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Benvinda Novaes Jardim

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DONA NENZINHA *

*23/07/1920†28/06/2011

Escrevo este artigo/biografia em homenagem à minha mãe, Benvinda Novaes Jardim, a quem chamo de Dona Nenzinha, apelido de família. Nascida em 23 de julho de 1920, no distrito de João Amaro, município de Iaçu. Filha de Antonio Alves Ribeiro de Novaes (Major Novaes) natural de Jussiape, falecido em 1940 em Contendas do Sincorá e Otávia Rita de Souza Jardim falecida em 1943 também em Contendas. Avós paternos Joaquim Ribeiro de Novaes e Mariana Novaes; Avós maternos Luduvino dos Santos Jardim e Anna Rita de Souza Jardim.

IRMÃOS: Dejanira (Neném), Valdevino Ribeiro de Novaes (Divininho ou Pagão), Valdivina faleceu com dois anos de idade, João Ribeiro de Novaes (Santinho), Juvenal Ribeiro de Novaes (Gutinho), e Arlinda Novaes Jardim (Filinha) que faleceu com sete anos de idade, filhos de Otávia Rita de Souza. O major Novaes tinha outros filhos do casamento com a esposa conhecida por  Iaiá.

Benvinda moradora em Contendas do Sincorá, manteve um relacionamento com Oflávio da Silveira Torres, teve dois filhos Antonio e Radival Novais Torres e por desentendimento familiar separou-se. Separada teve mais dois filhos Sérgio e Edvaldo de outros relacionamentos.

 Dona Nenzinha, pessoa que amo incondicionalmente, no fundo do meu coração. A nossa relação, além de filial, é umbilical, por laços muito fortes que nos unem, numa convivência de amor recíproco. Mulher extraordinária, trabalhadeira, honesta, eficiente e competente. Sofreu as agruras que a vida lhe impôs, deu a volta por cima e venceu.

Sozinha. Criou os filhos, os educou e os encaminhou para o exercício da cidadania, com a determinação de mãe dedicada. Professora leiga, via a educação como forma de crescimento humano.

Aos netos (meus filhos) dedicou atenção, carinho e compreensão – gesto de afetividade de avó –, levava  alguns deles para morar com ela,  por certo tempo, ou para passear em sua residência em João Amaro/Iaçu, lugar onde morava, fazia   revezamento entre eles.  Íamos, sempre,  nos períodos de férias passar dias em sua residência.

Inicialmente, bem jovem, trabalhou como professora não titulada em Contendas do Sincorá, em regime de ensino particular. Esforçada e dedicada à causa do ensino, demonstrou competência a ponto de ser escolhida pelos pais de alunos como professora preferencial para seus filhos, em detrimento das formadas em magistério, fato que provocou ciúmes no meio. Certa professora formada, ao questionar uma aluna sobre o motivo do não comparecimento às suas aulas, ouviu desta que os pais optaram pela professora leiga, o que a fez proclamar o seguinte comentário, eivado de despeito e inveja: “Quanto menos somos, melhores passamos”.  

Alguns dos seus alunos hoje são médicos, engenheiros e outros profissionais das diversas áreas, reconhecem a competência, o amor e o carinho com que foram tratados e receberam as primeiras lições.

Mudou-se para Salvador, onde foi gerente de uma pensão familiar por algum tempo. Posteriormente, foi para a cidade de São Félix, onde se instalou com uma pensão própria. Enviava um positivo para a estação anterior a fazer sugestão aos passageiros a se hospedarem na pensão indicada e de preços módicos.

A cidade escolhida para a instalação da pensão, servia de transbordo para as pessoas que vinham do sertão, de trem, para compras em São Felix/Cachoeira, mercado abastecedor, e outros com destino à capital (Bahia).  Em Cachoeira, os que se destinavam à capital, utilizavam o vapor como meio de transporte.

