O país é um dos maiores recicladores de latinhas do mundo e em 2022 atingiu os 100% de reciclagem. Projeto de lei em discussão no Congresso busca estabelecer a Política Nacional de Economia Circular
Por Lívia Braz
Evitar o desperdício no início da cadeia produtiva, garantir a maior utilização de produtos e materiais e regenerar sistemas naturais. É nesses três pilares que se baseia a economia circular: um conceito simples, fundado em fazer com que os materiais circulem com a maior vida útil possível.
A ideia é dar vida nova a algum objeto que antes iria para o lixo, ou fazer com que esse objeto — em vez de ser descartado — sirva como matéria-prima para a produção de um outro bem de consumo. Um exemplo disso são as garrafas pet, que se tornam matéria-prima para a fabricação de sacolas reutilizáveis, ou pneus que se transformam em pisos.
Um dos exemplos mais bem sucedidos de reciclagem e economia circular é o que o Brasil faz com relação ao alumínio. Dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alumínio (Abralatas) mostram que, em 2022, o país se tornou um dos maiores recicladores do mundo, reciclando 100% das latas usadas.
Cátilo Cândido, presidente-executivo da Abralatas, explica que os benefícios da economia circular vão além do meio ambiente. “A nossa indústria não se destaca pela reciclagem, mas é um produto que — num ciclo rápido de 60 dias, até virar uma lata novamente — gera inúmeros benefícios, não só ambientais, mas econômicos e sociais também.”
A reciclagem da latinha evitou a emissão de mais de 15 milhões de toneladas de gases de efeito estufa nos últimos 10 anos. Trabalho que movimenta cerca de R$ 6 bilhões por ano e gera emprego e renda para mais de 800 mil catadores em todo o país.
Brasil, líder em energia limpa
Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) mostram que metade da energia gerada no país é de fonte hídrica. Seguida pela geração solar fotovoltaica com 13,1%, e a eólica com 11,5%.
Segundo o economista e professor da FAAP-SP Sillas Souza, somos referência mundial quando o assunto é energia limpa. Nossa matriz energética, em geral, é renovável, o que faz do Brasil um player em economia circular.
“Enquanto o mundo ainda queima muito carvão, a gente usa água, um pouco de sol e cada vez usamos mais vento, nisso nós já somos mais ecológicos. Nós inventamos — em larga escala, o carro movido à álcool. A gente usa recursos naturais e renováveis enquanto o mundo usa esses recursos não-renováveis.”
A tecnologia Flex, desenvolvida para os carros brasileiros, é considerada como exemplo de economia circular, explica o professor.
Que destino damos ao nosso lixo?
Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos mostram que em 2022 foram gerados mais de 81 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos no Brasil. E 33,6% desse total são materiais que poderiam ser reciclados, como plástico, papel e papelão e vidros. Mas os dados oficiais — colhidos pelos serviços de limpeza urbana das prefeituras — mostram que apenas de 3 a 4% desse material é reciclado.
Número que pode ser bem menor do que o real, segundo Carlos Rossin, responsável pelo departamento técnico da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA).
“Como o setor na parte de reciclagem há um alto grau de informalidade, muitas vezes temos um controle de informações deficitário. No entanto, se a gente pudesse fazer um levantamento de todas as cooperativas ou pegar dados de outras estruturas — muitas delas informais — eu não tenho dúvida que os valores seriam muito superiores a esses.”
Políticas públicas para incentivar
O Fórum da Geração Ecológica — que funcionou na Comissão de Meio Ambiente do Senado entre 2021 e 2022 — rendeu frutos. Um deles foi o PL 1874/22, criado para incentivar os setores público, privado e toda a sociedade a adotarem práticas da economia circular, ou seja, a utilizarem resíduos e priorizarem a não-geração deles.
No projeto, de relatoria do senador Jaques Wagner (PT-BA), um conjunto de medidas que fomentam a transição da economia linear para a circular, como a utilização das compras públicas, o incentivo ao desenvolvimento tecnológico para a otimização do aproveitamento dos materiais e a adoção do Mecanismo de Transição Justa, para apoiar os setores mais afetados pelas alterações promovidas pela economia circular.
“Para ser funcional, a transição deve ser integrada: indústria, serviços, comércio, consumidores. Com os órgãos públicos não deve ser diferente. Penso, aliás, que devemos dar o exemplo, estimulando a contratação de empresas através de requisitos de sustentabilidade, reaproveitamento e, obviamente, preço de compra”, explica o senador.
Jaques Wagner ainda acrescenta que o poder público tem que ser o primeiro a dar o exemplo para a sociedade, estimulando as empresas que querem contratar a fazerem a administração e a adoção de sistemas ecologicamente corretos.