Enquanto contemplar os peixes ajuda a baixar a pressão arterial, conviver com um gato reduz em até 30% o risco de problemas cardíacos. Por que os animais de estimação estimulam a liberação de endorfinas?
Por Marta Rebón/El País
O reino animal sempre foi um espelho no qual a humanidade se olha para entender o mundo. Os animais estão presentes em mitos ancestrais que explicam a criação do universo, protagonizam nosso pensamento metafórico e até os fizemos falar em bestiários, fábulas, ditados, contos de fadas e distopias orwellianas. Ao observá-los, o ser humano encontrou uma extensa enciclopédia do comportamento: a fidelidade do cão, a nobreza do cavalo, a organização da formiga… Tudo que fazem obedece à certeza de que viver fora do presente é um luxo muito caro. Por isso, usam sua engenhosidade para superar obstáculos, têm a audácia de seguir seu instinto e cuidam daquilo que é importante em cada momento.
A atribuição de qualidades e características humanas aos animais é uma reação inata da psicologia, assim como a tendência de querer interpretar seus pensamentos. Estudos recentes demonstram que desde a infância nosso sistema nervoso responde de maneira preferencial à proximidade de um animal, principalmente a amígdala direita, encarregada de administrar a resposta emocional. Além de louváveis filósofos da experiência, os animais são um ponto de acesso natural e genuíno à intimidade de nossos julgamentos, sensações e hábitos, pois revolucionam nossa química interna com o simples gesto de nos aproximarmos deles e tocá-los. Contemplar o movimento hipnótico dos peixes faz nossa pressão arterial baixar, conviver com um gato reduz o risco de problemas cardíacos − segundo um estudo da Universidade de Minnesota − e acariciar um cão estimula o sistema imunológico. Os animais, com seus movimentos, cor, forma, textura, cheiro, som e calor, ativam, em suma, nossos cinco sentidos. Provocam em nós uma reação afetiva e cognitiva capaz de desbloquear a expressão de sentimentos de angústia. Ou, pelo menos, de apaziguá-los.
Isso não é negligenciado pela psicologia clínica. Tanto a relação afetiva especial que se cria com um animalcomo o bem-estar diretamente relacionado com ele são um campo de pesquisa ainda jovem. Embora sua companhia se utilizasse intuitivamente em sanatórios e hospitais para reconfortar os doentes, o valor terapêutico não foi estudado sistematicamente até o início dos anos 1950, quando o psiquiatra Boris Levinson percebeu a reação espontânea que seu animal de estimação provocou em uma criança autista na primeira visita a seu consultório. “Para minha surpresa, não se assustou – em vez disso, abraçou o cachorro e começou a acariciá-lo”, escreveu em seu célebre artigo The Dog as a Co-Therapist (“o cão como coterapeuta”). Levinson entrou no jogo e, graças à sua mascote, conseguiu estabelecer um vínculo com seu paciente. “O animal de estimação é uma ilha de sanidade no que parece um mundo de loucos”, afirmou. As relações interpessoais se caracterizam pelas expectativas que depositamos nelas, não isentas de decepções e de outros sentimentos negativos complexos, como inveja e ressentimento. Com os animais, pelo contrário, tudo parece mais simples, previsível e consistente, além de gratificante.
“As pessoas que entrevistamos que convivem com animais afirmam, em sua grande maioria, que estes tiveram um efeito positivo em suas vidas”, comenta Jaume Fatjó, diretor da Cadeira Fundação Affinity Animais e Saúde da Universidade Autônoma de Barcelona, uma das pioneiras na Espanha no estudo da terapia com o auxílio de animais. “E mais: há quem admita que, ao não se sentir julgado, contou [ao animal] coisas que nunca compartilhou com outras pessoas.” Devido à nossa atração e curiosidade inatas pelos animais, “sua mera presença cria um ambiente de maior confiança e segurança, capaz de derrubar barreiras comunicativas entre o terapeuta e o paciente”, aponta Fatjó. Uma mascote desempenha, assim, o papel de ponte entre um e outro no tratamento de situações pessoais traumáticas ou em contextos sociais sensíveis, como prisões, asilos e lares desestruturados. “Nos casos de demência, constituem uma ajuda para a estimulação sensorial, e em crianças com distúrbios de desenvolvimento, ajudam no controle dos impulsos”, acrescenta o etologista. Mas esse não é um método que possa ser usado indiscriminadamente, é necessária uma abordagem caso a caso.
Contemplá-los nos devolve o valor da paciência, a importância do momento presente e a idiotice de nos levarmos muito a sério. Acariciar a pelagem de um gato, a carapaça de uma tartaruga ou a crina de um cavalo relaxa e estimula a secreção de endorfinas. E, como se isso não bastasse, o vínculo com os animais é um grande indicador de nosso respeito pelos outros. Kant já dizia que quem é cruel com os animais faz o mesmo com seus pares.
Foto de Capa: Diego Mir