Por Paulo Henrique Gomes
Depois de muito impasse e duas versões da tabela, a lei que trata do tabelamento dos valores do frete para transporte de cargas foi sancionada, no início deste mês, pelo presidente Michel Temer. No entanto, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, marcou uma audiência pública sobre o tema para o dia 27 de agosto. Só depois disso, Fux tomará uma decisão sobre o assunto.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) encaminhou ao STF, no dia 9 de agosto, um pedido para que Fux declare inconstitucional a lei que estabeleceu o tabelamento dos preços do frete rodoviário. A nova petição é um aditamento à ADI 5964, apresentada em 14 de junho, na qual já se questionava a criação de uma política de preços mínimos para o transporte de cargas. A CNI reforçou o pedido ao STF pela suspensão cautelar dos efeitos da lei e de todas as portarias editadas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A CNI promoveu, em parceria com oito entidades dos setores industrial e do agronegócio, o seminário Frete sem Tabela, Brasil com futuro. O evento foi realizado nesta quarta-feira (22), em Brasília, e reuniu especialistas para debater o tabelamento dos valores dos fretes para os caminhoneiros, medida adotada como solução para encerrar a paralisação da classe, que ocorreu em maio. O assunto foi debatido sob os focos econômico, jurídico e político.
A diretora de Relações Institucionais da CNI, Mônica Messenberg, considera a medida equivocada, que irá gerar consequências negativas para os brasileiros. “Me parece que a solução dada foi equivocada. Ela é extremamente danosa e as consequências serão muito ruins. Então, na verdade, acho que o diagnóstico foi equivocado, o que se está tratando não está sendo tratada a causa do problema, não se está pensando na solução efetiva para a questão, e ao mesmo tempo está se dando uma solução equivocada e muito danosa”, defende.
A CNI defende que o tabelamento dos preços do frete rodoviário trará consequências danosas e permanentes para a economia brasileira, com impacto direto no bolso do brasileiro. A entidade estima que os fretes tiveram aumentos médios de 25% a 65% com o tabelamento. Em algumas situações, os custos de transporte subiram mais de 100%, de acordo com a entidade. Ainda segundo a CNI, com o tabelamento, o transporte de arroz pelas rodovias do país terá aumento de 35% a 50% no mercado interno e de 100% para exportações. Na indústria de aves e suínos, o impacto do tabelamento sobre o custo do transporte foi calculado em 63%. O frete de rações para alimentar os animais tende a aumentar 83%. No setor de papel e celulose, a alta do preço para transportar os produtos será de 30%. Em nota publicada no site oficial, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) alertou “que produtos como grãos chegariam a ter valores 152% mais caros”.
Desde o início, a criação de uma tabela que impõe valores fixos para o transporte de cargas nas rodovias do país foi algo de divergências. Para o presidente da Inter.B Consultoria, Cláudio Frischtak, a medida não é a solução para os problemas enfrentados pelos caminhoneiros. Segundo ele, a infraestrutura oferecida a eles não é suficiente. “A maior dificuldade que nós temos em nossa infraestrutura é o transporte. O problema dos caminhoneiros são as péssimas condições”, defendeu. Segundo dados da Inter.B Consultoria, em 2017, apenas 0,59% do Produto Interno Bruto (PIB) foi investido em infraestrutura. Frischtak defendeu também que é fundamental criar um ambiente de negócios com menor complexidade, menos judicializado e com maior segurança jurídica para os caminhoneiros. “O tabelamento leva à insegurança jurídica”, afirmou.
O sócio da GO associados, Pedro Scazufca, o tabelamento é uma medida ultrapassada, que gera consequências negativas para a população. Segundo ele, a fixação de valores já foi utilizada por outros setores, que acabaram condenados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). “O tabelamento gera efeitos para a sociedade de um cartel. Alguns segmentos praticaram o tabelamento e foram condenados pelo CADE”, disse.
A ministra Eliana Calmon, ex-corregedora do Conselho Nacional de Justiça, elogiou a postura de Fux, que se reuniu por duas vezes com representantes da indústria e dos caminhoneiros com a intenção de escutar as reivindicações de ambas as partes. “Ele é um juiz moderno. O Ministro Fux é muito aberto ao diálogo e ele está fazendo. Graças à Deus caiu para ele porque ele tem essa visão de mundo, que é uma visão bem mais moderna”, declarou.
Durante o evento foram analisadas as incompatibilidades da medida em relação à Constituição. Em 10 de agosto, com a sanção da lei do tabelamento, a CNI apresentou novos elementos ao STF e reforçou o pedido de suspensão cautelar da norma. Na opinião do ex-secretário nacional de Justiça, Beto Vasconcellos, o tabelamento do frete gera uma insegurança jurídica. “A lei que estabeleceu um preço mínimo e o tabelamento de frete gera uma insegurança jurídica. Em primeiro lugar, ela está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal, portanto você tem um questionamento da própria lei, se ela vai ou não vai continuar sendo uma lei. E isso gera uma insegurança em todo os setores afetados por ela”, defende. O ex-secretário nacional de Justiça também mostrou preocupação com a diversidade presente no país e a relação disso com a criação de uma tabela com valores únicos válidos em todo o território brasileiro. “As diversidades do Brasil não permitem um tabelamento para todo o país. As variáveis são enormes”, afirmou.
O deputado federal Evandro Gussi, do PV de São Paulo, defende a necessidade de uma revogação da norma. “Nós precisamos construir um processo estratégico jurídico, político e de comunicação que faça com que o fim do tabelamento não só no Supremo, mas também com a revogação pronta e simples dessa lei”, assegura o parlamentar.
Além da CNI, promoveram o seminário Frete sem Tabela, Brasil com futuro, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), a Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) e a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (ABIA).