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Câmara realiza audiência pública em apoio à campanha nacional do Levante Feminista contra o feminicídio

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Ascom/CMVC

A campanha promovida pelo Levante Feminista contra o feminicídio com o tema “Nem Pense em me Matar”. Quem mata uma mulher mata a humanidade foi tema de uma audiência pública realizada pela Câmara de Vereadores de Vitória da Conquista, na noite dessa quinta-feira, 27, pelo Sistema de Deliberação Remota (SDR). A audiência foi proposta pela vereadora Viviane Sampaio (PT) e aprovada por toda a Casa.

Foto: Divulgação/CMVC

Viviane iniciou a audiência lembrando que essa é uma campanha nacional contra o feminicídio e que a lei que tipifica esse crime foi criada em 2015, mas os casos não param de crescer. Ela explicou que mulheres de todo o país se uniram contra o feminicídio após os altos registros no ano de 2020. “O Fórum Brasileiro de Mulheres registrou 20% no aumento de violência contra a mulher só no ano de 2020”, contou, lembrando que o objetivo do Levante Feminista é de construir uma ação conjunta para denunciar a omissão do Estado e proteger a mulher com medidas protetivas. Lembrou que em Vitória da Conquista, a campanha foi organizada pelo Fórum de Mulheres. “Desde março estamos trabalhando nesse lançamento e hoje marcamos o ato político de todas as atividades do levante feminista”.

Foto: Divulgação/CMVC

Representando a Defensoria Pública Estadual, Dra. Flávia Araújo ressaltou a importância das organizações e dos movimentos sociais e disse que mesmo tendo o aumento do feminicídio, principalmente entre abril e maio de 2020, é importante reconhecer o quanto já se conquistou e já se caminhou: “A existência desse espaço na Defensoria Pública é graças à luta das mulheres”, afirmou. Ela falou da necessidade de se criar políticas públicas efetivas, principalmente para mulheres negras. “73% das mulheres vítimas de feminicídio são negras, por isso temos que adequar nossa luta pelo fim da desigualdade de gênero”, completou. A defensora apresentou, ainda, dados da Defensoria do Rio de Janeiro, os quais apontam que a maioria dos feminicídios ocorre sempre na casa da vítima e no horário de descanso. “A gente já caminhou muito, basta olhar para trás, para a luta das mulheres que nos antecederam e que agora está em nossas mãos. Temos que continuar lutando pela criação de políticas para proteger as mulheres”, disse.

Foto: Divulgação/CMVC

Vanja Andrea Santos, representando a União Brasileira de Mulheres, lembrou que o Brasil todo tem se unido contra o feminicídio, presente em todos os estados, buscando se articular com comandos regionais e envolver cada vez mais mulheres. Falou sobre o corpo e a vida de mulher que sempre pertenceu ao homem, “primeiro ao pai, depois ao esposo, isso tem que acabar”, clamou. Lembrou que a casa não tem sido um lugar seguro, principalmente nesse momento de pandemia, e cobrou a implementação de políticas públicas de proteção às mulheres e que àquelas que já existem possam funcionar de forma efetiva. Citou a Lei Maria da Penha e afirmou que “não adianta termos as melhores leis se não colocar pra funcionar”. Vanja contou que mulheres violentadas buscam o serviço de saúde para se protegerem e não conseguem porque o serviço está sucateado”. E finalizou lembrando que “esse não é um problema só das mulheres e sim da sociedade como um todo. Juntas somos mais fortes”.

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Secretária Estadual de Políticas Públicas para Mulheres, Julieta Palmeira se colocou à disposição para ajudar na campanha e afirmou que falta proteção efetiva para as mulheres, bem como a aplicação da legislação a contento, o que deve ser revisto em cada município e em cada estado, lembrando sempre do fortalecimento da rede de acolhimento à mulher. “A Bahia tem fontes alarmantes e os dados são subnotificados, por isso é preciso ter fonte de vários registros e não só policial”. Ela disse que acredita muito na rede de fortalecimento e relatou alguns investimentos do governo para esse fortalecimento: “Serão 15 núcleos de atendimento às mulheres em cidades que não possuem Deam. Por outro lado, teremos a ampliação dos núcleos de Defensoria Pública, ampliação da Ronda Maria da Penha, tudo para prevenir”, concluiu.

