PF investiga envolvimento de administradores do consórcio que explora a concessão dos serviços de estacionamento rotativo pago em Vitória da Conquista, com sede no Rio de Janeiro, no maior esquema de corrupção eleitoral na cidade
Por Ana Paula Marques – Especial para o JS
No último dia 30 de agosto, a Polícia Federal deflagrou a Operação Condotiere, culminância de mais de um ano de investigações para desarticular uma suposta organização criminosa que teria utilizado a estrutura de órgãos públicos para fins eleitorais, usando cargos de confiança como moeda de troca, além de ter omitido receitas e apresentado recibos e notas fiscais fraudadas na prestação de contas à Justiça Eleitoral em 2016. Pelo menos duas empresas de fachada teriam sido utilizadas pelo suposto esquema criminoso para emissão de notas frias e dois dos investigados são empresários cariocas que já estariam sendo alvos de investigações da Operação Calicute, desdobramento da Operação Lava Jato. Entre as medidas cautelares que foram cumpridas pelos Agentes da Polícia Federal, o afastamento do parlamentar Rodrigo Oliveira da Silva Moreira (PP) da Câmara de Vereadores de Vitória da Conquista e do coordenador do Núcleo de Tecnologia da Informação, órgão da estrutura do Gabinete Civil da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, Antônio Lauro Gomes de Oliveira. Outros 21 mandados de medidas cautelares e 61 mandados de intimação foram cumpridos nas cidades de Salvador, Vitória da Conquista, Itabuna, Wenceslau Guimarães, Lauro de Freitas, Rio de Janeiro (RJ) e Cuiabá (MT).
Um dos alvos da Operação da Polícia Federal foi a concessionária dos serviços de estacionamento rotativo pago de Vitória da Conquista [Estacionamento Digital/Consórcio Rotativo Vitória da Conquista], que teriam entre seus controladores dois empresários cariocas que figuram entre os investigados pela Operação Calicute, desdobramento da 37ª fase da Operação Lava Jato.
Na entrevista coletiva na sede da Delegacia Regional de Vitória da Conquista, ainda no dia 30 de agosto, o Delegado Federal Rodrigo Souza Kolbe, que comandou a Operação, colocou sob suspeita o processo licitatório [Concorrência Pública 001/2014] realizado em 2014, na gestão do ex-prefeito Guilherme Menezes de Andrade (PT).
“Foi verificado que a Zona Azul teve uma participação extra, além da questão de permitir que funcionários fossem indicados por este grupo. A licitação da Zona Azul em si é posta em xeque na medida em que é comandada por dois investigados na Operação Calicute (Lava Jato), que se estabeleceram em Vitória da Conquista com o apoio dessa organização criminosa, em troca de valores”, afirmou o delegado Rodrigo Kolbe.
O policial Federal lembrou que os bens dos dois empresários teriam sido bloqueados por ordem da Justiça Eleitoral e que, por enquanto, “não existe uma ordem de suspensão da operação da Zona Azul, pois cabe à Prefeitura, após notificação das irregularidades, tomar esta decisão”.
Em 2017, a atual gestão municipal e o Consórcio assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que alterou oobjeto do contrato de concessão dos serviços públicos. Parquímetros instalados na gestão do ex-prefeito Guilherme Menezes de Andrade (PT) foram desativados com pouco mais de dois anos de funcionamento, mudando a forma de exploração do serviço, que passou a ser digital.
O Ministério Público afirmou estar acompanhando de perto desde quando a denúncia foi aportada. “Não tenho dúvidas de que estamos diante do maior esquema de corrupção eleitoral em Vitória da Conquista”, declarou o promotor de Justiça Beneval Santos Mutim, titular da 4ª Promotoria de Justiça da Comarca, que atua na área de tutela dos interesses difusos e coletivos (meio ambiente, consumidor, deficientes e idosos, fundações e habilitação e urbanismo), durante coletiva de imprensa no último dia 30 de agosto, na sede da Delegacia Regional da Polícia Federal em Vitória da Conquista.
Outro Lado
A Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista foi procurada pela reportagem do JS, por meio da Secretaria Municipal de Comunicação Social, mas até o fechamento desta edição não se posicionou a respeito das eventuais providências que serão adotadas em relação às suspeitas de possíveis irregularidades que teriam sido praticadas no processo licitatório da concessão dos serviços públicos de estacionamento pago na cidade.
O Governo Municipal também não se pronunciou sobre a medida cautelar de afastamento do coordenador do Núcleo de Tecnologia da Informação, órgão vinculado ao Gabinete Civil, Antônio Lauro Gomes de Oliveira.
Em nota, a empresa gestora da concessionária dos serviços públicos de estacionamento rotativo pago [Estacionamento Digital/Consórcio Rotativo Vitória da Conquista] sediada no Rio de Janeiro (RJ), declarou que “o relatório apresentado pelo delegado [Rodrigo Souza Kolbe] e que deu causa à Operação não descreve qualquer fraude no procedimento licitatório vencido”. A empresa ainda afirmou desconhecer o que seja uma “participação extra”, capaz de colocar em xeque o procedimento licitatório. “Todos os contratos do consórcio estão amparados em farta documentação legal. Não existe qualquer irregularidade envolvendo a empresa e seus sócios. Em verdade, o relatório apresentado está fundado em dados inverídicos, os quais serão apontados em requerimento que será levado à consideração da Justiça no momento oportuno”, concluiu.
A assessoria da gestão do ex-prefeito Guilherme Menezes de Andrade (PT) se posicionou alegando tratar-se de investigação de crimes eleitorais sem qualquer vinculação com a gestão anterior da Prefeitura de Vitória da Conquista. “Não se tem notícia de nenhum servidor ou gestor vinculado à Administração anterior que tenha sido sequer notificado sobre qualquer ato que seja objeto de investigação no inquérito questionado”, pontua a nota.
Saiba +
O nome da Operação da Polícia Federal, Condotiere, é uma alusão à obra de Nicolau Maquiavel – O Príncipe – que trata das teorias políticas mais elaboradas pelo pensamento humano, servindo de guia para como se chegar e manter-se no poder. Os “condotieri” (mercenários), citados na obra, eram contratados pelos governantes da época com o intuito de obter conquistas territoriais na Península Itálica do século XVI, utilizando-se de força ilegítima e sem qualquer ética política, sob o argumento de que “os fins justificam os meios”.