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A fidalga e o plebeu

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O caso que vou relatar, dizem, é verdadeiro. Ocorreu pelas bandas do sudoeste baiano.  Algumas interferências será feita para que o leitor tenha maior interesse em apreciar a história.

            Generosa era uma mulata balzaquiana de classe média alta, provinda de família de comerciantes abastados. Mulher de baixa altura, cabelos pretos bem cuidados e brilhantes, rosto redondo, olhos pretos amendoados, lábios grossos, gorda, de ancas avantajadas que chamavam a atenção de homens e mulheres pela sua aparência física. Seus dotes fisionômicos não preenchiam o figurino da beleza.

            Frequentava a sociedade, clubes, barzinhos e adorava baladas. Entretanto, Generosa não tinha sorte com os homens. Cupido não a favorecia. As colegas enturmavam-se, paqueravam, ficavam, porém ela sempre ficava na “geladeira”, não era cortejada. As amigas faziam a maior gozação com a desditada e, por conta disso, aborrecia-se, e arrumava encrencas com as colegas, mas logo fazia às pazes, entendiam-se.

            Certa feita, a família fez uma reforma na casa e contratou um pedreiro de prenome Clemente. Um sujeito cabo-verde, alto, forte, um morenaço, dono de um corpo musculoso de halterofilista e muito atencioso. Parlapatão, fazia elogios a Generosa com a intenção de conquistá-la, por interesse em sua riqueza ou enamorar-se dela.  Encarnava o tipo gostosão conquistador.  Andou tendo trelas com Generosa.

Clemente se entusiasmou, como diz o ditado popular: amor à primeira vista, que culminou no altar. Foi um casamento discreto.  Generosa sentia vergonha do nubente por ser de classe inferior à sua e semianalfabeto. Não quis festejar nem fazer comunicação oficial.  Participaram da cerimônia os familiares mais íntimos. Nenhuma amiga foi convidada, o matrimônio transcorreu noutra localidade, de onde os noivos partiram para a lua de mel. Acredita-se que o casamento, foi realizado para atender o desejo de Generosa ser mãe.  Ela estava à procura de um reprodutor e não de um esposo.

            Clemente continuou trabalhando na sua profissão, e a digníssima, no seu estabelecimento, uma loja de confecções e variedades femininas, artigos de luxo. Generosa, preconceituosa, envergonhava-se de se apresentar com o marido na sociedade social, onde também as amigas frequentavam.  Saía sempre sozinha.  Por sua decisão, o marido não a acompanhava. Alegava que não podia ser acompanhada de uma pessoa inculta, sem nenhum traquejo social como ele. Dizia que   seria ridicularizada e constrangida pelo julgamento das amigas e pela elite social que frequentava. Humilhava o esposo.

Esse comportamento, além da humilhação, provocava ciúmes e desconfiança em Clemente, que ficava indignado com o rebaixamento imposto pela mulher.

            As afrontas foram exacerbando-se, o que desgostou Clemente que, tinha paixão pela esposa. Tornou-se um homem infeliz. Começou a beber e a desentender-se com a mulher, que o rejeitava. Agressões mútuas e acusações indecorosas tornaram a vida deles insuportável. Generosa, Impôs o seu estilo de vida e sua visão.  A vaidade, o orgulho e a presunção impediram-nos de continuarem o relacionamento, por ser o marido uma pessoa de classe social inferior e de pouca instrução. O casamento foi um ato da conveniência de Generosa.  Apesar de tudo, ele a amava.

            Por fim, Clemente alegou que ela ficasse com o seu status social, com a sua nobreza e a soberbia de que tanto se orgulhava e o deixasse com a sua simplicidade de obreiro de poucas letras. Não estava disposto a submeter-se ao escárnio da fidalga que se envergonhava de um homem pobre, humilde e modesto, porém honesto e trabalhador. Separaram-se. Clemente constituiu outra família com pessoa da sua classe social e viveu feliz.

              Generosa ficou conhecida como “Generosa do pedreiro Clemente”, essa referência a contrariava, a aborrecia e provocava-lhe muito desgosto. Esse tratamento era-lhe maldosamente atribuído por suas “amigas”, que o faziam sarcasticamente. Insinuações que ela tinha conhecimento.

Dizem que os opostos se atraem, mas nesse caso não deu certo. As diferenças de classes do casal foi o motivo para o relacionamento não dar certo.

 “Se essas duas pessoas de classes sociais diferentes estão dispostas a perpetuar seus valores originais, relacionados à criação que receberam, dificilmente a relação sobreviverá […]” diz a socióloga Daniela Auad, professora da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora).

A dificuldade de se conviver em um mundo social diferente é   maior do que se imagina, porém em toda regra há exceção. “O amor e a razão são dois viajantes, que nunca vivem juntos na mesma hospedaria: quando um chega, parte o outro”. Walter Scott.

Foi assim que aconteceu.

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Jornal Digital Jornal Digital – Edição 745