Hoje em dia, as informações sobre os acontecimentos se espalham mundo afora num piscar de olhos. Seja bom ou ruim, o que se faz num país rapidamente é copiado em toda parte.
Há alguns anos, a Venezuela vem sofrendo uma mudança brusca no seu regime político. Hugo Chaves se elegeu em 1998 e, à semelhança do que fez Fernando Henrique Cardoso, alterou a Constituição para instituir a reeleição, com o agravante de ser por tempo indeterminado. Com isso, reelegeu-se por mais dois mandatos e não conseguiu sabe-se lá quantos, porque a morte não permitiu.
Apoiado pela grande massa e inebriado pelo poder, Hugo Chavez foi ampliando suas prerrogativas conforme achasse conveniente para impor, por meio da força, seu modelo autoritário de administração.
Com sustentação no carisma pessoal, as mudanças trouxeram inconformismo aos adversários, com manifestações e consequente instabilidade social ao país.
Apesar de ser favorável à possibilidade de reeleição por prazo indeterminado, reconheço ser uma tese bastante contestada no mundo inteiro.
Sustento que se um governo pode ser reeleito uma vez porque é bom, parece contraditório que não possa ser mantido outras vezes, se a cada mandato estiver melhor. Se a alternância é que é boa, que não seja permitida nenhuma reeleição. Falta lógica para se considerar positiva uma reeleição e ao mesmo tempo pensar que mais de uma reeleição seja um mal em si.
Prestem bem atenção que não há valoração se as medidas são boas ou não. Apenas se está apontando que as pessoas se organizaram contra, um direito inalienável dos insatisfeitos e do regime democrático. Daí veio a mão de ferro do Estado venezuelano e só neste ano de 2014 mais de 35 pessoas morreram pela repressão policial. Até aí tudo faz parte do jogo, com seus erros e acertos.
Um ponto fora da curva é a omissão dos governos mundo afora, em especial dos sul-americanos que, se não apoiam explicitamente as atrocidades cometidas contra os cidadãos venezuelanos, nada fazem de concreto para coibir.
Quem eventualmente tenha conhecimento aponte alguma ação do governo brasileiro a favor da população ou contra as violações dos direitos e garantias individuais durante todo o período chavista, incluindo o do seu sucessor.
Como, na sua esmagadora maioria, as vidas ceifadas são de estudantes, nem a União Nacional dos Estudantes – UNE fez algo concreto, assim como as organizações correlatas em outros países nunca fizeram nada. Nenhum texto repudiando, nenhuma nota, nenhum ato. Aliás, a UNE nem parece existir. Com os passar dos anos, perdeu sua identidade de instituição respeitada por todos e se descaracterizou como entidade de mobilização social e política, sendo lembrada apenas pela emissão de carteirinhas de estudante.
Todos os governos da América do Sul, a presidenta do Brasil, o Congresso Nacional, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, as organizações não governamentais e até a mídia precisam ter uma postura expressa e mais clara de repúdio às barbáries perpetradas pelo governo venezuelano, em especial um basta aos assassinatos, às prisões, à violência, às perseguições políticas contra opositores, pelo pecado único de não concordar com uma ideologia política ou ações de um governo. Esse “silêncio ensurdecedor”, se não mata, torna os surdos coniventes com tudo isso.