Foto: Divulgação/CMVC

Lídia Ferreira Rodrigues, representando a União de Mulheres, destacou a importância do Levante Feminista afirmando que “estamos sempre correndo atrás, porque nunca se tem dinheiro para colocar as políticas públicas para funcionar, tudo o que temos ainda não é suficiente e não conseguimos evitar que essa violência acabe”. Para Lídia, uma mulher que vive uma relação violenta, se não tiver uma casa para morar, não tiver como sustentar a ela e aos filhos, vai ser difícil sair da relação. “Quem vive uma relação abusiva já está muito fragilizada para enfrentar tudo o que vem pela frente, pra isso precisamos de uma grande estrutura de apoio”, afirmou, lembrando que é uma situação complexa e que é preciso encontrar mecanismos para resolver. “Enquanto as mulheres não conseguirem  autonomia de mandar e decidir sua vida e o agressor continuar achando que não será punido, o trabalho será difícil, e o Levante existe para isso”, concluiu.

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A delegada Gabriela Diego Garrido, da Delegacia da Mulher de Vitória da Conquista,  iniciou falando sobre o trabalho da Deam e do empenho para atender as mulheres logo no primeiro contato, para que elas se sintam mais confortáveis. Disse que 95% das vítimas de feminicídio não tinham buscado a delegacia e que quando a mulher procura ajuda, na maioria das vezes é possível evitar o pior. Gabriela lembrou que é importante que a mulher denuncie, quem não quiser ir até a delegacia pode ligar para o Disque 100 e que outros canais de comunicação estão sendo abertos para atender essas mulheres.

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Juíza da Vara de Violência Contra a Mulher, Julianne Nogueira ressaltou a importância da discussão nesse momento: “Pessoas são mortas por seus companheiros, muitas vezes dentro de suas casas”. Ela convidou toda a sociedade a debater o porquê disso acontecer e lembrou que muito se fala do enfrentamento da violência contra a mulher, mas “vemos que a sociedade não trabalha essa temática. Não se trabalha na escola, em casa, pois ainda existe muito preconceito e é um problema cultural”. Para Julianne, muito se fala sobre violência, mas não fala sobre a mulher. “Temos grandes equipamentos em Conquista, como a DEAM, Ronda Maria da Penha, Defensoria Pública”, e ressaltou a importância das denúncias e da punição dos culpados. “A sociedade julga muito a mulher, por isso ainda existe muita revogação das medidas protetivas solicitadas por elas”. A juíza finalizou dizendo que “é preciso repensar o discurso de que as falhas são do sistema, o que existe muito mais é a necessidade da discussão e conscientização nas bases”.

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Representando o Conselho Municipal das Mulheres, Maria Otília Soares falou da importância do Levante Feminista, e lembrou que durante a pandemia o agressor passou a ficar mais tempo com a vítima, e isso tem ocasionado índices alarmantes de feminicídio. “A raiz machista foi acirrada com as forças conservadoras. A violência tem ocorrido dentro de casa, onde o agressor vê a vítima como uma presa, onde ele brinca e violenta ao mesmo tempo”, lamentou. Otília disse, ainda, que o tema do Levante é importante para mostrar que as mulheres estão na luta e que vão denunciar toda forma de violência a ela imposta, desde a violência psicológica até o feminicídio. Citou todos os serviços existentes na cidade que compõem o movimento feminista e que é preciso ampliar essa parceria entre os órgãos civis e governamentais nessa luta de proteção às mulheres. “Precisamos mudar nossa educação, precisamos de mais defensores públicos, mais varas de juizados, da Deam funcionando 24 horas e de projetos de educação adequados”, finalizou.

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Capitã Débora Costa, da Ronda Maria da Penha, relatou que realmente tem aumentado as queixas de violência contra as mulheres: “temos observado que acontece em todos os níveis da sociedade. As pessoas, todos os tipos de profissionais, sofrem com essa violência”. Lembrou que é importante colocar o assunto em pauta e afirmou que “é muito difícil para quem trabalha diretamente com essa mulher que já registrou ocorrência e que tem todos os instrumentos à sua disposição, e mesmo assim ela recusa apoio”. Contou que a ronda atua mais com mulheres com medidas protetivas e que existe um trabalho de interação com os órgãos, sem burocracia, “para que seja resolvido o quanto antes e que a mulher não saia com a sensação de falha ao buscar o serviço”. Explicou que mulheres com a proteção tem acesso direto com a ronda, via whatsapp, e que trabalham no processo de acolhimento e conscientização para que as mulheres não voltem atrás e dispensem os serviços de proteção.

