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Pesquisador extrai adubo de chorume

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Os centros urbanos geram cada vez mais resíduos sólidos (lixo), cujo gerenciamento desafia os setores públicos. A legislação brasileira determina que os municípios façam a disposição dos resíduos sólidos urbanos (RSU) em aterros sanitários, como forma de minimizar os impactos ambientais decorrentes da utilização de lixões e aterros controlados.

Durante a biodegradação dos compostos orgânicos dos RSU, ocorre a formação de um efluente líquido turvo, escuro, de forte odor nauseante denominado lixiviado, de elevado conteúdo orgânico e de composição variável, que depende do estágio de formação, do local, do solo, do regime pluviométrico, do clima. O chorume, como também é chamado o lixiviado, altamente contaminante, deve ser coletado e tratado adequadamente ao longo da vida útil do aterro e após seu fechamento. Seus principais poluentes são compostos orgânicos e amônia, composição que dificulta seu tratamento, que no Brasil ainda é muito incipiente na grande maioria dos municípios e não atende à legislação vigente.

A tendência no país é a de despejar o lixiviado no esgoto, cujo tratamento não elimina determinados componentes tóxicos que, em decorrência, chegam aos corpos hídricos, pois as ETEs não estão projetadas para processamento do chorume. Faz-se necessário, portanto, a eliminação prévia de certos componentes, que dificultam seu tratamento. Para tanto, impõe-se a realização de pesquisas que contribuam para a compreensão das características do chorume em clima tropical.

Jorge Luiz da Paixão Filho, autor do estudo: integrando produção agrícola e conservação do solo e da água – Foto: Antônio Scarpinetti/Jornal da Unicamp

Esta foi a motivação do tecnólogo de saneamento ambiental Jorge Luiz da Paixão Filho ao propor-se a estudar alternativas de tratamento do lixiviado de aterro sanitário (LAS), em pesquisa desenvolvida junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp, orientada e coorientada, respectivamente, pelos professores Adriano Luiz Tonetti e José Roberto Guimarães, e que contou com a colaboração da pesquisadora Jerusa Schneider e de várias unidades da Universidade.

Embora o pesquisador tenha se detido na determinação da composição do LAS em várias fases de sua formação, nos processos que possibilitassem a remoção da sua matéria orgânica e no seu tratamento conjunto com o esgoto sanitário, prática vigente no Brasil, esta matéria abordará a remoção da amônia por precipitação química e a utilização agrícola do produto sólido obtido (estruvita), com características de fertilizante, já que constituído de nitrogênio (N), fósforo (P) e magnésio (Mg).

Remoção de amônia

Todas as fases da pesquisa concentraram-se no chorume proveniente de uma célula experimental, de grandes dimensões (80x60x5m), construída, em 2012, no aterro sanitário Delta A de Campinas, SP. O lixiviado estabilizado, formado a partir de mais de um ano depois do estabelecimento do aterro, foi recolhido em intervalos predeterminados por aproximadamente 950 dias. Nele a concentração de nitrogênio amoniacal revelou-se de cerca de 2200 mg por litro, muitíssimo maior que o máximo de 20 mg por litro que pode ser lançado nos cursos d’água, segundo a legislação vigente. 

Registro do desenvolvimento das plantas de alface nos diferentes tratamentos testados. Tratamentos na ordem da esquerda para direita: controle; controle NPK; aplicação do material precipitado metade da dose recomendada de P; aplicação do material precipitado na dose recomendada de P; e aplicação do material precipitado com o dobro da dose recomendada de P. – Foto: Antônio Scarpinett/Jornal da Unicamp

A alta concentração de amônia nos efluentes pode causar morte de peixes e organismos vivos e, associada à presença de fosfatos, elimina o oxigênio dissolvido no corpo líquido levando à sua anaerobiose, ou seja, o extermínio dos organismos, como ocorre em trechos do rio Tietê, em São Paulo.  A estruturação de métodos que possibilitem a redução drástica do amoníaco no chorume antes de submetê-lo a tratamento nas ETEs constituiu o objeto de estudo do pesquisador.

Para tanto, ele tratou o chorume separadamente com dois conjuntos de reagentes. Primeiro com cloreto de magnésio (MgCl2) e hidrogeno fosfato de sódio (Na2HPO4), substituídos depois por óxido de magnésio (MgO) e ácido fosfórico (H3PO4).  Do primeiro tratamento resultou o mineral estruvita (MgNH4PO4.6H2O) e do segundo uma mistura de estruvita e carnalita (KMgCl3.6H2O), produtos com potenciais de fertilizantes agrícolas por conterem os macronutrientes N e P e ainda Mg, importante na fotossíntese, e que têm ainda a vantagem de conterem baixa concentração de metais pesados. Ambas as combinações de reagentes apresentaram 99% de eficiência na remoção de amônia, comprovando a eficiência dessa técnica. Para estudar a viabilidade do uso dos dois sólidos obtidos como adubo cabia então testar-lhe a eficiência, o que foi feito no cultivo de alface (Lactuca sativa).

Cultivo de alface

Para avaliar a influência da estruvita na produção de alface tipo lisa, o mineral foi utilizado como adubo em três situações diferentes: uma em que a quantidade adicionada continha a concentração de fosfato recomendado no cultivo e em outras duas com, respectivamente, metade e o dobro da dose prescrita para que pudessem ser comparados os resultados. O mesmo critério foi empregado em relação ao cultivo com a mistura estruvita e carnalita. Como controle foram utilizadas culturas apenas no solo e também em solo com NPK, adubo comercial.

Visão geral do experimento: A) Início do experimento com o transplante de mudas: 05/11/2015; B) final do experimento com a colheita das plantas: 21/12/2015 – Foto: Antônio Scarpinett/Jornal da Unicamp

A utilização da estruvita nessa cultura mostrou-se mais eficiente que o fertilizante comercial, possibilitou maior crescimento da planta – parte aérea e raízes – e maior concentração de nutrientes nas folhas (N, P e Mg) e no solo, mantendo-o ainda fértil para um segundo plantio, desde que empregado o dobro da dosagem recomendada em relação ao fosfato. Essa eficiência pode estar ligada à liberação lenta dos nutrientes, atendendo às necessidades de demanda do vegetal em cada fase do crescimento.

O emprego da mistura estruvita com carnalita, que seria o adubo perfeito por conter NPK, apresentou a desvantagem de salinizar o solo devido à presença de cloreto de sódio. Mas futuros estudos poderão vir a contribuir para a viabilização do seu uso. 

Jorge considera que a utilização futura como adubo, tanto da estrutiva como de sua mistura com carnalita, poderá viabilizar economicamente a extração da amônia do lixiviado, promovendo a integração entre a produção agrícola e a conservação do solo e da água.

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Jornal Digital Jornal Digital – Edição 744