Essa ideia é muito comum a muita gente. Dizemos que o mundo é perfeito e que o ser humano com sua ação, com seus pecados, o estraga. Não há dúvidas que muitas coisas que fazemos não favorecem a harmonia da criação. Muitas ações do ser humano estragam a beleza da criação. Mas dizer que o mundo é perfeito e que é o ser humano que estraga tudo, também não é verdade. Dá para colocar nos ombros do ser humano a responsabilidade pelos males da criação?
Comecemos pensando na ideia bíblica do paraíso. Deus criou o paraíso, colocou Adão e Eva, e esses por causa da desobediência fizeram o mundo ser o que ele é. Tudo era harmonioso e perfeito antes, depois do pecado passou a ser diferente. O perfeito se torna imperfeito. Essa ideia está impregnada em muita gente. Sobremaneira nas pessoas religiosas que herdaram essa ideia, desde crianças, pela religião. Eu me lembro que quando criança questionava essa realidade e ficava descontente por Adão e Eva terem agido de tal maneira. Eles eram os responsáveis pelos males que hoje nós sofremos. Por causa do seu pecado, os passarinhos não pousavam em nossa mão. Por causa do seu pecado as cobras passaram a ser perigosas para todos nós. Essa era a compreensão. Veja que isso não é pouco significativo para a compreensão de toda a vida. Muitas pessoas carregaram por toda a sua vida essa ideia, sem mudar. Se adequaram as explicações que vieram a partir dela. E outros sentem necessidade de reeditar essa ideia. Precisam compreender diferente. Percebem que é difícil, hoje, sustentar que a ação de um casal tenha alterado toda dinâmica do mundo. Outra coisa também, porque isso teria vindo a partir do castigo de Deus. Pela desobediência, Deus castiga e aí entra o mal. Ou ainda, pela desobediência o próprio ser humano sofre as consequências de suas ações. Mas o fato é que pensar no castigo de Deus não é mais possível hoje, a partir de Jesus. E pensar que uma ação de pecado de um casal, o primeiro, tenha gerado consequências de mal para todo o sempre também é pouco sustentável. Se pensarmos a partir da filosofia perceberemos que nessa realidade há uma contradição inicial. O mundo que era perfeito torna-se imperfeito. Como isso foi possível? Não há e nunca houve possibilidade de o que é perfeito torna-se imperfeito. É o princípio de não contradição que sustenta essa ideia. O que é perfeito o é e pronto. Disso, como sustentar que o mundo era perfeito, paraíso, e depois se tornou imperfeito? Essa ideia não é sustentável e nem é verdadeira. Como sustentar diante disso a verdade do texto bíblico? Podemos dizer que o autor bíblico vendo e sentindo a presença do mal no mundo quer encontrar uma explicação. Ele não quer colocar em Deus a causa do mal. E nisso faz bem, porque Deus não é a causa. Por isso, coloca a causa na desobediência humana. Só que essa não é completa. É somente parte da causa do mal. Podíamos nos perguntar de onde vêm os vírus, as bactérias, os tsunamis, terremotos, e tantas outras possibilidades de mal no mundo? Se o ser humano agisse de forma perfeita, sem pecado, nem por isso os tsunamis ou os terremotos deixariam de existir. Eles não têm a causa no ser humano, mas na própria natureza. Ainda, embora o ser humano agisse perfeitamente isso não impediria completamente as doenças que matam a vida. Percebemos que fazendo um exercício de reflexão, colocar a origem da imperfeição em um pecado primeiro é complicado. Isso seria colocar a causa do mal no mundo nos ombros do ser humano. Isso pode ser até educativo, para que o ser humano perceba que suas ações têm consequências. Mas de forma alguma é totalmente verdadeiro. Nós podemos e devemos perceber que a desobediência a Deus não traz nenhuma vantagem para nós, mas nem por isso precisamos assumir toda a responsabilidade pelo mal no mundo.