Por Petrônio Souza*
Relíquia histórica guardada entre montanhas e densas florestas, Piranga resgata suas tradições e se revela com potencial turístico, cultural, religioso e culinário para toda Minas Gerais
Situada na Zona da Mata e com povoamento mais antigo que as vizinhas cidades de Mariana e Ouro Preto, Piranga vem resgatando e valorizando suas histórias e tradições nos últimos anos.
Prova disso foi o recente ingresso da cidade no seleto grupo dos municípios que compõem a Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais, entidade que congrega três cidades patrimônios culturais da Humanidade e mais de 60% de todo o patrimônio histórico tombado no Brasil.
Se não bastasse apenas isso, Piranga promove neste ano o carnaval com o sugestivo nome de Folia que Conta História, quando a cidade investe na divulgação e promoção do seu centenário carnaval, que conta com a tradição do Bloco do Zé Pereira, com seus 107 anos de histórias e muita folia.
Carnaval que conta histórias
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Na verdade, o Bloco do Zé Pereira abre o carnaval de Piranga, realizando sempre o seu primeiro desfile, decretando assim o início do período momesco no município.
A presença do Zé Pereira é tão forte em Piranga que ele se divide em três bairros, sendo que cada um tem identidade própria, sempre homenageando em seus bonecos e temas dos desfiles, personalidades que ajudaram o bloco em sua localidade ao longo dos anos.
Objetivando o crescimento e aperfeiçoamento de seu carnaval, a prefeitura de Piranga promoveu oficinas de confecção de bonecos e adereços para os artistas dos blocos na cidade vizinha de Mariana, para aprimorarem ainda mais a arte da confecção dos bonecos, adereços e acessórios.
Uma curiosidade é que o Bloco do Zé Pereira após abrir o carnaval, desfila até o primeiro dia oficial da festa, quando acontece a morte do Zé Pereira, realizando assim seu velório. O velório do Zé Pereira se faz em um cortejo que toma conta das ruas da cidade, até chegar à ponte sobre o rio Piranga, quando uma réplica do boneco é colocada em uma caixa de madeira e atirado ao rio, ao som de marcha fúnebre tocada pela banda de música “Orquestra 2”.
A partir daí, os blocos que também são tradicionais na cidade tomam conta das ruas de Piranga, dando vida a um carnaval que é tradição e referência em todo o Vale do Rio Piranga.
Cidade tricentenária
Todo o município de Piranga é povoado por casas, casarões e fazendas históricas, igrejas e capelas centenárias, como pedras garimpadas na bateia do tempo, dando seu testemunho de um município que atravessou os séculos e os vários ciclos econômicos de Minas Gerais e do Brasil.
Mas é no distrito de Santo Antônio do Pirapetinga, conhecido apenas por Bacalhau, que se encontra uma preciosidade mineira, uma relíquia das Minas do Ouro que resiste ao tempo e às intempéries da modernidade: o santuário do Bom Jesus do Bacalhau. A 12km do centro de Piranga, o Santuário está situado na parte alta do distrito, se revelando com um dos mais belos e cinematográficos conjuntos arquitetônicos de Minas e do Brasil.
Tombado pelo IPHAN e completamente preservado, o Santuário é composto pela igreja do Bom Jesus do Bacalhau ao centro, sendo rodeado por 68 casinha de romeiros, que são ocupadas apenas uma vez por ano, durante o Jubileu do Bom Jesus, celebrado entre os dias 1º e 15 de agosto. O restante do ano o Santuário é aberto à visitação de quarta a domingo, das 8h às 17h, sem taxa. Todo dia 15 de cada mês é celebrada a Missa do Romeiro no Santuário, às 17hs. Nos domingos, as missas são às 15h, sendo que apenas no último domingo de cada mês a missa é transferida para a capela do distrito.
Construída no estilo colonial luso-brasileira, não há uma data precisa quanto a conclusão da igreja. Historiadores dão conta de que os jubileus tiveram início já no século XVIII, anterior a sua construção. Foram os romeiros que construíram as primeiras casinhas, onde passavam a noite depois de uma longa viagem.
Bom Jesus do Bacalhau
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Tudo começou quando encontraram uma imagem do Bom Jesus de Matosinhos em tamanho quase natural, no alto de uma colina. A imagem foi levada para uma capela. Misteriosamente, ela voltou para o alto da colina onde fora encontrada. O fato se repetiu algumas vezes. Foi exatamente naquele local que construíram a igreja consagrada ao Bom Jesus.
Hoje essa imagem se encontra exposta em uma capela atrás do altar, podendo o devoto passar à sua frente e pedir bênçãos, ritual que acontece com longa fila durante os dias do Jubileu. Neste ano o Jubileu chega a sua 239ª edição. O Santuário tem instagram: @bomjesusdobacalhau.
O nome Bacalhau se originou do português pioneiro José Gonçalves Bacalhau, que emprestou seu sobrenome também para o ribeirão que circunda o distrito.
