Apesar da idiotice do gesto de se desperdiçar de água derramando-a sobre a cabeça, o tal desafio proposto pela ALS Association para angariar fundos para o combate da esclerose lateral amiotrófica evidenciou dois pilares do pensamento liberal.
O primeiro é o da eficiência da iniciativa privada. Alguém, alguma pessoa teve a ideia de angariar fundos por meio de uma campanha inusitada, divertida e sem custos, que atraísse as pessoas. Conseguiram. Como se fosse pouco as centenas de milhões de dólares angariados em poucos dias, outras tantas instituições privadas que cuidam da mesma doença, em muitos outros países, também registraram grande aumento nas doações. Quanto tempo, quanta papelada seria gasta para se pleitear (sem a garantia de sucesso) este mesmo volume de recursos junto ao Estado, mesmo num país desenvolvido? Muito. Se essa mesma pessoa fosse um funcionário público, com toda a certeza sua ideia seria mais uma pastinha numa imensa pilha, cuja maior parte nem chega a ser lida.
No caso da ALS e de qualquer outra entidade privada do mesmo tipo, os recursos doados percorrem um caminho curtíssimo até seus respectivos usos, o oposto do que ocorre com o dinheiro que as pessoas pagam por meio de impostos na esperança de que parte dele banque ações sociais – quase tudo se perde ao passar pela burocracia, pelas mãos de funcionários públicos relapsos e pela má fé dos que gerenciam toda essa máquina; no caso brasileiro, quase sempre sendo desviado.
A verdade: A sociedade sempre é mais eficiente no exercício da filantropia do que qualquer governo. Quando um indivíduo quer e pode ajudar alguém, ele ajuda sem que ninguém tenha que lhe obrigar a isso.
É um absurdo a sociedade aceitar passivamente que o Estado se imponha como o único veículo para a caridade.
É um absurdo a sociedade aceitar passivamente o desperdício até de sua própria boa fé.
Uma pessoa que ganha R$ 2000 por mês paga R$ 800 em impostos apenas pelo que consume. Quanto desse dinheiro é realmente revertido em ação social? Quase nada, já que a maior parte dele é usado para simplesmente manter a estrutura do Estado, entre cafezinhos e ar-condicionado. Paralelo a isso estão as milhares de pequenas instituições filantrópicas que, se recebessem R$ 50 reais por mês de cada adulto do bairro, com toda certeza concretizariam mais ações beneficentes do que qualquer iniciativa estatal. Porém, quantos doam? Poucos. Poucos, porque uma parte realmente não pode doar, enquanto a outra parte se conforma (crendo na benevolência estatal) em ser doadora indireta por meio dos impostos que paga. Com toda certeza, se pessoas e empresas privadas do Brasil tivessem melhores condições, elas mesmas fariam suas ações sociais sem qualquer intermediário, a exemplo de muitos cidadãos que fazem trabalho voluntário (algo muito comum nos EUA) e empresas que viabilizam (voluntariamente!) seus próprios programas assistenciais.
Aquele simples ato da atriz Angelina Jolie de manifestar que retiraria uma de suas mamas para eliminar o risco de câncer, ajudou muito mais no combate ao preconceito sobre o assunto do que os milhões e milhões de dólares que governos gastam com isso.
A mesma verdade: O Estado não quer o seu bem, nem o meu bem, nem o bem de ninguém além daqueles que o controla. O Estado impõe-se como intermediário apenas para que seus agentes controlem o dinheiro da sociedade para fazer dele o que quiser, destinando uns trocados aos pobres e a maior parte dos recursos para o sustento de si mesmo.
Outro bom exemplo do poder da sociedade é o de muitas ONG’s ambientais e humanitárias que são sustentadas apenas por indivíduos e empresas privadas por meio de doações voluntárias originárias principalmente de países ricos. São desses países as maiores doações não porque seus cidadãos são mais bondosos que os dos países atrasados, mas sim porque eles podem (podem!) ajudar. Ajudam porque o Estado, em seus respectivos países, não é tão asfixiante quanto nos países pobres. A quase totalidade das pessoas carrega o desejo de ajudar os outros, porém, só ajudam quando se veem em conforto, uma situação rara ao cidadão comum brasileiro.
Resumindo: A sociedade não deve esperar caridade do Estado, mas sim cobrar dele a liberdade econômica necessária para que ela enriqueça por si mesmo, para que cada cidadão empenhe a caridade que puder e da maneira que lhe convir e a quem julgar merecer.
O outro fundamento liberal explicitado no desafio do balde de água é o que indica que as pessoas, mesmo em suas manifestações mais egoístas, contribuem para o bem coletivo. As centenas de milhares de pessoas que publicaram vídeos “cumprindo” o tal desafio tinham uma motivação primordial: serem vistas pela sociedade como pessoas solidárias e divertidas. Cada vídeo foi nada além que uma ação de qualificação social. Porém, cada ação de autopromoção compôs um movimento que viabilizou uma iniciativa de solidariedade. Mesmo aqueles que apenas despejaram o balde sobre a cabeça sem doar nenhum centavo, sem sequer falar sobre a campanha, acabaram ajudando a divulgar a própria campanha. Ou seja: Nossos interesses privados atendem, na grande maioria das vezes, aos interesses públicos.
O que não podemos deixar acontecer é que o Estado obrigue as pessoas a fazer caridade através dele próprio e à sua maneira. A caridade deve ser uma ação privada e voluntária. Os impostos que pagamos a um Estado cada vez maior e corrupto significam bilhões de reais que indivíduos deixam de doar para as mais diversas iniciativas privadas de caridade. Os países africanos vivem na miséria porque seus governos são proporcionalmente gigantescos, tomados de corrupção e de burocracia ao nível de dificultar até as ações das entidades humanitárias.
Enquanto estivermos sob um Estado interventor, nossa economia se arrastará, mantendo a maior parte da sociedade pobre e dependente dos humores dos políticos.
Enquanto estivermos sob um Estado que se impõe como o único vetor possível de solidariedade, a sociedade verá grande parte de seu dinheiro se perder enquanto assiste grande parte de si mesma na pobreza.