  De São Felix, foi para a sua terra natal, João Amaro, distrito do município de Iaçu/BA, onde, por longos anos, exerceu atividades como professora leiga contratada pelo município e por particulares. A seu talante, deixou o ensino e adentrou no ramo comercial de confecções e afins. Fazia compras em Vitória da Conquista,  contava  para isso, com a ajuda de sua nora Rosa (minha esposa) na escolha dos produtos de maior aceitação na região, atividade que exerceu até se aposentar.         Depois de se aposentar, foi morar comigo em Vitória da Conquista onde eu residia e trabalhava. Algum tempo depois, acompanhando-me , veio para Brumado, onde fixei residência e abri comércio.  

Nos últimos tempos, pelo estado comum à velhice, apresentava quadro depressivo, perda de sono e desenvolveu medo de ficar sozinha, tal qual uma criança.  Usava sonífero para dormir,  e tomava  antidepressivo.

 Os detalhes provenientes dessa situação, às vezes, são hilários. Um dia, chamou-me ao seu quarto e confidenciou-me que tinha muito dinheiro em sua casa em João Amaro e que me daria. _ Segredo!…, e me alertou para não   contar para ninguém.  Certamente o fez em agradecimento aos cuidados que lhe dispensava, e para tanto, contava com a ajuda da família.   Outra feita, perguntou-me se eu era casado e se tinha filhos. Respondi que a minha mulher era sua nora e os meus filhos, seus netos. _Não sabia!…,  respondeu. Eram sinais da senilidade.

Dependente, apegou-se a mim de tal maneira que passou a acompanhar-me onde eu fosse, quer ao banheiro, quer a qualquer outro lugar da casa.  Traquinas, mexia e remexia os objetos, no afã de arrumar, pelo menos, parecia ser essa a intenção.  Teimosa e resistente, nunca fazia o que lhe era recomendado, sempre tinha uma resposta malcriada e jamais assumia os erros que praticava. Em função disso, nos preocupava por esse procedimento rebelde, pela não  compreensão dessa situação.

Um dia levou uma queda, causando-lhe ferimentos que precisaram de sutura. Levada ao hospital, manteve tamanha resistência para receber os procedimentos médicos, que precisou pessoas para segurá-la. Ela tinha pavor de hospital. Apesar da fragilidade e de pouco peso corporal, o médico que a atendeu disse: “Se eu chegar a essa idade com essa força, dou-me por satisfeito. Com tamanha disposição, viverá muito tempo”. Irrequieta e incomodada, arrancava os pontos cirúrgicos e os curativos.

 A faxineira que passava pano na casa, solicitou: “Velha arribe as pernas para eu fazer a limpeza”. Resposta: “Velha não senhora, me respeite, eu tenho nome”, repreendeu à servidora com veemência.

Em idade provecta e acometida dos problemas dessa fase da vida – a senilidade – necessitava de cuidados especiais para a sua segurança e higienização: banho e   troca de fraldas, remédios, alimentação nas horas certas e consultas médicas. Optamos por não a colocar  em casa especializada para abrigar idosos, preferimos zelar pessoalmente desses problemas com a ajuda de familiares que, solidários, nos deram o suporte necessário. Em razão desses fatos, fiquei tolhido de certas liberdades, precisava ficar mais tempo em casa para os cuidados necessários e, ao sair, sempre pedia a uma pessoa da família para cuidá-la.

Contava casos desconexos. Evocava pai, mãe e irmãos já falecidos, expressando o desejo de vê-los. Esquecia-se dos fatos recentes. Às vezes, não se lembrava de ter-se alimentado. Questionada sobre acontecimentos do dia a dia, não se lembrava de nada ou não queria se manifestar. Havia, entretanto, surtos de lucidez em determinadas ocasiões, contando histórias, inclusive dos tempos de criança.

Em nenhum momento, imaginei que o quadro chegasse a esse ponto. Não contava com toda essa labuta, embora não fosse surpresa. Tinha outra percepção dessa situação, pois ela, não tinha fatores agravantes  de risco,  como diabetes e pressão alta. Os exames laboratoriais  apresentavam resultados sem qualquer  alteração.  O único problema de saúde era um quadro de bronquectasia, doença antiga. Para essa questão estava convenientemente medicada.

