Faleceu nesta manhã desta quarta-feira, sábado, 24.06.2020, a matriarca Rita Alves Ataíde, aos 97 anos de idade (1923- 2020), uma das últimas memórias vivas de Brumado, pessoa da minha estreita afeição, desde muito tempo, esposa, mãe e cidadã dadivosa, a quem tive a felicidade de ofertar-lhe um cordel, descrevendo toda a sua trajetória de vida, juntamente ao seu esposo Abias da Costa Ataíde, de quem fui colega de trabalho, na Magnesita S.A. por duas décadas e com quem aprendi a conhecer a empresa por todos os seus limites, pois ele conhecia detalhes dessa localização, além de muitos traços históricos, desde os primórdios das suas instalações industriais neste Município.
Juntos cuidaram de numerosa prole, lutando e vencendo todas as dificuldades familiares, mas sem jamais perderem a honradez e a dignidade de cidadãos brumadense, úteis e prestimosos em todos os seus momentos.
Os filhos foram criados sob o rito dessas tradições, razão pela qual todos se tornaram cidadãos e cidadãs de bem, em especial “as meninas e D.Rita”. como eram carinhosamente conhecidas pela população de Brumado. D. Rita era uma pessoa de boa prosa, agradável e convidativa, sempre que aparecida em sua residência para um café amigo, ainda com seu Abias, em vida, e a partir, daí, várias vezes, para, ao seu lado e de alguns filhos, netos, bisnetos, parentes e aderentes presentes, beber pouco da sua sabedoria, inclusive com uma fiel narrativa do medo que tinha do lobisomem, nas histórias contatadas pela avó ou bisavó, isso não importa.
Fiz com eles uma longa entrevista que mantenho no meu acervo histórico de Brumado, com dados reveladores de uma história que jamais foi escrita devidamente.
Vou sentir falta desses agradáveis momentos, mas sabendo que ela se foi sem sofrer o tormento dessa cruel pandemia, cujo sofrimento seria muito maior. Descanse em paz D.Rita.
Segue o cordel publicado e lançado em sua casa numa das mais felizes tardes da minha vida.
JOSÉ WALTER PIRES
Membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel
D. RITA ALVES ATAÍDE – DADIVOSA MULHER
.
Cordel biográfico
Brumado, abril/2018
Às musas inspiradoras
Peço luz e sapiência,Pra vencer o desafio,
Que do qual tenho ciência,
Ao cantar neste cordel
Novo exemplo de existência.
.
Tenho disso experiência
Com outros seres amados,
Nos solfejos dos meus versos,
Em cordéis estilizados,
De homenagem aos eleitos
Pelos méritos revelados.
.
Sendo, pois, biografados
Em genuína linguagem,
Que deixa o vate feliz,
Ao traduzir a mensagem,
Do verdadeiro heroísmo,
Que traz cada personagem.
,
Foram em uma viagem,
Palmilhada, vida à fora
Enfrentando circunstâncias
Presentes a toda hora,
Mas, à frente aos desatinos,
Resistentes, muito embora.
.
Dessa forma, cuido agora
De quem foi mulher guerreira,
Pela qual sou recebido,
De uma forma costumeira,
Ao chegar à sua casa
Muito alegre e hospitaleira
.
Digo, ao chegar à soleira:
— Ô de casa! E sem demora:
— Ô de fora! De paz entra,
Mas se não for, vá s’imbora!
Entrando, dela recebo
O abraço que revigora.
.
Vou falar dessa Senhora,
Por saber e convivência,
Que na constância revela
O retrato da prudência,
Pelos caminhos da vida
Desde a sua adolescência.
.
Essa nativa vivência
Foi marcada pela luta,
Comum à vida rurícola,
Sob o rigor da batuta
Dos ritos familiares
Ao definir a conduta.
.
“Quem conselhos não escuta.
Um dia ouvirá –coitado”!
Era a voz da genitora,
Ao repisar o ditado,
Para a numerosa prole
E por todos acatado.
