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Projeto determina que mera inadimplência não configura crime contra ordem tributária

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PL proposto pelo deputado federal Alexis Fonteyne (Novo-SP) quer diferenciar devedor contumaz do eventual, retirando a criminalização de quem não teve intenção de fraudar o fisco

 

Por Agência do Radio

 

Uma decisão (hiperlink) do Supremo Tribunal Federal (STF), do final do ano passado, entende agora como crime deixar de pagar os impostos tributários, mesmo que tenham sido registrados regularmente nos livros fiscais. Essa prática, conhecida como mera inadimplência, é foco de um projeto de lei (PL 6520/2019) do deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP), elaborado após o posicionamento da Corte.

A discussão teve início após o julgamento do recurso de um empresário de Santa Catarina que declarou o recolhimento de R$ 30 mil de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), mas não pagou a quantia. Na época, ele foi acusado de apropriação indébita, mas absolvido logo depois. Porém, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou o entendimento do caso, afirmando que se tratava de crime. Os advogados do empresário recorreram ao STF, que manteve a decisão do STJ.

A proposta do PL 6520/2019 é esclarecer o que pode ter causado a confusão em relação aos entendimentos dos tribunais, retirando a tipificação de crime contra a mera inadimplência. “Não estamos falando do sonegador de impostos. O que não pode criminalizar é aquele devedor eventual. O contumaz, aquele sonegador profissional, o que faz planejamento tributário, a gente quer que seja enquadrado, sim”, esclarece Alexis.

O professor e advogado tributarista Thiago Sorrentino comenta que a decisão do STF pretendia, na verdade, atacar os inadimplentes contumazes, ou seja, aqueles devedores recorrentes que utilizam o não pagamento de tributos como forma de autofinanciamento. “Mas a ideia ficou tão ampla, tão genérica que qualquer tipo de não pagamento também vem tipificado como crime”, diz.

Na opinião do advogado Thales Falek, houve uma “falha” nas jurisprudências ao não diferenciar o que seria ICMS próprio do ICMS em substituição tributária. Para isso, ele cita o exemplo de uma refinaria de petróleo. Segundo o especialista, quando o proprietário da refinaria vende para os distribuidores, já recolhe o valor do ICMS em substituição tributária. “Ou seja, ele já recolhe antecipadamente o valor desse imposto até chegar na ponta final, que somos nós que adquirimos a gasolina nos postos de combustíveis”, diz.

Ele continua: “A refinaria recolhe, lá na frente, por um preço presumido. O Estado passa um valor médio do preço e quando essa gasolina chega no consumidor final, o valor tem que estar incluído no preço do produto ou serviço. Ou seja, aqui, já teve o recolhimento, mas o substituto não repassou o valor devido para o Estado e se apropriou dele.”

Para o especialista, há uma grande diferença entre esse tipo de devedor, que agiu com dolo e com contumácia, e o que agiu sem intenção de dever ao fisco. “São situações completamente diferentes”, avisa Falek. “Em uma, o empreendedor sabe que deve, mas não consegue pagar. Em outra, já houve o recolhimento e, no meio da operação, ele se apropria do valor e não repassa ao fisco”, completa.

O crime não ficaria restrito só ao ICMS, como lembra Falek, mas poderia ser estendido ao não recolhimento previdenciário e à retenção do imposto de renda, por exemplo.

Crimes tributários
O texto do PL do deputado Alexis Fonteyne sugere uma alteração na lei 8.137/1990, que versa sobre crimes contra a ordem tributária. Em seu segundo parágrafo, o atual texto da lei diz ser crime “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos.”

A mudança sugerida no inciso, considerada mais adequada pelo autor do PL, é reforçar que só haverá crime contra a ordem tributária caso haja o dolo, ou seja, a intenção de fraudar a fiscalização tributária, e a contumácia.

Falek comenta por que surgiu essa discussão de mudanças em uma lei editada há 20 anos. “Não acho que haja um motivo específico para que, depois de todo esse tempo, o Supremo dê esse entendimento. É mais uma questão de morosidade da Justiça para chegar a esse ponto agora”, critica o advogado.

Com a atual jurisprudência, caso um inadimplente eventual seja enquadrado na lei contra os crimes tributários, ele pode, além de ficar com o “nome sujo”, responder penalmente, estando sujeito a processo criminal, condenação e a cumprir pena de prisão, que, nesses casos, poderia chegar a dois anos.

“Uma das razões da existência desse PL é também impedir que esse tipo de criminalização desestimule a atividade econômica”, acredita Thiago Sorrentino. “Se você diz a um empreendedor que se não der certo e houver qualquer problema gerencial ele corre o risco de ir para a cadeia, muitas pessoas vão desistir de empreender, já que é muito arriscado”, emenda.

Em uma pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), foi constatado que o tempo médio de vida de empresas brasileiras é de dois anos. Entre as causas de dificuldade de sobrevivências desses empreendimentos, estão impostos/tributos, burocracia e inadimplência. “Essas pessoas que fecharam estavam agindo de má-fé? Nem sempre. Mas, a partir dessa decisão do Supremo, elas estariam sujeitas a ter que explicar para o juiz o motivo do não pagamento do ICMS, por exemplo”, diz Sorrentino.

Na opinião do especialista, a proposta parlamentar ajusta esse entendimento amplo do Supremo. “Esse projeto de lei faz uma correção legislativa da jurisprudência para retornar ao entendimento anterior, de que você só pode ter crime quando a pessoa tenta esconder, que ela não declara que ela deve o tributo.”

Reforma
No ano passado, a reforma tributária voltou a ser discutida no Congresso Nacional. Desde o início de fevereiro, quando deputados e senadores voltaram aos trabalhos, já era dada como certa a formação de uma comissão especial para discutir o tema. A comissão foi instalada no último dia 19.

O senador Roberto Rocha (PSDB-MA) assumiu a presidência do colegiado e a relatoria, por sua vez, ficou com o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que defende a criação de um texto comum, elaborado em conjunto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

Defensor dessa reforma, o deputado Alexis Fonteyne acredita que o PL 6520/19 nem seria necessário se houvesse essa mudança geral. “Se fizermos uma boa reforma, esse projeto nem precisa existir.” Para ele, o atual sistema está “fabricando inadimplentes.” “Estamos obrigando fabricantes e indústrias a terem um capital de giro absurdamente alto, mas não para financiarem as suas atividades, mas pagarem tributo do Estado e dos outros”, critica.

Alexis acredita que a reforma traria mais equilíbrio para a economia. “Hoje, a carga maior está nos bens. É a carga mais regressiva que tem, porque bens são os mais pobres que consomem e os serviços são os ricos. E por incrível que pareça, onde tem a maior carga tributária é nos bens, é uma carga distribuída de forma errada. Nós queremos mudar isso”, promete.

Atualmente, o PL 6520/2019 está na Coordenação de Comissões Permanentes (CCP) e a comissão especial da reforma tributária pode ser instalada a qualquer momento no Congresso Nacional.

 

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