O assunto do momento em qualquer esquina desse Brasil é o segundo turno das eleições presidenciais, onde José Serra e Dilma Rousseff estão travando, certamente, a maior batalha de suas vidas públicas. O confronto já começou na TV, no rádio, na internet e nas ruas e no dia 31 de outubro vamos saber quem irá governar o Brasil pelos próximos quatro anos, pelo menos.
No entanto, lamentavelmente e para fugir de um debate mais profundo sobre questões prementes em nossa sociedade, como o aborto, a união entre pessoas do mesmo sexo e as reformas política e previdenciária, os comitês de campanha de Serra e Dilma decidiram que ambos sairão de cena e o foco será dado às comparações entre os governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.
É fato que os dois principais candidatos fizeram uma campanha presidencial pífia. Pareciam candidatos a “prefeitinho”, perdidos entres promessas de mutirões de catarata e construção de casas populares. E agora querem fazer pior: isentar-se. Lançar Lula e FHC aos leões em uma competição é, sobretudo, tomar o eleitor como um grande idiota. Mas, também é fato que na vida política não estamos no domínio das categorias lógicas.
A questão é que tanto FHC quanto Lula, cada um a seu modo e a seu tempo, realizaram boas gestões. O primeiro buscou a estabilidade econômica, o desenvolvimento e uma visão de Brasil inserido no contexto global; o segundo voltou seus olhos para o social, para o atendimento imediato aos milhões que estavam na miséria e acertou grande ao manter os caminhos da política econômica trilhada por seu antecessor.
Se, por um lado, Fernando Henrique foi assolado por graves crises financeiras mundiais e isso ajudou em sua avaliação ruim nos últimos anos de mandato, por outro, ele construiu bases sólidas e robustas de sustentação, que permitiram ao Brasil uma manutenção da estabilidade durante o último grande colapso que levou à falência diversos países do dito Primeiro Mundo. Com as alianças certas, apesar de muitas vezes questionáveis, FHC conseguiu aprovar reformas importantes, mas também soterrou capítulos indispensáveis ao ambiente político e democrático nacional.
Já Lula demorou para decolar, mas quando saiu do chão, foi aos píncaros. É o presidente mais bem avaliado da História e criou o maior sistema legitimado de compra de votos do planeta: o Bolsa Família. O programa tem grandes méritos, mas alimentou a fome paternalista que acomete a sociedade brasileira. Salvou-se da crise financeira, mas não foi firme o suficiente para impedir a maior crise ética e corrupta de nossa história recente, graças ao gigantesco aparelhamento que o PT produziu no estado.
Trocando em miúdos, os últimos dezesseis anos foram isso. Mas não é justo com as biografias dos dois presidentes traçar um perfil político-administrativo em poucas linhas e pretender dele um relato fiel de suas gestões. No entanto, não pense você, caro leitor, que não existia um projeto de poder envolvido nas duas gestões. Tanto o PT de Lula, quanto o PSDB de Fernando Henrique, pretendiam instalar-se confortavelmente no Palácio do Planalto e lá ficar por, pelo menos, três décadas. E podemos dizer que lograram exito nos primeiros vinte anos, afinal, a sucessão presidencial está polarizada entre ambos e o próximo presidente será um filhote ou de Lula, ou de FHC.
É terrível para o Brasil essa construção eleitoral tão minimizada. No próximo dia 31, não vamos às urnas para reeleger FHC ou Lula. O próximo presidente da República será José Serra ou Dilma Rousseff e é sobre eles que desejamos falar, é deles que queremos respostas, são suas propostas que queremos conhecer e será por um deles que a maioria irá optar. É demasiado cruel com a sociedade estagnar o debate entre aqueles que já passaram e aos quais a História se encarregará dos legados. Já chega de fazer “política de retrovisor”. Pra frente é que se anda e é em Serra e Dilma que devemos estar focados.