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‘Brasileirinho’, o biscoito de arroz e feijão

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Produto desenvolvido na FEA é rico em fibras e pode ser consumido por pessoas com intolerância à lactose e ao glúten

Texto: Raquel do Carmo Santos Fotos: Anthoninho Perri Edição de Imagem: Luis Paulo da Silva

“Brasileirinho” é o nome do mais recente produto desenvolvido nos laboratórios da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp. Trata-se de um biscoito, do tipo snack, cuja inovação está em sua composição, na qual foram incluídos ingredientes de uma das combinações mais tradicionais da mesa do brasileiro: o arroz e o feijão. A mistura, já consagrada pela população, também deu certo em cinco formulações criadas por David Wesley da Silva, no Departamento de Pesquisas em Alimentos e Nutrição (Depan).

O biscoito é rico em fibras e tem alto valor proteico. As vantagens, no entanto, são ainda maiores. Silva elaborou as variações com o benefício de o biscoito ser consumido, sem receio, por pessoas com intolerância à lactose e ao glúten. “Há muita carência no mercado de biscoitos e salgadinhos que tenham qualidade nutricional e, ao mesmo tempo, possam ser consumidos por uma parcela da população que tem restrições alimentares”, defende David Silva.

O produto foi resultado da tese de doutorado “Biscoito de feijão e arroz: produto alimentício para os públicos celíaco e vegano com avaliação de aceitação sensorial, submetida a estímulos musicais”, orientada pela professora Helena Maria André Bolini. Durante o estudo, Silva levou em consideração o fato de o biscoito ser um alimento bastante consumido e aceito por sua versatilidade.

No formato biscoito, o alimento apresenta uma durabilidade bem maior, ultrapassando dois meses. “Isto quer dizer que o arroz e o feijão podem ser ‘carregados’ em uma bolsa ou mochila, e consumidos em qualquer outro dia, em muitas situações”, garante.  O “Brasileirinho” está em processo de patenteamento e aguardando interesse da indústria para transferência de tecnologia.

Uma breve pesquisa nas prateleiras dos supermercados trouxe a percepção de que há poucas opções para veganos, vegetarianos e pessoas com restrições na alimentação, pois geralmente biscoitos possuem alto teor de gorduras, muito sódio e um volume considerável de açúcar, além de serem pobres em fibras. Neste sentido, o estudo realizado na FEA atenderia, especialmente, a uma categoria de consumidor que está em franca expansão: a de consumidores de alimentos considerados saudáveis. Segundo David Silva, há um interesse crescente neste tipo de alimento, principalmente, pela associação da ingestão de gorduras e alimentos com baixo teor de fibras e outros elementos com a incidência de doenças crônicas atuais.

Análise sensorial

Quanto ao sabor, as cinco formulações do “Brasileirinho” foram bem aceitas pela maioria dos 120 provadores durante a análise sensorial. Os testes foram realizados no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), no município paulista de Hortolândia, e teve um diferencial: os voluntários foram submetidos a variados estímulos musicais ao provarem o biscoito. O grupo era composto de universitários com idade entre 18 e 25 anos. Enquanto consumiam o “Brasileirinho”, ouviam música instrumental nos estilos blues, clássico, rock e samba. Houve também uma amostragem em que não se colocou o som, para efeito de comparação.

Na análise sensorial, a variação da aceitação foi significativa para todos os estilos, dependendo do atributo estudado (aroma, sabor, textura, etc.). As notas foram geralmente mais altas quando o “Brasileirinho” foi consumido ouvindo-se os estilos mais populares, rock e samba. Com a música clássica houve alterações pontuais na percepção do sabor. Já com o blues, se observou uma pontual diminuição na aceitação das formulações mais básicas, com menos misturas de ingredientes.

Foto: Perri
O pesquisador David Wesley da Silva: “arroz e feijão na mochila”

O objetivo, ao submeter os provadores a estímulos musicais enquanto consomem o produto, era testar a hipótese de que a música pudesse interferir na percepção do consumidor de biscoitos. O autor do estudo explica que há vários mecanismos a serem estudados para se entender o que está composto nesse efeito que a música causa, seja por meio de impacto fisiológico, ou psicológico, seja o estado emocional, a familiaridade com o estilo ou memória musical, a preferência pessoal, ou mesmo a exposição musical involuntária. A hipótese já tinha sido testada em estudo prévio no seu mestrado, cujo conteúdo foi publicado pelo Jornal da Unicamp na matéria “Os Ritmos do Paladar”.

O Departamento de Psicologia da Universidade de Oxford, no Reino Unido, foi o pioneiro no estudo nesta área, ao buscar os efeitos de alturas das notas musicais, e mesmo os timbres de instrumentos musicais e o consumo de alimentos. Mas, diz o autor da pesquisa, a Unicamp foi pioneira quanto à associação entre estilos musicais e alimentos. Silva pretende aprofundar suas investigações em um pós-doutorado e, inclusive, tentar uma parceria com pesquisadores do Instituto de Artes (IA) da Unicamp.

Música e culinária

As análises e avaliações, fazendo uma ligação entre a música e culinária, têm sentido. O autor da tese é formado em Música, na modalidade Composição, pela Universidade de São Paulo (USP), e optou por mergulhar em áreas até então desconhecidas para conseguir produzir um alimento funcional. Para o músico, a culinária é “a rainha de todas as artes”, por isso, o sentido de migrar para uma área tão diferente daquela de sua formação inicial. Seu interesse na gastronomia começou quando mudou radicalmente a própria alimentação.

David Silva frequentou disciplinas na FEA como aluno especial até que resolveu desenvolver o mestrado, e, na sequência, o doutorado. Foi até para outras unidades da Unicamp, como a Biologia e a Medicina, cursar disciplinas para preencher lacunas em sua formação. “Fiz mais que o dobro de créditos necessários para entender o universo envolvido na criação de alimentos mais saudáveis”, destaca.

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