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Travessia na pandemia

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Este 22 de junho, amanheceu dia quente e ensolarado na Luzboa. Já começou o verão, por aqui. Demos adeus à capital portuguesa e saímos de casa cedinho, para pegamos o nosso voo para o Brasil. Chegamos perto da meia noite e não estava frio aqui no sul brasileiro. Era pra estar frio, que aqui já começou o inverno, mas tive que tirar o casado e ficar de manga curta. O veranico de maio atrasou?

Já saímos com saudades do Rio, o nosso neto português. Vai fazer uma falta danada para nós aqui no Brasil. Ontem à noite, quando nos despedimos para voltar ao nosso apartamento no Chiado, para a nossa última noite em Lisboa, peguei ele no colo e ele não quis me largar. Isso dói um bocadinho.

Mas vou contar da viagem. Primeira coisa: as áreas de atendimento ao cliente e de embarque estavam um apinhamento só, no aeroporto, sem distanciamento físico quase nenhum. A única diferença é que as pessoas estavam de máscara, porque é obrigatório o uso delas em ambientes fechados. Numa das filas – que tem fila pra tudo, tanto em Portugal como aqui no Brasil – uma senhora quase me bateu, quando lhe pedi que observasse alguma distância entre nós, para segurança dela e nossa. Xingou, resmungou e logo estava quase encostada de novo.

Mas problemático, mesmo, foi o avião lotado. Nossa companhia, nesta viagem, a Azul, só faz duas viagens por semana, segundo informação deles, de Portugal para o Brasil. Então eles remanejam várias passagens de outros dias e lotam esses dois voos toda semana. Todo mundo de máscara, dentro do avião, com algumas exceções, é claro que sempre tem. Mas ninguém exigiu que aqueles poucos que se recusaram a usar o apetrecho o fizessem.

Pra agravar tudo, a viagem de Lisboa para Campinas, durante a qual deveríamos ficar dez horas, dez horas e meia dentro do avião, que é o tempo da viagem, ficamos mais de doze horas, porque o voo faz escala em Recife. Ficamos parados duas horas lá, dentro do avião, porque segundo a Azul – soube no Brasil – Portugal não permite que os tripulantes permaneçam naquele país para dormir, descansar, depois do voo do Brasil até Lisboa, então é preciso parar em Recife para troca do pessoal. Isso depois que explodiram os números aqui no Brasil. Só que perguntamos para a companhia, antes da viagem, o porquê da escala – a gente pega uma empresa brasileira para não ter escala entre Brasil e Portugal – e eles disseram que era para abastecer. Achei estranho, porque as companhias sempre fizeram esse trajeto e nunca precisaram parar em nenhum lugar para abastecer, mas perguntamos quando chegamos ao Brasil e eles abriram o jogo. De maneira que, para não haver risco para Portugal, aumenta-se o risco para as pessoas que estão vindo para o Brasil, deixando-os confinados no avião por mais duas horas.

Outra coisa: comentamos que algumas pessoas – poucas, felizmente – ficaram quase o tempo todo sem usar máscara, mas havia outro problema que percebemos: quase ninguém trocou a máscara a cada três ou quatro horas de uso. Nós levamos o suficiente para trocar a cada três horas, mas a grande maioria não fez isso. Perguntamos para uma aeromoça se a companhia fornecia máscaras para os clientes, mas ela disse que não, que tinham algumas sobressalentes que podiam ceder, se alguém pedisse. Não seria correto que o uso da máscara fosse obrigatório e que a empresa tivesse para suprir, exigindo que fossem trocadas de três em três horas, ou de quatro em quatro horas? Tipo assim: Embarcamos às dez, às 13 ou quatorze os tripulantes avisariam que era necessário trocar a máscara, para que todos estivessem usando equipamento que funcionasse adequadamente. E assim por diante, a cada três ou quatro horas.

Um detalhe que percebi, também: a água servida no voo não era naqueles de copinhos fechados, que a gente compra lacrados, só abre na hora de beber. Não, era água de garrafa, que era colocada em copos de plástico na hora de servir. Numa época de pandemia como a que estamos atravessando, deveríamos ficar tanto menos tempo quanto possível dentro do avião e a água deveria ser servida em copos fechados, lacrados, que podem ser higienizados antes de abrir. A comida, no almoço, era quente e o que era frio estava em potes fechados. O lanche também era quente e a manteiga e o queijo estavam em embalagens fechadas. Mas a água e os sucos, café, vinho eram servidos em copos de plástico descartáveis.

O ser humano é complicado mesmo. Na saída dos voos – tivemos dois – os tripulantes pediam, quando o avião estava aterrando, que todos ficassem sentados, com os cintos afivelados e só levantassem quando eles avisassem. Embora isso fosse repetido duas ou três vezes, a maioria levantava para pegar a bagagem quando o avião nem tinha parado ainda. Avisaram que iam liberar a saída do avião por filas de assentos, para não haver aglomeramento, por causa do risco da pandemia. Mas qual, eles liberavam a fila da direita e pronto, todo o povo de todas as filas saíam para o corredor e debandavam.

A experiência de viajar numa época como esta é meio traumatizante, mas agora vamos ficar de quarentena umas duas semanas, que é preciso.

Os números da pandemia não mudaram muito, no Brasil: as informações continuam não sendo precisas. Tivemos mais de setecentos mortes nas últimas vinte e quatro horas desta segunda-feira, um pouco menos do que os mil e tantos dos últimos dias, conforme informação do consórcio que pega os dados diretamente das secretarias estaduais de saúde. O total de óbitos é de mais de cinquenta e um mil. A fonte do Ministério da Saúde é a mesma, mas os totais do governo continuam diferentes. Os casos confirmados foram 24.358 no mesmo período, totalizando mais de um milhão e cem mil.

Em Portugal o número de óbitos subiu para quatro e o número de casos confirmados baixou para a média de antes do desconfinamento total: 259 contagiados.

Então, de volta para a quarentena, que acabamos de chegar e precisamos ficar de olho em nós mesmos, mais do que nos outros. Cuidem-se todos.

Leia o Diário da Pandemia na minha página e na página do Grupo Literário A ILHA, no Face book. Toda manhã, um novo capitulo.

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