Por Gisele Costa
No último dia 5 de novembro a tragédia de Mariana, em Minas Gerais, completou três anos. Na ocasião, uma barragem da mineradora Samarco se rompeu liberando rejeitos de mineração no ambiente, destruindo o Distrito de Bento Rodrigues e deixando um saldo de quatro vítimas fatais, além da poluição e devastação da Bacia do Rio Doce. O que ficou conhecido como o maior desastre ambiental já registrado no país serviu para que autoridades e a sociedade passassem a prestar atenção nas diversas Barragens espalhadas pelo país.
Divulgado no último dia 19, o Relatório da Agência Nacional de Águas (ANA), vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, aponta que aumentou de 25 Barragens, em 2016, para 45 em 2017 o número de áreas com risco de desabamento no país. A maioria está localizada no Norte e Nordeste, em Estados como Acre, Alagoas e Bahia. De acordo com os técnicos, há problemas de baixo nível de conservação, insuficiência do vertedor e falta de documentos que comprovem a estabilidade da barragem.
As informações, que constam do Relatório de Segurança de Barragens – 2017, de 84 páginas, coordenado anualmente pela Agência Nacional de Águas, identifica a existência de um cadastro que reúne 24.092 Barragens para diferentes finalidades, como acúmulo de água, de rejeitos de minérios ou industriais e para geração de energia. No entanto, técnicos da Agência Nacional de Águas calculam que o número de represamentos artificiais espalhados pelo país seja pelo menos três vezes maior. De acordo com a ANA, a quantidade exata só será conhecida quando os órgãos e entidades fiscalizadoras cadastrarem todas as Barragens sob sua jurisdição.
O Relatório de Segurança de Barragens – 2017 alerta: pelo menos dez Barragens baianas podem estar com estruturas comprometidas, dessas, cinco estão em municípios da região de abrangência da circulação do JS. São elas as Barragens do Apertado, no Rio Paraguaçu em Mucugê; de Cipó, no Riacho Cipó em Ibiassucê; Tabua II, no Rio Jiquitai em Mirante; Luiz Vieira, no Rio das Contas em Rio de Contas, e Zabumbão, no Rio Paramim em Paramirim.
Das cinco, duas são de responsabilidade do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca – Dnocs, órgão vinculado ao Ministério da Integração Nacional (Tabua II e Luiz Vieira); uma da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba – Codevasf (Zabumbão); duas da Companhia de Engenharia e de Saneamento da Bahia – Cerb, órgão da estrutura da Secretaria de Estado de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia (Apertado e Cipó), sendo a de Mirante administrada pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento – Embasa.
Em declarações à imprensa, o diretor de Regulação da Agência Nacional de Águas, Oscar Cordeiro Netto, disse que as informações constantes do Relatório de Segurança de Barragens, embora os números sejam de 2017 e a base de dados do ano anterior, são alarmantes e não é possível minimizar os riscos existentes para as populações que vivem no entorno das Barragens.
O que dizem os órgãos responsáveis pela gestão das Barragens
Por Gisele Costa
Dnocs – O Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), órgão da estrutura do Ministério da Integração Nacional, por meio da Assessoria de Comunicação Social, tão logo foi dada publicidade ao Relatório de Segurança de Barragens – 2017, divulgou “Nota de Esclarecimento” apontando que realiza sistematicamente, nas 327 Barragens sob sua responsabilidade, “todas as inspeções previstas na Lei de Segurança de Barragens”.
O Dnocs destaca ainda, na “Nota”, que já teriam sido e estariam sendo investidos, através do Programa de Reabilitação de Barragens – Prosb, recursos da ordem de R$ 60 milhões, repassados pelo Governo Federal, para execução de intervenções para recuperação e modernização da estrutura de Barragens, entre as quais as de Mirante (Tabua II) e Rio de Contas (Luiz Vieira).
Confira a íntegra da Nota de Esclarecimento do Dnocs:
“É importante destacar, antes de tudo, que todas as inspeções previstas na Lei de Segurança de Barragens são realizadas sistematicamente pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs) nas 327 barragens sob responsabilidade do órgão.
Para os 23 barramentos inseridos no Projeto de Integração do São Francisco de execução física, por exemplo, são aproximadamente R$ 267 milhões de recursos federais assegurados para a recuperação e modernização dessas estruturas.
Já por meio do Programa de Reabilitação de Barragens – Prosb, mais R$ 60 milhões da União também foram disponibilizados para intervenções em outros barramentos, inclusive em Araci (BA), Luiz Vieira (BA), Tabua 2 (BA), Pinhões (BA), mais de 80% de execução física.”