No distrito, o belo conjunto urbano tem na capela de Santo Antônio outra relíquia, revelando uma forte vocação para o turismo religioso e histórico.
O único evento cultural realizado no distrito é o Festival Gastronômico Sabores em Bacalhau, realizado no mês de julho, apresentando a tradicional culinária local.
Objetivando o desenvolvimento do turismo, a prefeitura estuda a criação de um festival de cinema no distrito.
Cachoeira e encontro de rios
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Cercada por densa floresta Atlântica, Piranga tem na Cachoeira Zé de Arminda, a 15km do centro, um dos seus atrativos naturais mais conhecidos. De fácil acesso, a curta trilha de 200 metros é marcada pela emoção da travessia do rio Piranga, feita em um ponte pênsil de 70 metros de extensão. Ao final da ponte, ve-se o encontro dos rios Sete Cachoeira e Piranga. Poucos metros acima, a bela cachoeira Zé de Arminda, com seu grande poço, ideal para banho.
A cachoeira conta com bar e estacionamento. No bar do Tarcizo, os tradicionais tira-gostos de boteco, com a porção de peixe para três pessoas saindo a R$50,00. As cervejas saem em média de 10,00 a garrafa.
Cachaçarias e degustações
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A fabricação de cachaça de alambique é tradição em todo o Vale do Rio Piranga, sendo hoje a região com a maior densidade cachaceira no Brasil, como atesta o Anuário da Cachaça de 2023.
Na cachaçaria Vale do Piranga, que fica em uma fazenda a 1km do centro, é possível o turista conhecer todo o processo de fabricação da cachaça, produzida há 50 anos, além de fazer degustação dos seus mais de 20 rótulos.
O produtor da premiada cachaça Vale do Piranga é o atual presidente da ANPAQ – Associação dos Produtores de Cachaça Associação Nacional dos Produtores e Integrantes da Cadeia Produtiva e de Valor da Cachaça de Alambique, Sérgio Maciel, que está criando, ao lado dos inúmeros produtores da região, o registro do modo de fazer a cachaça de alambique do Vale do Piranga, dando status e visibilidade às características específicas da cachaça produzida na região.
A visita à cachaçaria é gratuita e pode ser agendada pelo instagram @cachacariavaledopiranga. As cachaças variam de R$50,00 a R$200,00 a garrafa.
Outra cachaça tradicional de Piranga é a Risadinha, produzida em uma fazenda secular desde o ano de 1948.
Situada a 6km do centro, a cachaçaria também recebe turistas e faz além da degustação, visita guiada, mostrando todo o processo de sua produção artesanal. São quatro os tipos de cachaça Risadinha, sendo a garrafa vendida entre R$25,00 e R$60,00.
No salão de degustação é possível ver o rótulo e a receita originais da cachaça. A receita fica exposta em um quadro, datada de 13 de março de 1948. Suspenso no meio da sala um enorme parol, uma espécie de tonel primitivo, feito apenas em madeira. A visita gratuita pode ser agendada pelo instagram @alambiquerisadinha.
Um passado de glórias
Terra do primeiro governador de Minas, Cesário Alvim, Piranga tem no distrito de Pinheiros Altos, a 18km do centro, o Museu montado na casa em que nasceu o governador, que além de contar um pouco da história do município e de Minas, exibe relíquias de época, como a carta escrita por Cesário em 1919, pedindo apoio à candidatura do político mineiro da cidade vizinha de Viçosa, Arthur Bernardes, à presidência da República.
O distrito conta ainda com duas igrejas centenárias, como a bela igreja de Nossa Senhora do Rosário e de Nossa Senhora da Conceição.
Piranga é uma dessas cidades privilegiadas, que unem a afetuosa hospitalidade interiorana às tradições e cultura de uma cidade histórica, se revelando como grande potencial para o desenvolvimento de seu turismo, atraindo assim visitantes de todos os cantos de Minas Gerais e do Brasil.
Para chegar a Piranga, saindo de Belo Horizonte, pega-se a BR 040, sentido Rio de Janeiro, até chegar em Conselheiro Lafaiete, a 90km de distância. Em Conselheiro Lafaiete passa-se pela área central da cidade, até chegar a MG 482. Na MG 482 roda-se por mais 60km, em média de uma hora de viagem.
Para se hospedar, próximo ao centro, a confortável pousada Solar do Rosário, na Rua Santa Efigênia, 140: www.pousadasolardorosario.com.br, com diária para casal a R$ 175,00. (31) 3746-1520.
Para comer, próximo ao centro, o Bar do Ruinha, na Rua Honório Garcez, 243. Tradicional na cidade, a Bar trabalha com variadas porções de boteco, ao preço média de R$ 40,00. A cerveja gelada sai a média de R$ 12,00.
Para saber mais sobre Piranga e sua história, acesse o site oficial da prefeitura: www.piranga.mg.gov.br
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*Petrônio Souza é jornalista e escritor – @petroniosouzagoncalves
Fotos: Divulgação