Por Sérgio Favarin
Quem nunca teve de correr, entre um aplicativo e outro de bancos diferentes, para transferir um determinado valor, seja para cobrir o cheque especial ou efetuar o pagamento total de uma conta? Este breve exemplo que todos nós podemos nos identificar é um dos principais problemas que as chamadas transferências inteligentes vêm para atacar, como parte de mais uma etapa da evolução do Open Finance no Brasil.
Aqui cabe uma breve explicação: o Open Finance (ou “sistema financeiro aberto”) permite o compartilhamento padronizado de dados e serviços por meio de APIs (Application Programming Interfaces) por parte de instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central. Cabe aos clientes (pessoa física ou jurídica) decidirem quando e com quem desejam compartilhá-los, desde que seja com finalidades específicas e prazos determinados.
Vivemos hoje a fase 4 da implementação deste sistema no país, na qual os consumidores estão tendo ainda mais acesso a dados, produtos e serviços financeiros, como pagamentos e encaminhamento de propostas de crédito, sem a necessidade de acessar os canais das instituições financeiras com as quais você já tem relacionamento. É justamente isso que as transferências inteligentes visam propiciar: a entrega de serviços financeiros com maior agilidade, conveniência e segurança.
Uma vez que você, cliente de um banco, autorize, programe e automatize transferências de fundos entre suas próprias contas, de forma inteligente e personalizada, o processo inteiramente digital tem início. São três as características centrais para aderir a essa modalidade:
· Gatilhos e condições – Você define regras específicas (gatilhos) para que as transferências ocorram automaticamente. Por exemplo, ao atingir um determinado saldo mínimo em uma conta, o sistema pode transferir o excedente para outra conta com maior rentabilidade.
· Flexibilidade – É possível configurar transferências recorrentes, únicas ou baseadas em eventos específicos, como o recebimento de um salário.
· Personalização – A ferramenta permite ajustar os valores, as contas envolvidas e a frequência das transferências de acordo com suas necessidades.
Fica claro que o principal benefício das transferências inteligentes é uma gestão financeira mais eficiente e personalizada, com ganho de tempo, otimização de recursos e tomadas de decisões mais inteligentes sobre o dinheiro. E tudo de forma segura (blockchain), uma vez que o setor bancário e financeiro é tido como o que mais investe em cibersegurança no ambiente de negócios de todo o mundo.
Talvez alguém que esteja lendo esse conteúdo se pergunte porque o seu banco ainda não lhe informou sobre essa oferta já disponível no mercado. Instituições menores estão oferecendo as transferências inteligentes, porém os maiores bancos tradicionais e digitais ainda não. O motivo? Estratégia. Digo isso porque, como um especialista em tecnologia, asseguro que a infraestrutura está pronta para todos operarem. Contudo, nem todas as organizações financeiras estão no ambiente Open – não por acaso, há situações em que clientes ainda não conseguem compartilhar todos os seus dados entre todos os bancos em que possuem conta. Mas é um cenário que vai evoluir para uma maior uniformidade, não há dúvida.
As transferências inteligentes também impactarão com robustez a área de investimentos, pois a mesma lógica pode ser aplicada para as mais variadas aplicações, e também setores de negócios como o Imobiliário e de Varejo, com a gestão de contratos inteligentes, que serão gerados por programas autoexecutáveis que, automaticamente, realizam transferências quando condições predefinidas são atendidas. Desta forma, fica eliminada a necessidade de intermediários, acelerando o processo de transferência da posse de um bem.
Como toda a tendência tecnológica em andamento, é claro que esse sistema também ganha ainda mais força com o aporte da Inteligência Artificial (IA). Associada ao machine learning, a IA pode ser utilizada com muito sucesso na detecção e prevenção de fraudes em tempo real, ao analisar padrões de transações e melhorar a segurança geral das transferências. Para me fazer entender de uma maneira mais simples, faço a seguinte metáfora: é como colocar uma ou duas turbinas na asa de um avião. É muito mais potência e velocidade.
A IA também traz uma elevação da experiência do cliente que, associada a uma melhoria da eficiência das operações bancárias, torna todo o ecossistema mais personalizado. Essa tecnologia poderá, uma vez autorizada pelo cliente, analisar hábitos de consumo e padrões de gastos para, em seguida, oferecer sugestões personalizadas de transferências, como a criação de categorias automáticas para seus gastos ou investimentos. Outro ganho possível é a possibilidade dos algoritmos de IA preverem as necessidades futuras do cliente, como pagamentos de contas ou recebimentos de salários, ajustando as transferências automaticamente.
Por ser uma operação “ganha-ganha”, que traz benefícios tanto aos bancos (reduz custos, aumenta segurança) quanto para os clientes (experiência superior, com ganho de tempo), acredito que veremos uma forte expansão das transferências inteligentes no sistema bancário e financeiro do Brasil até o final deste ano. A adição da IA é mais um passo na transformação que vivemos da forma como interagimos com nossas finanças. Impulsionadas por essa tecnologia, as transferências inteligentes oferecem uma experiência mais personalizada, segura e eficiente, colocando o controle do seu dinheiro nas suas mãos.