Codevasf – A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf), órgão da estrutura do Ministério da Integração Nacional, através da Assessoria de Comunicação e promoção Institucional da Superintendência de Bom Jesus da Lapa, por e-mail, limitou-se a informar que a Barragem do Zabumbão é inspecionada regularmente pela equipe técnica da empresa pública desde 2012. Segundo a Codevasf, “os problemas graves da Barragem já foram corrigidos após identificados nas inspeções feitas pela Companhia. A Barragem teve a recuperação do maciço realizada em 2014 e a manutenção eletromecânica em 2016”.
Inema – O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), órgão vinculado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente da Bahia, através da Secretaria de Estado de Comunicação Social da Bahia (Secom), em resposta a questionamento feito em relação à inclusão da Barragem do Cipó, em Mirante, encaminhou à Redação do JS, matéria que foi distribuída à imprensa na qual contesta os dados divulgados pela Agência Nacional de Águas.
De acordo com a Secom/BA, o diretor de Águas da autarquia, Eduardo Farias Topázio, “não há nenhuma Barragem em risco iminente de ruptura na Bahia”. Segundo Topázio, o relatório divulgado pela ANA é de 2017 e não reflete a realidade nacional da atualidade, na medida em que foi utilizado um universo de apenas 3% das Barragens de todo o país e no qual não constam dados de vários Estados que não apresentaram nenhuma informação sobe suas Barragens. “A Bahia acaba sendo penalizada por um Relatório que não leva em consideração o universo real do processo”, apontou Topázio.
Ainda segundo o diretor do Inema, os riscos apontados pela Agência Nacional de Águas não são exclusivamente de engenharia de estrutura, “mas grande parte deles é de riscos administrativos, que envolvem outras questões burocráticas”.
O diretor do Inema, segundo a matéria encaminhada pela Secom, para justificar suas observações em relação à improcedência das informações divulgadas pela ANA, tratou o Dnocs e a Codevasf como “órgãos federais extintos”, e apontou as barragens que seriam responsabilidade das duas autarquias como “relativamente abandonadas”. “Onde a gente encontra problemas são Barragens em órgãos federais extintos, que terminaram sendo relativamente abandonados, como as do Dnocs e Codevasf, onde de uma certa maneira o Estado tem buscado auxiliar nesse processo, mesmo não tendo responsabilidade objetiva”, pontuou.
O diretor do Inema prosseguiu afirmando que a Bahia foi o Estado que mais cumpriu metas de fiscalização e vistoria de barragens, sendo o único que atendeu integralmente ao que foi previsto e pactuado junto à Agência Nacional de Águas.
E, completa afirmando que o único equipamento, dos que foram apontados pela ANA como em situação de risco eminente, é a Barragem do Apertado, em Mucugê, que segundo a Secretaria de Estado de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia, “não se encontra em risco de ruptura” e, segundo técnicos do Inema, “não oferece riscos à população e nem ao meio ambiente”.
Embasa – Ao contrário do que destacou o diretor de Águas do Inema, a Barragem de Cipó, em Mirante, foi construída e tem sua operacionalidade vinculada à Companhia de Engenharia e de Saneamento da Bahia – Cerb, órgão da estrutura da Secretaria de Estado de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia, mas está sendo administrada, por contrato de comodato celebrado até 2021, pela Empresa baiana de Águas e Saneamento – Embasa. A autarquia, que é responsável pela captação no manancial, tratamento e abastecimento de água de Mirante, em dezembro do ano passado, emitiu uma Nota Técnica fazendo considerações em relação à Barragem de Cipó, posicionando-se em relação à solicitação do Governo Municipal de alteamento do vertedouro para assegurar o atendimento à demanda do abastecimento de água da cidade, na qual tece comentários técnicos sobre o equipamento e não aponta qualquer anormalidade.
O que dizem as autoridades municipais
Por Gisele Costa
Ouvida por telefone pela reportagem do JS, a secretária municipal de Meio Ambiente de Paramirim, Gracinete – Gau – de Jesus Oliveira, disse preferir que o prefeito do município, Gilberto Martins Brito (PSB) se posicionasse em nome da gestão municipal sobre os dados apontados no Relatório da Agência Nacional de Águas em relação aos eventuais riscos de rompimento da Barragem do Zabumbão.