Era o rito consumado
Dos tempos patriarcais,
Como sempre praticamos
Herdados dos nossos pais,
Porém, nos tempos modernos
Quase não são mais usuais.
.
Ritos tradicionais
Hoje estão em decadência,
Restando nessas famílias
Viverem com paciência,
Em plena modernidade,
Mas sem perder a decência.
Assim, Rita Alves Lima,
Nome trazido da pia,
Vivendo desde criança,
A tudo isso obedecia,
Mas sem deixar de lutar
Pelo sonho que nutria.
Ser professora, um dia!
Surgindo a oportunidade
Estudou em Caetité,
Mas a mãe, sem piedade,
Exigiu o seu retorno
Por dura formalidade.
Isso se deu, na verdade
Porque seria somente,
A única com privilégio,
Naquela prole existente,
De chegar à formatura
E das irmãs diferente.
Como sempre obediente,
A decisão foi cumprida,
Retornando a Curralinho
E dar seguimento à vida,
Depois do sonho podado,
Ali vivendo oprimida.
Mas prendada e decidida,
Aos vinte um anos de idade,
Haveria de encontrar
A sua felicidade,
Ao cumprir a “simpatia”,
No viço da mocidade.
Nas asas da ansiedade
E aos acenos que o amor faz,
Certo dia conheceu
O pretendido rapaz,
Que para tê-la ao seu lado
Mostrou-se logo capaz.
O capricho satisfaz
Os desejos do cupido
Em simples troca de olhares,
Entre ambos, correspondido,
Em plena cumplicidade
Por um instante curtido
Pouco mais tarde o pedido
Foi feito com emoção,
Aos genitores da moça
Pela concessão da mão,
Daquela mulher amada
Dona do seu coração.
Consumando essa união
Ocorreu o casamento
Dos noivos Abias e Rita
Na Igreja de Livramento
Ano de quarenta e três,
Por sagrado Mandamento.
A partir desse momento
Seguiram novos caminhos,
Enquanto crescia a prole
Entre flores e os espinhos,
Vencendo dificuldades
Em constantes torvelinhos.
Assim, foram aos pouquinhos
Pela trilha percorrida,
Ambos trabalhando juntos
No enfrentamento da lida,
Com a prolífera família
Contudo, bastante unida.
Coisas naturais à vida!
Abias, na Magnesita
Pelas trilhas do minério,
A prendada Dona Rita
Em muitas atividades
No labutar, otimista.
Com o seu senso altruísta:
Foi professora em Brumado,
Também bibliotecária,
No Sindicato fundado
O ensinado artesanato
Produziu bom resultado.
O seu lar foi bem cuidado,
Nas demandas rotineiras
De esposa e mãe dedicada
Às obrigações caseiras,
Com zelo e abnegação
Entre todas, as primeiras.
Com palavras verdadeiras
Toda a família educou,
Ao rigor da disciplina,
Que da sua mãe herdou
Porém, ponderada e justa,
Ao perdão não se negou.
Na política militou
Demonstrando seus valores,
Nas campanhas dos dois filhos
Eleitos vereadores,
Que exerceram seus mandatos
Respeitando os eleitores.
Mulher de muitos pendores,
Religiosa convicta,
Missionária da fé
Que no coração palpita,
Semeando amor e paz
Pela crença que suscita.
Dessa maneira descrita
Essa vida dadivosa
De uma cidadã aguerrida,
Cuja existência comprova
Ser digna e merecedora
Desta moção jubilosa.
O cordelista renova
Nestes versos, a afeição
Dedicada a dona Rita,
Externando a gratidão
Por ter sido a personagem
Que lhe deu inspiração.
Encerrando esta edição
Deste singelo cordel,
Esperamos ter cumprido,
Como um intérprete fiel,
As informações colhidas
Feitas pelo menestrel.
Não será outro o papel
De quem busca versejar
Na linguagem de cordel
Um motivo singular
Com métrica, rima e oração
Para poder agradar!
F I M