Livro chega às prateleiras das livrarias na primeira semana de agosto
Por Pinheiro Júnior
“Braço de rio, pedaço de mar” é o terceiro livro de poesia que Petrônio Souza Gonçalves lança para felicidade geral da nação, sempre fiel ao difícil afazer poético, a um só tempo popular e de sutil profundidade. Se o anterior – “Um facho de sol como cachecol” – maravilhou público e crítica, esse novo livro inscreve definitivamente o mineiro no trancado cenário literário nacional. Não bastassem elogios de Verissimo, Zuenir Ventura e Fernando Morais movendo-o aos picos dos maiores poetas de sua geração, Petrônio atualmente viaja o Brasil com um sarau de música e poesia com ninguém menos que o guitarrista Toninho Horta. O sarau de Petrônio e Toninho já passou por 23 cidades brasileiras e três capitais.
Escrito no correr dos últimos dois anos, ”Braço de rio, pedaço de mar” traz 234 poemas voltados à temática do tempo e das buscas e frustrações humanas. Como escreveu no prefácio do livro, o sempiterno Aldir Blanc, “os trilhos que levam ao Poeta Petrônio estão nas palmas das mãos dos seres humanos que sofrem”.
Além do prefácio assinado por Aldir, o livro traz ainda um depoimento de Ferreira Gullar, que dizia não gostar de fazer apresentação ou depoimentos para escritores e poetas. Falecido em 2016, Ferreira foi amigo de Petrônio, que sempre o visitava em seu apartamento no Rio. O depoimento de Gullar talvez tenha sido, mais que uma exceção, um dos últimos textos do maranhense e que ainda estava inédito. Outros que falaram bem de Petrônio foram Sebastião Nery, Aristóteles Drummond e José Hamilton Ribeiro, além de Toninho Horta, Paulo Betti, Tostão cronista post-futeboler e o imortal machadiano Geraldo Carneiro, que orelhou o livro de um lado; de outro lado a orelha é de Carlos Buzelim, do jornal Hoje em Dia, de Minas. Escreveu ele: – “Escritor que surge e surpreende a literatura pátria. Conjuga as palavras harmoniosamente, semelhantes às partituras musicais de plenitude melódica, rítmica e apreciável lirismo. Textos de delicadas insinuações refletem bom gosto poético, decorrendo delicadeza e esmero vernacular em que propostas subjetivas falam ao coração. Retratam a vida, seus personagens, mediante incrível poder de síntese”. Na mesma orelha, Jane Godoy do Correio Braziliense disse: – “Em suas 238 páginas de pura poesia, o autor conseguiu dar a ela, a poesia, uma imagem de pureza, ligeireza, leveza e beleza, que – vale confessar -, jamais vi. A cada página, uma surpresa, tal a sua originalidade e forma de fazer poesia, como a da página 114 em que se lê: “Aprendi a ser como o ipê: Quando escureço. Despido entristecido padeço; Ai é que floresço.” Até que chegamos à última página com: “Para arrumar a casa/ É preciso afastar os móveis”. O óbvio mais poético de que se tem notícia”. Luiz Gonzaga Lopes, do Caderno de Sábado do Correio do Povo de Porto Alegre, diz também: – “Petrônio Gonçalves é o mensageiro do tempo, o eu lírico que rompe dimensões físicas e espirituais para versar e versificar coisas do dia a dia, da história, um cara capaz de nominar “a faca da chama da vela/ que corta a escuridão do dia”. Alguém no mundo que se inspira em Drummond, Aleijadinho e Pessoa (este último um não mineiro), poetas e artista, mineradores da beleza, da estética, do estar no mundo, nesta vida para mais de métrica que temos para escrever. “Os meus ombros não suportam o mundo”, diz o início de um poema dos muitos do livro “Um Facho de Sol Como Cachecol” (Realejo Livros, 2015, 238p.), todos não nominados como o sol do poema do Nobel francês de Guadalupe em 1960, Saint-John Perse: “Não se nomeia o sol, mas entre nós está seu poderio”. Porém, seus ombros e seus versos dão sentido a este pequeno mas vasto mundo, do íntimo, fugaz e cruel como o tempo que aqui habitamos. Linhas que se opõem a qualquer espaço em branco, pois têm muito a dizer. A rua dele é só pensamento, tem Quintana que é daqui, tem Van Gogh que é Dalí, tem Minas e Monet, tem passado e cada trecho é para nós um presente: “O tempo fez comigo acordo nenhum” ou “O tempo é mesmo um Deus cruel”. A estrada que ele trilha tem o amor que é como uma casinha pequenina e, para o poeta Petrônio, pedra polida: “Para arrumar a casa/ É preciso afastar os móveis.” Voa só o seu pensamento e flana em bando a alma. Letras que limpam e curam nossas feridas. Poesia primazia para leitores em órbita poética”.
O autor lembra que seu livro faz uma ode ao cão de rua, quando proclama ver nos vira-latas a metáfora da poesia. São dois poemas dedicados aos cães que vagam esquecidos pelas ruas do país.
Sobre o tempo, ele lembra ainda que: “A juventude não existe mais; Aquela./ Os sonhos não existem mais; Aqueles./ A namorada não existe mais; Aquela./ No entanto, Entre o riso e o pranto,/ A vida não parou no que passou,/ Não é o vento que pousou na janela,/ A tempestade que ficou aprisionada na sala de espera./ A vida não é um lugar;/ É onde você está./ E segue sempre,/ Invariavelmente,/ Na busca da eterna primavera.”
O livro
Com capa de Paulo Caruso, “Braço de rio” é, em seus 234 poemas sem título, o singular e original ato de fazer poesia só como Petrônio faz. Porque, segundo o próprio autor, o “título muitas vezes já é uma síntese do poema, quando na verdade a poesia, por si só, é essa síntese; então o livro traz a primeira frase em negrito, e a síntese, a alma do poema, distribuída em seus versos”.
Vale destacar a sacada do poeta no texto que dedicou ao grande herói nacional: “Tiradentes fez da forca/ O laço com a história./ O oito em infinito/ Da mais plena glória./ Nós enxergamos pouco,/ Somos desprovidos de primaveras./ Nem sabemos,/ – Como na cruz -/ Quando o fim se cala/ No quedar da cabeça tombada,/ Que é o aceno do tempo/ Para o que está no alto/ E acabou de nascer.” Outro texto de destaque é a comum impotência dos que fazem poesia ou escreve canções, onde se percebe claramente a influência de Carlos Drummond de Andrade: “Os meus ombros não suportam o mundo./ Estão envergados,/ Envergonhados,/ Pelo fardo pesado que não sou capaz de carregar./ Fiz da minha cruz/ A madeira/ Para a fogueira/ Na lareira em que queimei/ Todas as minhas frustrações./ Na chama em que ardia/ Os meus sonhos,/ Minha alma gania,/ Meu coração nem batia,/ Apenas repetia o badalar dos segundos/ Da reencarnação./ Agora,/ Sou apenas sombra;/ O que de mim restou./ O fantasma,/ A sobra,/ O vulgar ator.”
E para fechar, o poeta demonstra toda paciência quando está à procura da palavra poética certa: no último poema do livro, na verdade, um poemeto, sintético e preciso, escreve: “Não tenho pressa/ Tenho a chave”.
*Pinheiro Júnior é jornalista e escritor, residente no Rio de Janeiro