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Mãe Menininha do Gantois

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Semira Adler Vainsencher
Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco
pesquisaescolar@fundaj.gov.br

 

Na Bahia, usar roupas brancas às sextas-feiras é uma tradição muito antiga vinda da religião afro-brasileira do candomblé. Essa tradição é uma homenagem ao deus africano Oxalá, que no sincretismo religioso representa uma personalidade equivalente a Jesus Cristo.
No início da colonização brasileira, os rituais de candomblé eram praticados nas fazendas e na senzala. Sabe-se que o primeiro terreiro [terreiro, terreno espiritual do candomblé] foi criado na Bahia, oficialmente há 450 anos. Chamava-se Engenho Velho ou Casa Branca e funcionava na atual Avenida Vasco da Gama, em Salvador. Daí surgiu os terreiros do Gantois (localizado na Federação), e do Axé Opô Afonjá (em São Gonçalo do Retiro), e destes dois, surgiram muitos outros terreiros, tanto na capital do estado como nas principais cidades do interior da Bahia.
O Candomblé é uma prática religiosa que reverencia os Orixás – os espíritos da natureza originários dos elementos primários: terra, fogo, água e ar. Esses espíritos são deuses guerreiros que protegem a caça, a pesca, a maternidade, reis e rainhas e outros. Os Orixás são adorados em iniciações secretas e festivais anuais dedicados especificamente a eles. Para cada Orixá, há cores, vestimentas, um dia da semana, saudações e / ou comidas peculiares, que as pessoas referem e / ou oferecem, pedindo proteção, saúde, alegria e paz.
Os fãs de candomblé se vestem com roupas sui generis e dançam ao som de tambores. Ao entrarem em transe, acreditam que os espíritos dos Orixás são capazes de penetrar em seus corpos.
Neste contexto dos deuses africanos, em 10 de fevereiro de 1894, nasceu Maria Escolástica da Conceição Nazareth. Ela viria a se chamar Mãe Menininha do Gantois, e representaria a mãe-de-santo mais popular de todo o Brasil.
Por que, no entanto, a palavra Gantois está no nome de Madre Menininha? É preciso esclarecer que se tratava do sobrenome de um francês, residente em Salvador, que cedeu um pedaço de sua propriedade para que ali fosse construído um terreiro de candomblé. Em homenagem àquele senhor, a partir de então, os adeptos do candomblé passaram a associar o nome Gantois a tudo o que tinha a ver com aquele terreiro.
Ressalte-se que Maria Escolástica era descendente direta de escravos libertos: das mulheres negras que fundaram o primeiro terreiro nagô do Brasil – Ile Axé Aira Entile – em 1849. A primeira madre-santo conhecida no país foi Maria Júlia da Conceição Nazareth, e era mãe de Mãe Menininha. Ela trabalhava em um candomblé no bairro da Barroquinha, em Salvador. Com a morte de Madre Maria Júlia, em 1910, sua filha – Pulchéria [Pulquéria] Maria da Conceição – foi escolhida para ser a sucessora do terreiro. Oito anos depois, com o falecimento de Pulquéria, Madre [mãe] Menininha assumiria as obras do terreiro. Ela tinha apenas 22 anos na época.
Admirada por sua sabedoria, gentileza, conhecimento, humildade e mão firme, Mãe Menininha do Gantois foi a principal responsável pela difusão e popularização do candomblé na Bahia, tendo sido amiga e conselheira espiritual de várias personalidades ilustres, como Jorge Amado, Vinicius de Moraes, Dorival Caymmi, Zélia Gatai, Pierre Verger, Caribe e Nina Rodrigues.
Jorge Amado, um de seus grandes admiradores, disse que ela era filha de escravos que se tornaram [tornou] rainha, e que havia guiado o povo baiano com dedicação exemplar e bondade perene. Caymmi, por outro lado, no refrão de sua canção Mãe Menininha, destacou que a mão da doçura estava no Gantois. Vinicius elogiava em prosa e verso a famosa mãe-de-santo [mãe de santo] que usava saias de renda e óculos grossos.
Mãe Menininha, aliás, era muito procurada por antropólogos e sociólogos, que viam nela uma preciosa fonte de informação para escrever suas teses e estudos acadêmicos. Sua importância ficou tão evidente no cenário cultural do país que a Companhia Brasileira de Correios e Telégrafos chegou a lançar um selo comemorativo em homenagem ao centenário de seu nascimento.
A querida mãe de santo morreu no dia 13 de agosto de 1986, aos 92 anos. Gantois foi então sucedido por sua filha mais velha, Cleuza Millet, que ficou conhecida como Mãe Cleusa de Nana, e que liderou o lugar até 1998. Com sua morte, a sucessão do terreiro passou para Madre [mãe] Carmem de Oxalá – irmã mais nova de Cleuza. Nenhuma delas, porém, foi tão amada e admirada como Mãe Menininha do Gantois.

 

Recife, 23 de março de 2006.
(Atualizado em 9 de julho de 2008)
Traduzido por Peter Leamy, dezembro de 2016.

Fonte: VAINSENCHER, Semira Adler. Mãe Menininha do Gantois. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: < http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar >.

 

Postagem:
Antonio Novais Torres
antoniotorresbrumado@gmail.com
Brumado 05/01/2021.

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Jornal Digital Jornal Digital – Edição 745