Por: Joana D’arck Cunha Santos
Aprovada nesta última terça-feira (25) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a reforma administrativa proposta pelo Governo Bolsonaro será analisada por uma comissão especial, mas encontra forte crítica e resistência na sociedade e no Congresso Nacional, por ser considerada um golpe contra a Constituição cidadã para transformá-la em uma constituição comercial que vende produtos e serviços. Foi o que afirmaram os participantes da Audiência Pública sobre a reforma, realizada no mesmo dia 25, na Comissão de Legislação Participativa (CLP), por iniciativa do seu presidente, deputado Waldenor Pereira (PT-BA)
Participaram da audiência pública os dirigentes de entidades como o Departamento Intersindical, de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), associações, sindicatos e federações de trabalhadores e funcionários públicos, como CNTE e Sindifisco, entre outros.
Waldenor Pereira, autor do requerimento para realização do debate na CLP foi o primeiro a disparar contra a proposta: “Apresentada como uma modernização para a contratação do setor público, esta reforma administrativa traz uma agenda de precarização na administração e dos serviços públicos, transformando a atual Constituição Cidadã em uma constituição liberal, privatizante, voltada para o mercado e servindo ao receituário ultraliberal do governo Bolsonaro”, iniciou.
Os participantes também foram taxativos na afirmação de que a reforma administrativa, como está proposta na PEC- Proposta de Emenda Constitucional, transforma a Constituição cidadã em uma constituição comercial que vende produtos e serviços. A PEC foi enviada pelo governo ao Congresso em setembro do ano passado e altera as regras para os futuros servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, estados e municípios.
Waldenor Pereira alerta que esta PEC preserva privilégios de legislativo, judiciário e militares, em detrimento dos trabalhadores. Extingue, através de decreto, órgãos, cargos e carreiras e admite a realização de serviços públicos por entidades privadas. “Ela dá curso à operação de desmonte do Estado, promovida pelo governo federal, um ataque aos serviços públicos. Propõe, para além da modificação da estrutura do serviço público nas três esferas, uma profunda alteração na estrutura e no papel do Estado brasileiro”, avalia.
O diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Júnior, se diz assustado com a ideia de uma reforma que pretende mudar radicalmente o Estado, isto em plena pandemia. “Uma reforma que coloca o Estado à serviço da iniciativa privada e corta os braços dos direitos sociais quando, por exemplo, atinge a estabilidade do servidor público. Isso não é privilégio, é uma garantia que ele é impessoal”. Segundo ele, o projeto claro de privatização do Estado, transfere o fundo público gerado pelos impostos pagos pelos brasileiros para a iniciativa privada. “Fica até proibida a negociação trabalhista, coisa que nem a reforma trabalhista fez”.
Para Rita Josina, diretora-presidente da Associação dos Funcionários do Banco do Nordeste, “é uma reforma muito injusta porque acontece num momento em que devíamos agir em defesa da vida, com vacina e imunização para todos. Enquanto Marcos Assunção, do Sindifisco Nacional, diz que a PEC fere de morte o Estado brasileiro construído a partir da Constituição de 88.
“É uma tentativa absurda de desvincular o serviço público do servidor público, sempre com o argumento de que os gastos são altos com o pagamento dos salários. É uma narrativa para desqualificar o servidor, mas quem está fazendo frente à pandemia são os servidores. A iniciativa privada não vai para o meio da Amazônia cuidar dos indígenas, não vai levar saneamento básico. Quem faz isso é o servidor público”, protestou Assunção.
Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), alerta para a tentativa de se transformar a Constituição cidadã em uma constituição comercial de venda de produtos e serviços. Enquanto José Moreira Castro, coordenador-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores das Universidades Brasileiras, denincia: “Imaginem uma pandemia sem o serviço público, já estaríamos com um milhão de mortos, imaginem se não existisse o SUS. Esse governo não tem a pretensão de manter os serviços públicos através de concurso público e sim manter os apadrinhados de deputados, senadores, como era anos atrás”.
A deputada Luiz Erundina (PSOL/SP), vice-presidente da CLP, observou que a cada mudança de governo os desmontes vão aumentando, sobretudo nos últimos anos. “É inaceitável esse destroço que estão fazendo com o nosso Estado. Um país que já foi a sexta economia do mundo e um dos maiores produtores de alimentos, hoje tem 14 milhões de desempregados e quase cem milhões em situação de insegurança alimentar. Quem leva os direitos sociais aos quilombolas, indígenas e outros povos tradicionais é o serviço público”.