Ainda fosse vivo e tivesse como novo objeto de estudos o Brasil, ou mais especificamente a nossa querida Bahia, o egípcio naturalizado inglês Eric Hobsbawm (1917 / 2012), autor de obras clássicas como a Era das Revoluções, do Capital, dos Impérios e dos Extremos, possivelmente completaria sua coleção com um último volume em sua série, e o título bem poderia ser o que dá nome a este artigo.
90 bancos atacados a base de dinamites e / ou fuzis de uso militar, desde janeiro ao fim de maio deste ano; uma rebelião no presídio de Feira de Santana com 06 degolados no último fim de semana; um crescente número de assaltos, seqüestros e demais horrores cotidianos por todo o estado, e o Secretário de Segurança, o Sr. Mauricio Barbosa, titular da cadeira desde o governo anterior… simplesmente NÃO se pronuncia a respeito.
Hospitais públicos em franca decadência por todo o estado, onde em todos tudo falta, de gaze a esparadrapo, de vacinas e anestesias a leitos; hospitais que só tem os corredores milagrosamente desocupados, quando em dia de visita do Secretário da Saúde, o Sr Jorge Sola, que também… NÂO se pronuncia a respeito.
2012 – a Bahia viu a maior greve dos professores estaduais de sua história, a marcar 100 dias. Salários cortados, risco de se anular o ano letivo, irredutibilidade do governo nas negociações (e um sindicato a trair a categoria, mas isso é uma outra história…).
2015: Universidades estaduais em greve desde o dia 13 de maio. Milhares de alunos sem aula, centenas de professores bradando contra o sucateamento das instituições superiores de ensino, funcionários terceirizados sem receber os salários de maneira correta, digna, um iminente colapso do sistema, e o Secretário de Educação, empossado no Governo Jaques Wagner, mantido no atual governo de Rui Costa, o Senhor Oswaldo Barreto… NÃO se pronuncia a respeito.
Estranhamente, o silêncio parece ser arma mais usada contra nós nesta nossa guerra suja de cada dia. E o silêncio, inexplicável, que corta o ar como uma espada samurai, ou que a tudo cobre, como uma névoa densa e fria, vem de todas as direções. De todas as direções, mesmo.
Vem, por exemplo, do governador que nunca aparece e que só responde através de notas, bem ao contrário da época de campanha, onde sempre se nos mostrava sorridente, bonachão e bem falante; vem também dos nossos eleitos vereadores, deputados e demais acoplados ao governo, qualquer que seja o cargo ou o partido escolhido. Vem o silêncio, sendo mais pontual, de personas como o hoje Dep. Federal Sr. Waldenor Pereira Filho (PT), ex-professor e ex-Reitor (!) da UESB; vem do Dep. Estadual Sr. Raimundo Fontes, ex-professor da mesma instituição; vem também do também Dep. Estadual Sr. Jean Fabrício Falcão (PCdoB), pela mesma diplomado em Geografia, e vem, por último, (mas não por isso menos importante) do também Dep. Estadual e jornalista, Sr. Herzem Gusmão (PSDB). Suplente, mas deputado.
Desnecessário aqui relembrar a época das campanhas eleitorais. Mas ainda assim relembremos: Os caminhos empesteados de cartazes, panfletos, santinhos; as ruas congestionadas de carros, motos, bicicletas de som; os muros pichados, os outdoors sem fim, a internet invadida, as rádios e tvs tomadas pela propaganda eleitoral, blá blá blá… Não importa o partido, o cargo, o candidato, o discurso seguia a exata mesma seqüência lógica de promessas pré montadas, num manual já largamente conhecido: “A defesa incondicional da saúde, da segurança pública, do bem estar social, da moralidade nos gastos públicos, da educação! Afinal (a cereja do bolo nos veio agora), o Brasil é a Pátria Educadora! Ah? Os professores em greve espancados em Curitiba? Isso é um mero detalhe e não foi aqui…”. Voltemos à nossa Bahia.
O silêncio parece ser uma névoa sem fim. Caminhando para uma longa greve (ou não…), na UESB não se fala, simplesmente não se toca nos nomes dos Srs. acima citados, da mesma maneira que não se toca no inexplicável silêncio por eles proferido, com o perdão da metáfora, a respeito dos motivos que deflagram a greve. Também não falam sobre seu silencio. Há algo desconfortante no ar, e não é somente essa diária brusca mudança de temperatura, típica do outono, já quase inverno conquistense. O silêncio, frio, que nos toca, vem de todos os lados. Dos partidos, das rádios, dos jornais, das TVs, dos CA’s, do DCE, dos corredores cheios ou vazios… Afinal, onde estão todos? Afinal, onde estamos todos NÓS ? Dá-se a impressão de estarmos dentro de uma peça shakespeareana, Hamlet, para ser mais exato. Todos sabem de tudo, ninguém diz coisa alguma sobre nada. Mas o fantasma (a verdade…) está lá. Basta ver ou… ouvir.
Muito nos ensinam certos adágios populares, todos tendo como mote o ruidoso falar dos homens: “os que mais gritam, são os que menos tem a dizer”; “carroça vazia é que a mais faz barulho”, etc, etc, etc. Freud (1856 / 1939), criador da Psicanálise, também muito ensinou sobre o dito e sobre o não dito, na observação do sujeito. Com ele aprendemos que muitas vezes o que é dito pelo ser, esconde ou tenta esconder o que de fato este individuo quer realmente nos “falar”. E por isso, ora ou outra, o sujeito se trai. Mais ainda, aprende-se na teoria freudiana que o silêncio do sujeito nos diz muito sobre ele, até mais que seu próprio tagarelar. Na verdade, o silêncio diz muito. Ou tudo mesmo, de fato.
No fundo, aos poucos, lentamente, aprendemos que a compressão do mundo que nos cerca passa inexoravelmente pelo exercício de se aprender a ouvir, a auscultar, inclusive ou especialmente, o que diz o silêncio.