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SINAL DE FUMAÇA

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Definitivamente, existe algo de bizarro no Brasil. Li num site que um técnico de futebol saiu em defesa de um famoso jogador, que atravessa uma má fase em sua carreira, porque fora noticiado que o atleta (???) fuma duas carteiras de cigarro por dia. O técnico, em tom de deboche, disse que o jogador fumou a vida toda, e que dois cigarros a mais ou a menos não fariam diferença.
 
Outra notícia dá ciência de que o BBB 10 foi o mais bem dirigido e mais lucrativo da história, ufanando o fato de que houve mais conflitos entre os participantes e mais conteúdo erótico que os anteriores (!!!).
 
Ainda uma terceira notícia mostra outro conhecido jogador de futebol em uma festa, numa favela no Rio, ladeado de traficantes portando fuzis e metralhadoras de uso exclusivo das Forças Armadas, que faziam sua segurança. Questionado, o jogador disse achar absolutamente normal freqüentar o baile ao lado de traficantes, porque, na favela, há armas em todo lugar e os traficantes são parte da comunidade.
 
Não sei quanto aos demais, mas me preocupo quando se começa a difundir a estupidez como valor. Não consigo achar normal ou publicamente defensável que atletas tenham vícios – ainda que lícitos, que freqüentem festas onde sua segurança é feita por traficantes armados com fuzis e metralhadoras e que programas de televisão façam, impunemente, apologia à intolerância, à homofobia e à pornografia e seus participantes ainda sejam chamados de heróis.
 
Sempre que algo me indigna, procuro saber o que pensa o resto da população. Busco, então, meus informantes da sabedoria popular: Zé Carlos, um taxista conhecedor da natureza humana, que acertou 90% dos últimos eleitos e dos campeões Bahianos e Brasileiros de futebol, e o dublê de cantor e faxineiro de meu prédio que, se lançado candidato, superaria o Lula em vocação para a convergência.
 
Ambos foram categóricos: o povo gosta mesmo é da escatologia. Tudo natural. E não é por falta de opção, mas sim por falta de noção. Um deles ainda me contou a história de uma de suas vizinhas que trabalhava de doméstica em casa de família e dormia no serviço, mas que, nos seus aposentos, não tinha televisão. Com a proximidade do BBB, a funcionária dera um ultimato: ou a família providenciava uma TV para ela acompanhar o programa ou ela pediria demissão. História verídica, me assegurou. Resultado, negada a televisão, demitiu-se. Peremptoriamente.
 
Eu, que sempre me achei um liberal, me descobri conservador. Minha capacidade de relativizar a falta de noção humana deve ter ficado lá atrás, num dos BBB’s ou numa das milhares de notícias equivalentes a estas que, vez em quando, testam nossa capacidade de absorver e entender o absurdo.
 
Quem sabe não é uma daquelas questões genéticas que se apresentam a cada duas gerações. Nós, os filhos da geração paz e amor, que tanto transgrediu para buscar uma alternativa ao stablishment, tenhamos que, agora, lutar vorazmente para restabelecer, num outro nível, aqueles padrões de valores que eles buscaram relativizar, para que, um dia, não acordemos, todos, num BBB, com traficantes armados a fazer nossas  escoltas e obrigados, sem direito a reclamar, a ver nossos filhos fumando carteiras e mais carteiras de cigarros em nossas casas, já que tudo é normal, pois é esse o sinal de fumaça que se apresenta no horizonte.
 
Aproveitando, perguntei ao Zé Carlos quem ele achava que iria ganhar a eleição para presidente, e ele me disse, em tom profético: tá duro doutor, acho que dessa vez, todo mundo vai perder. Sábio, o Zé Carlos.
 
FÁBIO TORRES, BRUMADENSE RADICADO EM SALVADOR, É ADVOGADO ESPECIALISTA EM DIREITO PÚBLICO MUNICIPAL

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