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Sem a ajuda do Estado, pais de crianças com AME buscam apoio na internet para obter tratamento

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Por Lucas Coutinho/Curiosidades 10

 

A alegria da chegada de um filho transformada em uma aflitiva busca por salvar sua vida. Isso é o que vivenciam os pais de bebês nascidos com o tipo mais grave da Atrofia Muscular Espinhal (AME). A doença é causada pela falha na produção de uma proteína chamada SMN-1, levando a morte de células neuronais localizadas na medula. A consequência disso é um progressivo enfraquecimento muscular, que com o avançar da doença dificulta até mesmo a respiração e a capacidade de engolir.

Para salvar a vida dessas crianças é fundamental o uso de um remédio chamado Spinraza. O medicamento interrompe a progressão de todos os tipos doença quando o tratamento é iniciado. O ideal é que o uso do remédio seja feito o mais rapidamente possível, para que os efeitos do avanço da enfermidade sejam mínimos. Somado a fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional, o Spinraza não só propicia um futuro para o paciente, como também viabiliza uma maior qualidade de vida.

O registro da medicação no Brasil foi concedido pela ANVISA em agosto de 2017. Entretanto, esse remédio importantíssimo para os portadores de AME não está disponível no SUS. E para piorar a situação, uma única dose desse medicamento chega a custar cerca de 375 mil reais para os pais, levando o custo do tratamento no primeiro ano para em torno de 2 milhões e 100 mil reais.

No entendimento de quem convive com a situação, as decisões pela não incorporação do medicamento não fazem sentido: “hoje nós já temos documentos, relatórios médicos e vídeos com os pacientes brasileiros evoluindo. O nosso país está perdendo a chance de participar de uma mudança na história da doença”, afirma Renato Trevellin, presidente da associação Unidos Pela Cura da AME.

Pais de crianças portadoras de AME em sessão da Comissão de Direitos Humanos do Senado que debateu a distribuição do medicamento. (Foto: Unidos Pela Cura da AME).

Além de se dedicarem aos cuidados com seus filhos, ao descobrirem que o Spinraza não é fornecido gratuitamente, os pais de pacientes com AME têm buscado judicialmente o acesso ao remédio. Sem o valor dos impostos embutidos na medicação, o governo paga 1 milhão e 260 mil no primeiro ano de tratamento, quando o pagamento é determinado judicialmente.

Caso fosse o Spinraza fosse incorporado no SUS, o custo da medicação para o Estado seria ainda menor que aquele pago quando a compra de determinada judicialmente, uma vez que poderia se negociar um custo menor ao se comprar em maior quantidade. Países como Alemanha, Itália, Israel, Japão e Espanha já fornecem o medicamento sem qualquer custo para os portadores de AME.

Por aqui, até mesmo na Justiça o acesso é dificultado. Um exemplo é uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no final do ano passado. Sob a alegação de alto custo, a União conseguiu derrubar a liminar que garantia o acesso ao Spinraza para a menina Lívia Alves Locks, de três anos. Uma das justificativas para a negativa no TRF4 foi que “o direito de um paciente individualmente não pode, a priori, prevalecer sobre o direito de outros cidadãos igualmente tutelados pelo direito à saúde”. Atualmente um abaixo-assinado com 479 mil assinaturas pede a revisão da decisão.

Em outros casos, apesar da decisão judicial ser favorável, há uma grande demora para a decisão ser cumprida e as doses do remédio serem fornecidas. Diante da incerteza dos resultados judiciais, os pais de crianças com AME também têm criado campanhas de arrecadação de recursos na internet, através de sites de financiamento coletivo e redes sociais.

Essa é exatamente a situação em que se encontra a família do Heitor. Nascido em 2 de outubro de 2018, ele começou a apresentar a perda de movimentos já no primeiro mês de vida. Após passar por quatro médicos, o diagnóstico veio em uma consulta com uma neurologista e através de um teste genético, que confirmou a AME quando ele já tinha dois meses. Desde então, Heitor já apresenta dificuldade respiratória e passou a precisar da ventilação não invasiva.

Em busca da cura, a família de Heitor mudou-se de Itaíba, em Pernambuco, para a capital Recife. (Foto cedida pela família de Heitor).

Os familiares de Heitor também entraram na Justiça em busca da liberação do medicamento e já conseguiram uma liminar favorável há um mês e meio, mas até agora o remédio não foi fornecido: “eu como mãe me sinto muito angustiada e de mãos atadas por saber que existe um tratamento que pode salvar a vida do meu filho, que vai lhe dar o direito de viver, e eu não posso dar. Nem a Justiça e nem o Estado se preocupam e olham para as crianças com AME”, afirma a mãe de Heitor, Karla Karoline Gomes.

Confiantes nos resultados que o medicamento trará, mas correndo contra o tempo ao lidarem com uma doença progressiva, os familiares de Heitor têm conseguido ajuda de pessoas de sua cidade e da região. Karla define esses apoiadores como um “exército de anjos” na luta diária pela vida de Heitor. “E isso não tem preço”, completa ela. Todas as formas de ajudar o Heitor estão disponíveis no site www.ameheitor.com.br. Já o acompanhamento da luta pela liberação da medicação no SUS pode ser acompanhada no Facebook e no Instagram da Associação Unidos Pela Cura da AME.

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Jornal Digital Jornal Digital – Edição 745