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A advogada e professora Luciana Silva, representando a Clínica de Direitos Humanos da Uesb, lamentou os números alarmantes e afirmou que o problema é estrutural da sociedade. “Me questiono como essas mortes podem ser evitadas, mas é muito difícil”, falou, lembrando que o padrão machista e patriarcal existente é o principal fator para geração desses dados. “Ainda temos muito para andar. Existe essa cultura enraizada em nossa sociedade que sustenta tudo isso, por isso reafirmo que a educação é essencial”, falou, e cobrou que se fale mais de gênero dentro das escolas. “Precisamos identificar o que podemos melhorar no estado e nas instituições para que essas taxas possam diminuir e quem sabe não existir mais na nossa sociedade”, disse e questionou se as mulheres que não procuram os órgãos especializados não seria porque elas naturalizam a situação? Para ela, muitas não conseguem sequer se ver como vítima de violência: “Será que essas mulheres não são coagidas ou se são da Zona Rural e não conseguem se deslocar a uma delegacia ou será se elas têm acesso às delegacias digitais?”, disse. Ela explicou que muitas vezes a família julga a vítima como se ela fosse errada e ainda tem as mulheres que não confiam nos órgãos que devem protegê-las. “É preciso se questionar porque elas não procuraram a delegacia ou entidades responsáveis”, concluiu.

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A coordenadora de Políticas Públicas para Mulheres, Dayana Evelinne dos Santos Araújo, falou que a sociedade é tolerante e isso tem tirado muitas vidas. Afirmou que se a violência contra a mulher já era algo a ser resolvido de forma urgente, nessa pandemia se tornou ainda mais. Apresentou alguns dados de 2017 a 2020, contando que na Bahia ocorreram 364 feminicídios, “lembrando que muitos casos são subnotificados. Desses, 74,1% foram de companheiros ou ex-companheiros e 76% dos feminicídios ocorreram em casa”. Para ela, é preciso desconstruir o machismo enraizado na sociedade, mas não é tarefa fácil, “estamos dialogando com a Câmara, com o Conselho da Mulher, Deam, para dar uma resposta à sociedade”. Aproveitou para relatar investimentos do Governo Municipal: “Teremos a unidade de abrigamento e também vamos inaugurar o complexo de escuta protegida para essas mulheres”. Falou do atendimento do CRAV e disse que o governo ampliou o quadro de profissionais para atender essas mulheres: “Foram 925 acolhimentos do CRAV e mais de 8 mil atendimentos”, concluiu.

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Integrante do Fórum de Mulheres de Vitória da Conquista, a jornalista Luciana Oliveira falou da importância da comunicação no combate ao feminicídio, lembrando que esse é um desafio no campo da comunicação que faz uma leitura mais acessível para a população. “É preciso estabelecer um espaço de diálogo com a imprensa. A gente sabe que a cobertura de mídia sobre feminicídio é inapropriado e existem vários estudos que apontam erros graves nessas coberturas”. Lembrou que é necessário o aprimoramento e melhoramento dessa cobertura: “A cobertura se prende apenas ao assassinato em si da mulher, falta o histórico de vida e violência dessa mulher, se ela sofria outras violências, há quanto tempo, se ela procurou ajuda, isso dá uma compreensão melhor à sociedade”, disse e lembrou que o campo de comunicação tem uma função social e não só de noticiar. “Muitas vezes, nessas coberturas, existem uma busca para justificar o crime e não para defender a vítima”, lamentou, afirmando que “noticiar dessa forma é jogar a culpa na vítima”. Disse que é preciso cobrar uma cobertura completa e ética sobre o feminicídio. “Essa mídia que temos hoje é reflexo da sociedade que temos. Já é um avanço ouvir apresentadores de jornais falar de feminismo”. Luciana afirmou que é preciso construir espaços de diálogos com a mídia, ações de capacitação para melhorar esse campo. “Os profissionais, muitas vazes não tem conhecimento da legislação, não conhecem a rede de apoio, não sabem como funciona, por isso temos que cobrar mesmo dos espaços de governo essas ações”. Ela propôs aos órgãos e agentes públicos, que “possamos pensar ações de cobertura de mídia mais adequadas e que possamos criar um canal de diálogo com as mídias para que esses profissionais possam entender como funciona a rede de apoio”.

Foto: Divulgação/CMVC

Vítima de violência doméstica, Nayara Benício relatou que passou por todos os tipos de abuso, que começa de forma muito sútil e no decorrer do tempo foram acontecendo coisas absurdas. “Tive faca no pescoço, agressões verbais, estupro, e o principal de tudo era que sentia vergonha do que as pessoas iam falar”. Lembrou que muitas vezes foi contra outras pessoas, mas chegou uma hora em que o medo da morte falou mais alto. “Resolvi me separar e aí surgiu outras ameaças”. Nayara lembrou que a partir do momento que registrou queixa, foi muito bem acolhida pela DEAM, pela Ronda Maria da Penha e após a medida protetiva, o agressor parou de procurá-la. “Hoje vivo outro dilema porque sou perseguida nas redes sociais não só por ele, mas por mulheres que compactuam com as atitudes dele”. Nayara destacou o quão difícil é para as vítimas lidar com a situação, “não se cale, denuncie, seria muito mais dolorido se eu não tivesse buscado justiça, devastação é a palavra que defino a situação de mulheres que vivem isso”, concluiu.

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