Diretor do Instituto Brasileiro de Mineração critica disposição que autoriza tributação estadual sobre bens primários, contrariando os princípios da reforma tributária
Por Agência Brasil 61
A inesperada inserção de um artigo na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que possibilita que os estados instituam tributos sobre bens primários e semielaborados, está provocando descontentamento ao contrariar os fundamentos fundamentais da reforma tributária. O diretor de Relações Institucionais do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Rinaldo Mancin, expressou suas críticas a essa medida.
“A visão convergente que compartilhamos sobre a reforma tributária está sendo desviada. A reforma possui uma orientação correta. Seu escopo consiste em simplificar, diminuir os encargos sobre as exportações e adotar uma tributação mais racional, baseada no destino e não na origem. O artigo 20 contradiz todos esses propósitos”, afirmou Mancin.
A versão da reforma aprovada pela Câmara inclui um dispositivo que autoriza os estados a cobrar um imposto, com vigência até 2043, sobre produtos vinculados ao agronegócio, mineração e petróleo. A finalidade seria angariar recursos para financiar investimentos em projetos de infraestrutura e habitação.
Rinaldo Mancin defende que o Senado deve remover esse artigo para evitar prejudicar os avanços pretendidos pela reforma tributária. “O artigo 20 não guarda qualquer relação com a reforma tributária. Ele é um acréscimo inapropriado, uma anomalia tributária que foi inserida. Devemos eliminar essa incongruência”, ressaltou.
O novo tributo proposto substituiria contribuições que alguns estados instituíram como requisito para que empresas obtivessem incentivos de ICMS. Atualmente, 17 unidades da federação mantêm fundos dessa natureza.
Em Goiás, por exemplo, o governo implementou o Fundo Estadual de Infraestrutura (Fundeinfra). Os recursos provenientes desse fundo são direcionados para a conservação de rodovias estaduais e projetos que aprimoram a logística do agronegócio, de acordo com as autoridades estaduais.
Para viabilizar isso, o estado cobra uma forma de contribuição variando entre 0,5% e 1,65%, aplicada a produtos agrícolas e minerais. Embora essa taxa não seja compulsória, ela representa a única alternativa oferecida pelo estado para que empresas não sofram retenção temporária do reembolso de ICMS a que teriam direito quando seus produtos são destinados à exportação.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) moveu uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade dessa cobrança. “A Lei Kandir isenta as exportações de ICMS. Entretanto, em Goiás, para aproveitar os benefícios garantidos pela lei, o estado exige que as empresas contribuam voluntariamente com um fundo de infraestrutura. ‘Eu te isento, te ofereço o que a lei assegura, mas venha aqui e coloque um pouco de dinheiro no meu fundo’, critica Rinaldo Mancin.
Eduardo Natal, especialista em direito tributário e sócio do escritório Natal & Manssur, argumenta que o tributo proposto na PEC é opaco e cumulativo, contrário à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que irão substituir IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS.
“Com a criação de um tributo que incide sobre semielaborados e primários, teríamos a incidência de um imposto já na primeira etapa da cadeia produtiva, cujo impacto no preço final o consumidor desconhecerá”, analisa Natal.
A possibilidade de adição desse tributo à CBS e ao IBS pode resultar no aumento da carga tributária, alerta o advogado. “Teríamos, mais uma vez, sobreposição de tributos, algo que a reforma tributária busca eliminar. Isso certamente aumentaria os encargos no processo produtivo.”
O Ibram estima que o impacto de um potencial tributo sobre a mineração causaria uma perda de R$ 6 bilhões para o setor, valor próximo à arrecadação do país no último ano com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), que totalizou pouco mais de R$ 7 bilhões. A imposição de outro tributo, argumenta o Ibram, oneraria as exportações e diminuiria a competitividade da indústria mineradora brasileira, responsável por grande parte do superávit da balança comercial.