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“Enquanto seu lobo não vem” (Cartinha à minha irmã)

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Irmã:

Permaneci, das 08h30min até agora, 10h30min, desta quinta feira, 09/04, ouvindo as notícias sobre o tal Covid 19, com entrevistas de profissionais diversos, comentários, exemplos, estatísticas etc.

Até então, não ouvira de ninguém uma revelação verdadeiramente alentadora, salvo as recomendações relativas aos contatos pessoais e as necessidades do isolamento doméstico e público, este acompanhado das medidas ostensivas para conter os ajuntamentos de pessoas, que ocorrem em função das justificativas em filas bancárias, em postos oficiais, ao livre arbítrio, nas ruas, praias, praças, feiras, supermercados, e até nos próprios hospitais.

Tudo ocorre nesse sentido, mas ninguém se aventura a uma afirmativa sobre a extensão desse mal, fato este já admitido, portanto, sem uma previsibilidade de plena normalidade, capaz de nos proporcionar um retorno a doce vida que tínhamos, e não soubemos valorizá-la, nas condições usufruídas, ainda que precariamente ou intensamente sofridas. Não precisamos dos exemplos dessa realidade, sobretudo com outras Nações, porque somos o nosso próprio exemplo.

– Éramos felizes e não sabíamos!

– Ora, direis, saudosismo!

– E vos direi, no entanto, que a nossa suposta felicidade, esvaiu-se de repente, como a “pluma que flutua pelos ares”.

E, continuando sob á inspiração de Tom Jobim e Vinícius, na sua imortal canção, ” é preciso que haja vento (vento é vida) sem parar”.

Assim, ninguém de bom senso deseja “a vida breve”, em qualquer das suas condições, até que o inexorável dia da morte nos leve, sem que seja pelo efeito devastador de um “vírus”, de indiscutível letalidade, para nos levar, sem que déssemos causa direta a isso, a menos da herança da inata maldade humana, que nos destrói lentamente, com as suas nocivas (ou benéficas) ações, em nome do progresso e da vertiginosa pressa da modernidade. Não choro (embora soluce dentro de mim) de saudade do passado.

Choro, agora, convulsivamente, com a minh’alma pesarosa, pelo meu presente ameaçado, como parte da frágil humanidade, que se arrogou superior a tudo, desde a sua controvertida origem, quando o HOMEM, viu-se diante do desafio, em explicar o mundo ao seu redor, sob o assédio das perguntas do “trogloditazinho”, que não mais admitia respostas ligadas aos “mitos”, que já não bastavam às explicações do desconhecido. Seria preciso algo mais. Algo que, em não sendo mito, pudesse resolver essas questões essenciais, além daquelas do fundo da caverna. E, aí, o HOMEM criou “Deus”, limitando-se Nele, todas as suas angústias e devaneios.

“Nessa marcha, nascida, talvez, do instinto, inicialmente, e da incansável busca da SABEDORIA, logo depois, nasce a FILOSOFIA, nascem as Religiões, nasce a Ciência, em seu conjunto, todas essas, como palpitantes pilastras do CONHECIMENTO” cujo fulcro outro não foi, senão, o de sarar o Mundo, que se tornou, desde as priscas eras, cada vez mais podre, mais poluído, mais corrompido, mais cruel e. mais frágil, Pela magnitude do império das Civilizações, pelas Repúblicas ou ditaduras dos modernos Estados, pelos organismos sociais, políticos, econômicos, que serviram de castelos encantados aos poderosos, com os seus assessores, com a dominação da plebe, ajoelhada aos pés das escadarias palacianas, suplicando-lhes compaixão, e dando-lhes em troca o voto da subserviência, da passividade, do congênito servilismo, que culminou com a prática da ganância, do egoísmo, da usura, do salve -se quem puder, que deram origem ao capitalismo selvagem, com suas garras crispadas e prontas ao aliciamento sem limites.

Pergunto, para ir chegando ao fim deste texto, aconchegado em um sofá do meu enclenclasuramento, se nessas mal traçadas linhas disse alguma coisa que não seja a expressão da cristalina verdade? Se por acaso ofendi a alguém, dotado da mínima capacidade argumentativa, para, então, me mandar para as profundezas do inferno, em razão das minhas conjecturas? Se aquele, remotíssimo, tempo do caminhar da humanidade, e ao “mar de longo”, como, mais tarde, disse Pero Vaz Caminhas, na sua carta ao rei, dissimulando a trajetória da viagem , não é, ad absurdum, comparação, do mesmo mundo no qual vivemos hoje? Se não estamos cercados de “trogloditazinhos” a implorar ao Homem-Deus as respostas para semelhantes indagações do nosso tempo? Se o HOMEM- Deus encontrou o caminho da felicidade, tanto individual como coletiva, nessa de proferir que “todos somos iguais” como expresso na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)?

Se…Se…Se…

Vou encerrar, para não cair na vã tentação das blasfêmias ou nas possíveis incongruências destas palavras tortas, como um anjo que só deseja, agora, viver! Como desejo a você, minha irmã, e a todos que nos são caros. À humanidade, enfim!

Ah, só mais uma coisa: ofereço este rabiscado texto a Eric, meu filho, que, aos poucos, vai enveredando-se pelos caminhos da Filosofia.

José Walter Pires
Salvador, 09/04/20

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