Com relação ao comportamento, houve alteração motivada pela idade.   Porém, tínhamos  a noção de que o idoso necessita de tolerância, paciência, carinho e, acima de tudo, amor, além de compreendermos que a proteção faz parte de um dever de reciprocidade da vida: os pais cuidam dos filhos, e estes, mais adiante, cuidam dos pais. É o ciclo da vida – a inversão dos fatos.

Fátima Teixeira, mestre em Assistência Social pela USP1, ressalta: […] “Nessa fase da vida o que o idoso necessita é sentir-se valorizado, viver com dignidade, tranquilidade e receber atenção e o carinho da família”.

Destaque-se que Benvinda era católica devota de São Judas Tadeu e em 16 de novembro de 1963, em João Amaro/Iaçu, converteu-se para Igreja Adventista do Sétimo Dia, por batismo. Deixou de frequentar a sua congregação religiosa    por motivos de saúde, por  recomendação médica,  para evitar aglomeração.

Foi fiel até a morte à sua fé e aos preceitos da sua religião. “Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida” (Ap. 2:10)

Concluo essa homenagem com a seguinte prece:

ORAÇÃO DO IDOSO *

                                                                                       (Padre Eduardo Dougherty)

Bem-aventurados aqueles que compreendem meus passos vacilantes e minhas mãos trêmulas.

Bem-aventurados os que levam em conta que meus ouvidos captam as palavras com dificuldade e por isso, procuram falar mais alto e pausadamente.

Bem-aventurados os que percebem que meus olhos já estão nublados e minhas reações são lentas.

Bem-aventurados os que nunca me dizem: Você já me contou isso inúmeras vezes!

Bem-aventurados os que desviam o olhar, simulando não ter visto o café que por vezes derramo.

Bem-aventurados os que sabem dirigir a conversa e as recordações para as coisas dos tempos passados.

Bem-aventurados todos aqueles que me dedicam afeto e carinho, fazendo-me assim pensar em Deus. Quando entrar na eternidade, lembrar-me-ei deles, junto ao Senhor.

Bem-aventurados os que me ajudam a atravessar a rua e não lamentam o tempo perdido que me dedicam.

Bem-aventurados os que me fazem sentir que sou amado e não estou abandonado, tratando-me com respeito.

Bem-aventurados os que compreendem quanto me custa encontrar forças para carregar a minha cruz.

Bem-aventurados os que amenizam os meus últimos anos sobre a terra.

 Amém!

Que as graças de Deus estejam eternamente contigo, Ó Mãe Querida. Tenho a certeza de nos encontrarmos na ressurreição dos mortos conforme determinado na Bíblia. Eis a minha crença: “Os que fizerem o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizerem o mal, para a ressurreição da condenação”. (João, 5.29).

ADENDO:  Benvinda Novaes Jardim, Nenzinha, faleceu em 28 de junho de 2011. O óbito foi atestado pelo médico Dr. Jorge Luiz Vaz Almeida (seu aluno do curso primário em João Amaro) e o corpo está enterrado em Brumado no Cemitério Municipal Jardim Santa Inês.

Benvinda deixou os seguintes filhos: Antonio Novais Torres e Radial Novais Torres,  filhos de Oflávio da Silveira Torres, Sergio Geraldo Novaes Jardim, filho de Péricles Santana  e,  Edvaldo Bispo dos Santos Jardim, filho de Agenor Santos,  os quais se fizeram presentes ao velório realizado no salão da funerária  Pax,  com exceção de Radival, falecido em 05/08/2001  e enterrado em João Amaro, no cemitério Santo Antonio, popularmente,  conhecido como cemitério dos pobres.

 (*) Artigo publicado no Jornal do Sudoeste em abril/2011.

(*) Trecho do artigo O idoso e a família: os dois lados da mesma moeda, é autoria de Fátima Teixeira, publicado na Revista Partes).

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