Á reportagem do JS, o prefeito de Paramirim, socialista Gilberto Martins Brito, disse não ter capacidade técnica para avaliar ou mesmo comentar as conclusões da Agência Nacional de Águas. Ressaltou que o Governo Municipal não realizou nenhuma inspeção técnica na Barragem do Zabumbão e, por esta razão, não teria como fazer um juízo de valor. “A primeira providência que adotei, tão logo tomamos conhecimento do Relatório, foi entrar em contato com a Codevasf [Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba], empresa responsável pela administração da Barragem do Zabumbão, solicitando que fizessem uma análise do que foi colocado pela ANA e, se necessário, a adoção de providências”, afirmou o gestor.
O titular da Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente de Ibiassucê, Édno – Didi -Messias Brito de Andrade, disse que a Prefeitura Municipal ainda não teria sido comunicada oficialmente dos dados constantes do relatório da ANA, mas que já estariam viabilizando contatos com o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), que apontou ser o órgão responsável pela gestão da Barragem da Tabua II, para só então posicionar-se oficialmente sobre possíveis riscos de rompimento do equipamento e eventuais providências que serão adotadas no âmbito do Governo Municipal para preservar a população.
O titular da Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente de Mirante, Kellisson Silva Lima, disse à reportagem do JS que a Administração Municipal não tem conhecimento em relação a qualquer risco de rompimento da Barragem de Cipó. Segundo o secretário, a Barragem de Cipó seria administrada pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia, por força de contrato até 2021, e os problemas que estaria apresentando são relacionados à sua capacidade de armazenamento de água, motivados pelo assoreamento, uma vez que desde que foi construída, há mais de vinte anos, nunca recebeu intervenções para limpeza. “A Prefeitura de Mirante vem cobrando da Embasa, desde o início da atual gestão, investimentos na melhoria da estrutura e aumento do sangradouro da Barragem de Cipó, visando aumentar sua capacidade de armazenamento de água e, por consequência, o abastecimento de água do município”, ponderou Kellisson Lima.
O secretário municipal de Cultura, Turismo e Meio Ambiente de Mucugê, Euvaldo Ribeiro Júnior, ouvido por telefone pelo JS, afirmou que os dados apontados pelo relatório da Agência Nacional de Águas estão defasados. Acrescentou que a Companhia de Engenharia e Recursos Hídricos da Bahia (Cerb) – órgão vinculado à Secretaria de Estado de Infraestrutura Hídrica e Saneamento da Bahia – responsável pela administração da Barragem do Apertado, apresentou em maio último um Relatório no qual atesta que o equipamento está 100% no que diz respeito à segurança. “Na verdade”, ressaltou o secretário, “o único problema que enfrentamos no momento diz respeito ao déficit hídrico da Barragem, que está afetando o abastecimento de água do município”.
A coordenadora municipal de Meio Ambiente, que responde pela Secretaria Municipal de meio Ambiente e Recursos Hídricos de Rio de Contas, Dilcileia Anjos Santos, ouvida pela reportagem do JS, por telefone, afirmou que a Administração Municipal não tem em seus quadros um profissional técnico que faça inspeções na Barragem Luiz Vieira para analisar e validar ou não o que foi apontado pelo Relatório da Agência Nacional de Águas. Ressaltou, no entanto, que considerando que a ANA, que destacou ser um órgão competente, fez o levantamento e chegou às conclusões divulgadas, “é necessário sim investigar a situação e tomar as devidas providências”
A coordenadora de Meio Ambiente de Rio de Contas disse que o Governo Municipal, através da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, está preocupado e agendou uma reunião, realizada na quarta-feira , dia 28 (veja box), em Livramento de Nossa Senhora, da qual participaram representantes do Inema e das Prefeituras e entidades dos municípios de Livramento, Rio de Contas e Dom Basílio, membros da Comissão Gestora dos açudes Brumado e Riacho de Paulo, para discutir o relatório e apontar eventuais medidas a serem adotadas. Esse encontro, realizado em Livramento, ressaltou Dilcileia Anjos Santos, faz parte de uma agenda de reuniões mensais, realizadas para tratar de questões sobre a Barragem Luiz Vieira. “Agora, fomos surpreendidos com esse relatório da ANA. Mas, entendemos que é preciso levar à sério o que foi apresentado e tomar alguma providência para que o pior [rompimento da Barragem] não aconteça”, apontou a coordenadora de Meio Ambiente de Rio de Contas. De acordo com Comissão Gestora dos açudes Brumado e Riacho de Paulo, infelizmente a Agência Nacional de Águas não conseguiu encaminhar, em tempo hábil, o Relatório detalhado para que pudessem se debruçar sobre o problema e adotar, eventualmente, providências para prevenir riscos, acrescentando que a questão será analisada na reunião da Comissão prevista para o próximo mês de janeiro.