passa sem surpresas.
Alguns telefonemas, mensagens, mas nada fora da normalidade tolerável.
Quando o expediente termina saio quietinho, sem dar tchau para ninguém.
Direto pra casa, sem escala em lugar nenhum.
Parece que o dia vai terminar bem.
Quando abro a porta:
“Surpresa!!!”
Todo mundo que passou o dia em absoluto silêncio estava ali no meio da minha sala.
Misericórdia!
Quem teria sido tão insensível a ponto de organizar uma festa surpresa para a minha pessoa?
Enquanto meus amigos cantam parabéns eu fico procurando, no meio deles, o responsável pela invasão à minha casa.
Não quero nem imaginar a cara com que os olho.
Eu sou insuportável: quando não gosto de alguma coisa, por mais que eu tente não adianta, não consigo disfarçar.
E naquele momento, quando eu queria apontar a todos a saída da minha casa, eu precisava ser minimamente educado.
Ainda não tinha encontrado, em meio à pequena multidão, o responsável por aquele desconforto.
Fui sendo beijado, felicitado, abraçado.
E eu sorrindo e pensando:
“Meu Deus, que desespero, onde será que dá pra eu me esconder?”
Não tinha onde.
Tentar, eu estava tentando, mas, a cada pouco, quando alguém me beijava, entregava um presente, dava os parabéns, eu que estava quase conseguindo me enganar com o “você está celebrando a amizade e nada mais” ficava constrangido outra vez.
Após duas horas e meia que eu havia chegado à casa, contadas de relógio, as pessoas começaram se despedir, lentamente.
Foram saindo uma a uma, indo embora.
Até que me vi sozinho no meio da sala.
Pela casa, espalhados inúmeros copos, na cozinha pratos e mais pratos, talheres e restos de comida.
Um pedaço de bolo destroçado na mesa da sala e guardanapos em lugares inimagináveis.
Nem quem tão bondosamente organizou a festa surpresa ficou para me ajudar organizar as coisas.
Todos se foram.
E eu fiquei sozinho.
Beijado, abraçado, com um monte de camisas, meias, livros novos e a bagunça.
Dizem que a vida começa aos 40, acho então que vou rever alguns conceitos.
Já que esse povo não me larga, vou eu mesmo armar minhas festas a partir de agora e bem longe da minha casa!
Afinal, eu não gosto do dia do meu aniversário, mas odeio mesmo as surpresas que ele traz!