Ao observador pouco habituado ao jeitinho brasileiro de burlar regras e tentar levar vantagem em quase tudo, causa espanto a capacidade da assessoria palaciana em criar problemas políticos e jurídicos de grande envergadura para o (des)governo Dilma Rousseff. Não se trata de uma manobra aqui, um equívoco acolá, um atalho ou ponto fora da curva. A sucessão de erros grotescos talvez seja um caso inédito numa democracia ocidental. Parafraseando o rifão brejeiro, sobram caroços nesse angu.
Contabilizadas apenas as obscenidades planaltinas nestes três primeiros meses de 2016, teremos uma completa enciclopédia sobre o modus operandi da república sindical instalada no Poder Executivo desde a eleição de Luiz Inácio da Silva, vulgo “Lula”. Ao arrepio dos ditames constitucionais, fez-se o diabo para manter os lambões nos píncaros e blindar a súcia de celerados flagrada saqueando os cofres públicos para abastecer os vasos sanitários de partidos políticos da base aliada e o bolso de movimentos (supostamente) sociais financiados pela roubalheira, formando um ajuntamento de seres sem vigor cívico, ético ou moral que carinhosamente ouso alcunhar de “Trupe do Angu”.
Nesse balaio de gatunos, ganhou imenso destaque a lambança envolvendo o Ministério da Justiça, a mais longeva pasta da História republicana e que restou ocupado pelo mais breve dos ministros, numa nomeação ruidosa cassada pelo Supremo Tribunal Federal. Impressiona sobremaneira que, diante de um volume imenso de advogados e juristas — tidos pela sociedade brasileira como “notáveis” e cobrando verdadeiras fortunas em honorários — que defendem e orbitam as cercanias do (des)governo Dilma, nenhum deles foi capaz de chamar a presidente da República num canto e dizer: “Olha, querida, você não pode nomear aquele moço para o Ministério da Justiça porque ele é promotor na Bahia e a Constituição Federal de 1988 proíbe expressamente a nomeação de membros do Ministério Público para cargos comissionados de chefia no Executivo.”
Ao contrário, insistiram na bandalha e foram humilhados em praça pública. Mordida, a presidente escolheu a pior das opções: sustentar a nomeação de outro promotor do Ministério Público para o cargo em questão. Para além das dezenas ações já impetradas no STF, no dia seguinte à posse, o novo ministro concedeu entrevista para um grande veículo de comunicação, deixando-se clicar em poses de dramaticidade teatral e anunciando que, ao menor “cheiro” de vazamento de informações, trocaria toda equipe da Polícia Federal. “Eu não preciso ter provas”, chancelou o novo titular — pasmem! — da Justiça. As declarações desastrosas contaminaram ainda mais as feridas abertas no ambiente institucional do país.
Para terminar de azedar o angu, o juiz Sérgio Moro suspendeu o sigilo das interceptações telefônicas, autorizadas pela Justiça Federal, envolvendo Luiz Inácio exatamente no dia quando o ex-presidente foi anunciado como chefe da Casa Civil, levantada a suspeita de que este movimento teria como única finalidade conceder-lhe foro privilegiado nas investigações da Operação Lava-Jato e seus afluentes. Noutras palavras, os áudios quase pornográficos da cúpula palaciana — que acredita ser credora de “dívidas de gratidão” das instituições que quase derrubaram e do povo que roubaram — apontam para a tentativa de obstrução e levaram para dentro do gabinete presidencial a imputação de crimes graves previstos no Código Penal.
Não muito longe, o ministro Gilmar Mendes sustou a nomeação de Luiz Inácio da Silva e, novamente, a penca de “notáveis” advogados e juristas governistas foi achincalhada, especialmente nas redes sociais, por não conseguir distinguir a diferença e o cabimento de umHabeas Corpus e um Agravo contra a togada Medida Cautelar, mesmo tratando-se de recentíssima jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Ou seja, os tais “notórios” operadores do Direito sequer leem direito. É a lama!
Enquanto “coxinhas” e “mortadelas” duelam pelo usucapião do latifúndio da verdade e da ética, beira ao inacreditável o baixíssimo nível que tomou conta do conjunto de funcionários que custam caríssimo aos cofres públicos e deveriam, inclusive em respeito à legislação vigente, empenhar esforços para buscar soluções legítimas e urgentes para a monumental e generalizada crise que sacode a República. Mas, o que temos é o encolhimento intelectual e o consequente pulo coletivo da trupe no abismo da iniquidade. Uma intrépida “Trupe do Angu”.