Praticamente todos os dias eu escrevo sobre política e sociedade. São pilhas de textos publicados em mais de quarenta jornais brasileiros, de norte a sul. Mas hoje sinto uma necessidade extrema de falar sobre um programa de televisão que me conquistou e, certamente, está cosendo uma teia cada vez maior de telespectadores. Trata-se de “Chegadas e Partidas”, uma espécie de série e reality show, apresentado por Astrid Fontenelle no canal pago GNT. O programa é baseado no original holandês “Hello Goodbye”, que já está em sua décima temporada e cujo formato é vendido para diversos países, entre os quais EUA, França, Alemanha e outros. Não por acaso, a versão brasileira, em sua primeiríssima temporada, é a melhor de todas.
Para falar de “Chegadas e Partidas”, recorro às palavras do escritor e filósofo norte-americano Ralph Waldo Emerson, em seu livro “Considerations by the Way”, quando discorre sobre o sucesso: “A vida traz a cada um a sua tarefa e, seja qual for a ocupação escolhida — álgebra, pintura, arquitetura, poesia, comércio, política — todas estão ao nosso alcance, até mesmo na realização de miraculosos triunfos, tudo na dependência da seleção daquilo para que temos aptidão: comece pelo começo; prossiga na ordem certa; passo a passo. É tão fácil retorcer âncoras de ferro e talhar canhões, como entrelaçar palha; é tão fácil ferver granito, como ferver água, se você fizer tudo na ordem correta.” No meio de tanta porcaria inútil que a TV brasileira vem produzindo nas últimas décadas, o programa da GNT é uma rara e extraordinária exceção, retorcendo âncoras como se entrelaçasse palha. E o faz com maestria.
Vou fazer um pequeno regresso temporal. Outro dia, eu e a atriz Maria Paula conversávamos durante um almoço sobre o poder das mulheres ao longo da história. Aliás, ela própria um ser de extraordinária luz, uma mulher do “casseta”! Chegamos exatamente à uma de suas crônicas publicadas todos os domingos na revista do jornal Correio Braziliense: “As Mulheres e a História”, de 26 de setembro de 2010. Nesse texto, uma brilhante Maria Paula diz: “Meu maior desejo é que o poder do feminino seja respeitado, com toda sua delicadeza, sua inteligência afetiva, sua capacidade de acolher o outro.” Tão logo fiz a leitura do texto, meus pensamentos foram invadidos pela apresentadora Astrid Fontenelle e seu “Chegadas e Partidas”, no GNT.
A produção de “Chegadas e Partidas” é impecável. Irreprimível. E cheia de mulheres que são – ou estão se tornando – ícones, tão respeitáveis quanto sensíveis, em suas áreas de atuação. A jovem diretora da atração, Mariana Khoehler, parece ter mãos alquímicas para conduzir uma ex-hiperativa Astrid e permití-la explorar à miúde sua melhor face: a destreza para ouvir as personagens da vida real e transformar isso nas mais variadas emoções que, rasas ou profundas, tocam sempre o telespectador, cativando-o.
A dinâmica de “Chegadas e Partidas” é de uma simplicidade incrível. Com um pequeno aparato de produção, algumas cadeiras de praia, muita paciência e um excelente senso de observação, a equipe se instala no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, e lança olhos de águia para capturar possíveis boas histórias daqueles que estão chegando ou partindo, dentre as milhares de pessoas que passam todos os dias por aquele movimentado saguão. É simples assim. E é incrível o que essa equipe já conseguiu registrar, não apenas em imagens, mas em bate-papos deliciosos conduzidos por Astrid, uma apresentadora em pleno e completo domínio de seus meios.
No que se viu até aqui, não há uma única história que não tenha mexido ou revirado os sentimentos dos telespectadores, ainda que fuçando naquele cantinho de nossas malas sensoriais, onde tentamos esconder dores ou delícias, um saudoso beijo de boas-vindas ou aquele abraço aflito e queixoso nos que se vão. Os aviões que levam e trazem histórias em “Chegadas e Partidas”, nada mais são que metáforas das idas e vindas de nossas próprias vidas e, por isso mesmo, nos parecem tão caras e próximas. Trata-se de um programa que é sucesso instantâneo e absoluto e com foco no que há de melhor: a emoção de muita gente, algo muito adequado a um canal de televisão que se chama GNT.
E o mesmo Emerson conclui: “A promessa do sucesso está sempre ao nosso alcance. Nossas preces são profetas. É preciso fidelidade; é preciso adesão firme. Quão respeitável é a vida que se aferra aos seus objetivos! As aspirações são belas; as teorias e os planos de vida são legítimos e recomendáveis. Mas você será fiel a eles? Num pátio repleto de gente, não mais que um em mil o são.” E talvez seja esse o grande truque de Astrid: a fidelidade à sua própria trajetória. Truque e trunfo que fazem de “Chegadas e Partidas” um programa imperdível. Um conglomerado de histórias dos mais díspares seres humanos. Um delicado equilíbrio entre a lágrima que vai e a gota que fica. Uma monumental, acertada e imperdível dose de emoções astridianas.