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FRONTEIRAS DA ALMA

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Quando os pampas do Sul descansam à sombra das montanhas

O tradicionalismo marca a cultura do Rio Grande do Sul e a de Minas Gerais. Além do tempo e espaço, uma corrente de elos ancestrais liga os dois Estados, os dois povos, tão múltiplos e tão unos no desejo sonhado de cantar e de se orgulhar da terra amada. Cada um com seu jeito, seu sotaque, suas crenças e seus valores, umbral das pequenas histórias que não se perdem mais. Assim, irmanados por essa ligação intangível e imprecisa, a Academia Mineira de Letras recebeu a visita do acadêmico Moacyr Scliar, para um bate-papo bem informal com estudantes e pensadores mineiros, dentro do seu projeto Bate-papo com o autor.

Dominados por uma atmosfera de boa prosa e causos em uma cozinha perdida no interior mineiro, ou em uma roda de chimarrão nos pampas do Sul, o público foi bebendo as histórias, as origens, as verdades inventadas e vividas pelos personagens sclirianos, aqueles que alçam vôo na imaginação dos homens e ganham o mundo inteiro, o coração dos povos.

De origem judaica, de família vinda do norte europeu, Moacyr Scliar se lembrou de seu pai, da chegada dele ao Brasil depois de meses de fome no mar. O incentivo materno para a leitura, para a literatura, a cumplicidade calada da esposa, o orgulho ingênuo dos filhos… assim, como quem lê a mais surpreendente história, viajamos nas palavras de Scliar, como quem navega longe, longe, bem depois do arco-íris.

Das passagens bíblicas, as maiores curiosidades; do duelo autoral com o equivocado escritor canadense, os bastidores; do fazer solitário, as incertezas, as anti-formulas que sempre resultam em grandes histórias, em grandes obras. Todos atentos ao que o mestre falasse. Ali, tão perto, tão despojado e tão verdadeiro. Escrever é assim, é colher frases no vento, história na hora do dia, poesia em demasia…

Por mais de uma honra assim ficamos. Algumas perguntas e esclarecedoras respostas, a viagem já ia longe quando o tempo se esgotava. Era chegada a hora dos autógrafos e do carinho ofertado ao grande escritor. Deu um orgulho danado ao ver a longa fila, um a um com o seu livro na mão, cada um com seu jeito mineiro de ser naquela noite brasileira. Foi uma consagração.

Hoje, Scliar nos manda um artigo para a revista da Academia falando dessa ligação silenciosa do Rio Grande do Sul com Minas Gerais, de Porto Alegre com Belo Horizonte. Eu, que vivo dela há algum tempo, fui pontiando uma coisa aqui, outra ali, tentando tecer o fio dessa rende que me prende e  me envolve nas coisas que não podemos compreender, mas, para nossa felicidade maior, viver, como se fosse uma rica história de sonhos e imaginação.

Somos tão iguais em nossas diferenças, que até sinto o gosto do café mineiro no quente chimarrão gaúcho que passa de mão em mão quando falamos dos maiores sonhos, nossas ocultas inconfidências…

 

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