Acredito piamente que quem é já nasce.
Dia desses perguntei a um amigo se a filhinha dele, de poucos meses, era gente boa.
É certo que acredito na mudança do ser humano sempre, em todo tempo, mas tem gente que é chata de nascença.
Não era o caso do Menino.
Menino era o típico garoto gente boa.
Sorridente, alegre, boa praça, todo mundo gostava dele.
Aonde chegava fazia amizade, conversava com todo mundo e não negava a ninguém um sorriso.
Ainda muito pequeno todos já sabiam que ele era completamente apaixonado por cachorros.
Foi “au au” a primeira palavra que falou e desde a primeira vez que viu um bichinho já queria um perto de si.
Um dia a mãe escutou ele contando a um amiguinho que tinha um cachorro.
Ela perguntou onde estava esse cachorro ao que ele respondeu todo sorridente:
“No meu coração.”
A mãe, pobrezinha, ficou confusa: não sabia se achava bom, porque, o filho tendo um cachorro morando em seu coração, ela não teria que providenciar um bichinho, ou ficava com peninha, afinal o Menino queria tanto que até criara um bicho imaginário.
A correria da vida era enorme e ela resolveu ficar feliz com a solução por ele encontrada.
Até que, um dia, o Menino chamou a mãe para uma conversa:
“Mamãe, o Marcelo me chamou de doido. Ele disse que eu fico falando que tenho cachorro, mas todo mundo sabe que não tenho e que o coração não é lugar de colocar nada, muito menos cachorro. Mamãe, eu preciso ter um, mamãe, ou eu vou ser conhecido como um mentiroso maluco.”
A mãe ficou em silêncio sem saber o que dizer. Afinal, ela já tinha usado todos os seus argumentos ao longo dos anos para adiar aquele momento, mas parecia que, daquela vez, não teria como escapar:
“Meu filho, você sabe que um cachorrinho, em nossa casa, deverá ser tratado com muito cuidado e carinho. Você que será o dono dele, terá que levá-lo para passear todos os dias, dar água, comida, além de arrumar toda a bagunça que ele fizer. Você entende que essa responsabilidade será sua?”
“Entendo, mamãe, entendo sim e a senhora pode ficar tranquila, eu vou cuidar dele direitinho.”
A mãe fez cara de pensativa e propôs um desafio:
“Vá até a cozinha e pegue um ovo na geladeira.”
O Menino, sem entender nada, buscou o ovo e trouxe para a mãe:
“Aqui está.”
A mãe segurou o ovo com cuidado e perguntou:
“Qual vai ser o nome do seu cachorro?”
“Farofa.”
Foi aí então que ela deu a mais inesperada de todas as sentenças:
“Esse aqui será o Farofa por uma semana – disse estendendo para ele o ovo – durante esse período, você fará com ele tudo que será sua obrigação com o Farofa. Quando for quarta-feira que vem conversamos.”
Ela falou isso e saiu.
O Menino ficou parado em silêncio olhando aquele ovo em sua mão por alguns minutos até que abriu um largo sorriso e foi até a cozinha.
Lá pediu ajuda e fez uma casinha para o “Farofa” onde ele jamais se machucaria e saiu com ele para passear.
Durante uma semana, o Menino passeou, deu banho, brincou e brigou com seu “cachorro” e a mãe só observando.
Quando a quarta-feira chegou de novo, mais ou menos no mesmo horário da primeira conversa, o Menino chamou a mãe:
“Mamãe, como você pode ver, eu consigo cuidar de um ovo, fazendo tudo que faria com um cachorro durante uma semana sem deixá-lo se quebrar, estou doido de vontade de te mostrar como o Farofa de verdade vai ser o cachorro mais bem cuidado do mundo.”
E a mãe, que já tinha se dado por vencida, pegou o falso Farofa com uma mão e, com a outra, entregou a ele o verdadeiro.
E foi assim, cuidado de um ovo diligentemente durante uma semana inteira, que o Menino gente boa conquistou um cachorrinho pra chamar de seu!