Redução da inflação exige que diferentes protagonistas assumam o compromisso com as medidas de enfrentamento do preço do diesel
Por: Agência Mostra de Ideias
Se o preço dos combustíveis já assustava o mercado no começo dos ajustes sucessivos, com os aumentos recentes, a preocupação aumenta. Apesar de estarmos há 87 dias de queda, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), o preço médio do litro da gasolina terminou a semana de 29 de maio a 4 de junho em R$ 7,21. A resistência dos valores, em meio ao crescimento da inflação, alerta para o risco de desabastecimento de alimentos.
Estimativas do Ministério de Minas e Energia apontam para uma sobrevivência de, no máximo, 38 dias sem a necessidade de importação antes da escassez de produtos. Todavia, representantes do transporte rodoviário de cargas afirmam não existir possibilidade de o setor manter as suas operações frente a esse cenário. Segundo o presidente da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), Vander Costa, em entrevista para a CNN em 11 de maio, o risco de paralisação das empresas de transporte é possível caso não aconteça reajuste imediato na cobrança do frete.
O diretor operacional da Anacirema Transportes, José Alberto Panzan, explica que nenhum setor tem como se manter estável sem a atuação das transportadoras. “Pela prevalência do modal rodoviário no Brasil, qualquer interferência no nosso setor ocasiona alterações em outros mercados. Porém, o problema que enfrentamos encontra-se no fato de estarmos arcando com a maior parte do frete com pouca margem para repasse do valor. Assim fica insustentável”.
José Alberto acredita que, caso a defasagem do frete não diminua, muitas empresas do transporte rodoviário de cargas correm o risco de falência. No caso do diretor da Anacirema, cuja especialidade é o serviço de lotação, ou cargas fechadas, a situação é pior: devido ao tipo de operação realizada, o gasto de combustível por viagem é maior. Além disso, por ser uma das principais modalidades na distribuição de alimentos, o custo elevado do diesel ocasionará a falta de oferta no número de caminhões disponíveis para a entrega e aumentará a inflação na cesta básica dos brasileiros.
“Tentamos fazer de tudo, buscando implementar processos modernos de logística e realizando parcerias com outras empresas para diminuir o impacto desse custo, mas chega um ponto em que não há mais o que fazer. Se em outros tipos de transporte, o diesel já é responsável por 35% dos gastos; no de lotação, chega a 50% do orçamento total. Como empresário do transporte, acredito que, em longo prazo, uma alternativa é apostar na intermodalidade. Contudo, por enquanto, a principal saída é o compartilhamento de responsabilidades entre todos os envolvidos no problema”, declara José Alberto.
Mesmo com os desafios, ele enxerga o momento como uma oportunidade de as transportadoras estarem mais envolvidas com a política. A situação despertou a atuação do setor nas causas nacionais e incentivou a presença dos seus empresários em audiências públicas e nas sessões de debate com os representantes públicos para se oporem a medidas que colocarão em risco a logística nacional.
Na opinião do diretor da Anacirema Transporte, o Projeto de Lei Complementar 18/2022, que trata da fixação de 17% da alíquota máxima do ICMS nos estados, é um avanço, porém não muda o problema. “Hoje, se a cotação do barril de petróleo cai, não significa que haverá uma redução do preço do combustível. É preciso que o governo federal e os estados entendam o seu papel no problema e estejam dispostos a arcar com os custos, assim como os transportadores e a população brasileira já faz”.
A questão dos combustíveis explicita a complexidade do estudo e do controle da inflação. Da mesma forma, ilustra a importância do transporte rodoviário de cargas para a economia. Com o recente posicionamento assertivo dos empresários a respeito do assunto, é provável que as próximas análises sobre a inflação de custo passem a incluir o gasto com o frete e a possibilidade de desabastecimento não só pelo lado da indústria, mas da logística também.
Contudo, os protagonistas do setor não encaram essa nova realidade como um excesso de cobrança no governo. José Alberto, por exemplo, ressalta que, mais do que participar dos debates, os transportadores precisam se tornar protagonistas de uma gestão colaborativa e organizada, contribuindo com o fornecimento de informações e dados para os representantes públicos e auxiliando no diálogo e no entendimento entre o governo e o mercado.
“Estamos próximos das novas safras de grãos no agronegócio, ou seja, teremos em mãos uma ótima oportunidade para aumentar o consumo das famílias e diminuir os preços nos supermercados. Porém, enquanto os preços atuais dos combustíveis continuarem, reitero: não haverá resposta equivalente na velocidade e na qualidade da entrega dessas mercadorias nos supermercados. O momento é difícil, mas há caminhos, opções e, sobretudo, oportunidades para fazermos diferente”, finaliza o empresário.